sexta-feira, 25 de outubro de 2019

STF: crime e impunidade podem levar vantagem na decisão do tribunal

O Brasil vive patinando na conclusão de processos sociais importantes para tomar um caminho que ao menos traga certa tranquilidade para o brasileiro se ocupar de seus afazeres, dando um rumo digno para a vida. Uma grande dificuldade na atualidade é a enorme intromissão que surge o tempo todo de instituições que deveriam tomar o cuidado de no mínimo não desequilibrar áreas sob seu poder. Seria mais produtivo que já que ajudam muito pouco, deixando de cumprir suas obrigações, nem mesmo as ordinárias, que pelo menos não atrapalhem.

Políticos, empresários, organizações de trabalhadores, representantes do setor rural, a administração pública, autoridades religiosas e seus prepostos políticos, a lista de complicadores da vida brasileira vai do setor público à iniciativa privada, com uma ocupação preferencial em mexer no que vai indo um pouco melhor, embaralhando aquilo que foi relativamente organizado e está trazendo resultados sociais melhores do que a média deste país empacado pela falta de efetividade em praticamente tudo.

Parece até aquelas atrapalhações que costumamos ver em séries de televisão a forma como se estabelecem as relações sociais no Brasil. A diferença é que não é nada engraçado na vida real. Ninguém se entende. Tem sempre alguém complicando o que está indo razoavelmente bem. Sempre que algum setor vai andando um pouco melhor, depois de encontrar um jeito de dar alguma efetividade a seu trabalho, logo aparece uma porção de representantes de outros setores com propostas para complicar aquilo que está dando certo. Claro que nesta intromissão agem aqueles que foram incomodados pela transformação de qualidade.

Foi o que ocorreu com a Operação Lava Jato, um trabalho que pela primeira vez em nossa história atacou com vigor a corrupção, atendendo a uma necessidade crucial do país, que estava com toda sua energia sugada por políticos corruptos e empresários, associados em um sistema organizado que impede o uso do dinheiro público em sua função fundamental de servir ao interesse da maioria. A corrupção no Brasil já não é mais uma atividade simples de aproveitamento pessoal, com um ou outro político metendo a mão em dinheiro que não é seu. Este é o corrupto de anedota, hoje em dia apenas periférico no sistema que foi desvendado pela Lava Jato.

A corrupção no Brasil estava no caminho da inversão da ordem do próprio roubo do dinheiro público. O ladrão não age mais de fora, aproveitando-se da desatenção da máquina pública. O gatuno tem a chave do cofre e o controle do dinheiro que entra e sai. Este sistema de ponta-cabeça fez da roubalheira o centro da atividade política e administrativa do Estado. A corrupção é engrenagem definidora da própria movimentação da máquina pública. Pode-se dizer que já fazia parte não só do orçamento. Tornou-se base da própria execução de obras e serviços. Não ocorre mais apenas o desvio de percentual das verbas para o próprio bolso. A corrupção virou parte integrante do projeto e de sua execução, servindo na sustentação das forças políticas que dominam este sistema.

Foi este o ponto em que tocou o trabalho de promotores, policiais e juízes, simbolizado pela Lava Jato, daí a reação fortíssima, com influência expressiva até mesmo na mais alta Corte do país. O sistema então reage, do mesmo modo que células destrutivas tentariam rechaçar o remédio aplicado contra sua invasão e o controle de um corpo são.

A corrupção não se concentra hoje em dia no larápio político. O roubo é base de um projeto de poder, com interesses espalhados entre o Judiciário, a própria polícia em todas suas instâncias, bancas de advogados enriquecidos pelo lucrativo vai-e-vem processual, empresários, máfias que envolvem o crime organizado do narcotráfico, de quadrilhas de grandes assaltos e das milícias paramilitares. Os políticos que atuam na organização e representação deste sistema são apenas a parte mais visível do crime. E do jeito que estão as coisas, podem até não ter em suas mãos o poder de fato neste sistema.Tipos como um Lula, um Eduardo Cunha ou mesmo um José Dirceu, talvez sejam meros condutores na esfera política. Na obscuridade dos bastidores do crime esconde-se o real poder.

O retrocesso com o fim da prisão de segunda instância não se restringe à soltura de gente muito ruim da política e do crime comum, já condenados a pagar por seus crimes, seja na faixa de cerca de quatro mil ou de centenas de milhares. Mais que isso, uma decisão desse tipo pelo STF será um estímulo para a movimentação mais ágil deste sistema, com a criação de um ambiente favorável aos seus organizadores políticos, não só os que já foram presos, como aqueles que poderiam ser pegos e que na obscuridade de que falei se articulam pela impunidade.

