sexta-feira, 19 de maio de 2017

A mão suja de empresários na política brasileira

Já vejo nas redes sociais apelos ao boicote de produtos da JBS, que no popular atende como Friboi. De novo é o efeito de ilusão da internet, onde se imagina que um grito basta para dar início a uma revolução. O mito, aliás (permitam um parêntese), vem da ilusão marxista sobre o heroísmo de suas próprias revoluções. Grande parte delas, é bom que se diga, nada tem de “revolucionarias”. A mãe de todas, que foi a russa, começou na verdade com um golpe dado por Lênin. Pois é, companheiros: aquele sim foi um golpe.

Mas falemos do boicote à Friboi. Se o brasileiro fosse boicotar empresário que age de forma imoral acabaria ficando com a despensa vazia. O que essa nova revelação poderia servir é para uma avaliação rigorosa do papel dos empresários na roubalheira que se abateu sobre o Brasil. E o crivo teria de ser não apenas sobre os delinquentes. Exigiria uma avaliação do papel político da classe empresarial como um todo, no que isso tem de cumplicidade com ilegalidades que não se colocam apenas no roubo direto aos cofres públicos, atingindo também suas responsabilidades com qualidade de produtos, a relação com a concorrência, o respeito à liberdade de expressão principalmente quanto ao direito da opinião pública saber tudo a respeito do que está comprando. E a relação com o Estado, que é quase sempre em proveito próprio.

Não estou falando numa perseguição ao empresariado. Não é papo histérico de rede social, de boicotes, manifestação na frente de lojas, enfim dessas coisas bestas que nascem na internet. A conversa é sobre responsabilidade social, qualidade que no geral infelizmente faz muita falta. E não é que todos estejam envolvidos em crimes, até pelo fato de que isso é impossibilitado pelo próprio processo de qualquer corrupção. Mas é pela prevaricação geral, seja por cumplicidade ou receio de se expor. Tenho certeza de que a maioria do empresariado aceitaria muito bem este debate. Mesmo porque do jeito que está só lucram uns poucos.

Na conversa entre o empresário Joesley Batista e o presidente da República (por ora, infelizmente, Michel Temer) os diálogos mais revoltantes são exatamente sobre a interação entre a política e o empresariado no domínio da máquina pública. Em todos os crimes investigados até agora pela Lava Jato essa interação está presente, numa parceria que vem de longe. Vide o papel histórico dos empreiteiros de obras públicas na corrupção no Brasil, que passou pela ditadura, por Sarney e pelos tucanos, até chegar na sistematização da roubalheira no governo do PT.

Apesar do jeito songamonga, o foco de Joesley Batista é muito claro. Com a cumplicidade de Temer, ele fala da proteção de seus negócios, procurando abrir caminhos fora da lei para sua empresa. Um fiscal sério lhe daria voz de prisão no ato, mas é claro que isso nunca passaria pela cabeça de Temer. Ele ouve e manda tocar pra frente. O “Tem que manter isso, viu?” está implícito em toda a conversação. E a razão não é pessoal, do Temer ou de qualquer outro. É um sistema que não depende só dele. Imaginem as conversas com Lula na presidência. Com certeza ele levava isso também no escracho, o que não é estilo desse presidente de agora, assim como não era de Dilma, que conduziu igualmente o sistema corrupto.

Na conversa com Temer o dono da JBS fala em suborno de procuradores e compra de informações privilegiadas. Nota-se sua forte influência em órgãos que regulam e fiscalizam suas atividades empresariais e num dado momento Temer até diz que ele deve falar em nome do presidente da República ao ministro da Fazenda. Se é assim com Meirelles (que o empresário chama de “Henrique”), deve-se perguntar como seria então com um fiscal mais rigoroso com um de seus frigoríficos ou na fiscalização de algum município. E não estou falando apenas do interior brasileiro, pois sabe-se que a JBS pagou também até agora R$ 14 milhões a Gilberto Kassab. Ele chegou a receber R$ 350 mil mensais, mesada que era paga desde 2008, quando era prefeito de São Paulo. Na conversa com Temer, Joesley Batista fala também sobre uma dívida com Cunha, então na presidência da Câmara, pelo pagamento da tramitação de lei sobre a desoneração tributária do setor de frango.

Outro ponto que demonstra a interação negativa entre a política e o empresariado é o sujeito acusado de ser o encarregado do transporte de dinheiro em espécie, o deputado Rocha Loures, do PMDB do Paraná. Ele era um desconhecido na política nacional, mas não é peixe pequeno. Foi chefe de gabinete de Roberto Requião, em seu primeiro mandato como governador, além de ser do círculo de poder empresarial no estado. Na eleição de 2010 tentou um vôo alto: foi vice do pedetista Osmar Dias, que perdeu no primeiro turno para Beto Richa. Loures fez carreira na representação política do empresariado paranaense. Seu pai, Rodrigo Costa da Rocha Loures, foi presidente por dois mandatos consecutivos da FIEP e ele próprio já teve participação na instituição. Em tese, o deputado afastado pelo STF deveria estar fiscalizando em nome do empresariado há muito tempo. E a falta evidente de compromisso sério não é restrita a este caso. Falei da mesada do Kassab, não é mesmo? Pois este seria um assunto para a FIESP atuar, defendendo o interesse do empresariado honesto. Mas aí existe um entrave muito forte. O comando absoluto da entidade empresarial está há mais de dez anos com Paulo Skaf, outro acusado pela Lava Jato de receber milhões da Odebrecht.
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POR José Pires

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