Mais que soltar quem está preso, esta decisão livrará de prisão os corruptos. O sistema criminoso vai ganhar agilidade, com maior capacidade de organização e ampliação da sua logística de poder. Será como uma carta branca, na garantia da eternidade da enrolação politiqueira, nas gavetas da burocracia e nos lentos caminhos judiciais que raramente chegam até a porta da cadeia.
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POR José Pires


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Imagem- Foto de Fabio Rodrigues Pozzebom, Agência Brasil

O reaparecimento de Queiroz, o amigão de Flávio e Jair Bolsonaro

E não é que o Queiroz apareceu? E foi em plena ação que ressurgiu o antigo faz-tudo dos tempos em que Flávio Bolsonaro era deputado estadual e seu pai apenas um deputado do baixo clero. Foi em gravação de áudio em que fala em distribuição de cargos no governo de Jair Bolsonaro, citando diretamente o agora senador Flávio Bolsonaro. O ex-assessor é investigado pela apropriação do salário de cargos nomeados no gabinete de Flávio na Assembleia do Rio de Janeiro, a chamada “rachadinha”. O caso era investigado pelo Ministério Público por suspeitas de peculato, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha, até o ministro Dias Toffoli mandar suspender as apurações.

>O áudio mostrado pelo jornal O Globo mostra que o ex-policial militar Queiroz manteve-se operativo mesmo depois do escândalo da rachadinha. Vamos a ele: "Pô, cara, o gabinete do Flávio faz fila de deputados e senadores lá, pessoal pra conversar com ele. Faz fila. P..., é só chegar, meu irmão: 'Nomeia fulano aí, para trabalhar contigo'. Salariozinho bom desse aí cara, pra gente que é pai de família, p..., cai como uma uva (sic)".

É bastante interessante que mesmo com toda repercussão do caso das rachadinhas o antigo assessor ainda esteja falando em distribuição de cargos pelo gabinete de Flávio, agora no Senado. A impressão que dá que alguém pode ter garantido que a investigação sobre ele não vai dar em nada. Se for assim, ele tem razão: “É só chegar, meu irmão”.

O presidente Jair Bolsonaro não gosta dessa história do paradeiro do Queiroz, seu amigo de tantas pescarias. Sobre este assunto, há poucos dias um ciclista passou pelo presidente fazendo a pergunta e Bolsonaro disse que o Queiroz estava “com a sua mãe”. Agora, na reaparição do Queiroz, o presidente disse que “é um áudio bobo”. Bem, em política quando uma autoridade diz que determinado assunto é “bobo” é porque na verdade, como diz a moçada, a coisa pegou.

O senador Flávio Bolsonaro também tentou minimizar o áudio e para isso gravou de imediato uma resposta em vídeo, postado nas redes sociais. Dito assim, pode parecer piada, mas é sério. O sujeito correu para gravar um vídeo para deixar bem claro que o assunto não é importante. Ah, essa família Bolsonaro.

No vídeo, Flávio afirma que não tem contato com o ex-assessor “há quase um ano” e que só teve notícia dele pela imprensa. Vejam que extraordinário, o filho de Bolsonaro deve ser um dos poucos brasileiros sem interesse em saber da vida do Queiroz. Com sua carreira em risco por causa do sujeito, isso é até uma contradição. Pode ser apenas uma diferença de personalidade, mas se tivesse por aí alguém investigado pelo MP pela suspeita de passar dinheiro ilicitamente para mim eu estaria bastante curioso em saber por onde anda essa figura.

Outro deslize do filho de Bolsonaro é o título do vídeo, classificado por ele como “Breve, objetiva e tranquila explicação sobre o áudio atribuído ao ex-assessor Queiroz”. Essa incoerência foi retirada da sua fala, “breve, objetiva e tranquila”, conforme ele mesmo diz. O áudio de Flávio é apenas “breve”, o que evidentemente se deve à discussão com assessores e advogados sobre o que deveria dizer, que resultou em um texto pronto, uma enrolação sem nenhuma objetividade. E ele tampouco está tranquilo, como também não pode estar seu pai, porque se fosse assim eles não estariam nem aí com o que Queiroz anda falando.
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POR José Pires

quarta-feira, 23 de outubro de 2019

Eduardo Bolsonaro e suas encrencadas vitórias

Eduardo Bolsonaro foi oficializado líder do PSL na Câmara depois de conseguir uma nova lista de apoio com mais deputados que o grupo de Luciano Bivar, presidente nacional do partido. Só Bolsonaro mesmo, de braços dados com os filhos, poderia ter seu próprio partido dividido ao meio desse jeito e se matando numa briga. Também só Bolsonaro e seus filhos para não compreenderem que nem a vitória justifica certas guerras políticas.

Com Eduardo Bolsonaro como líder do PSL ele vai liderar exatamente o quê? Ademais, qual é exatamente a estratégia dessas figuras? Esse garoto prodígio não era aquele que ia ser embaixador nos Estados Unidos? Creio que mesmo alguém da família Bolsonaro pode ser capaz de reconhecer que a expectativa baixou um bom tanto com essa luta encarniçada pela liderança do PSL.

Bem, como critério de qualidade política só pode ser o mesmo nível da liderança de seu pai como presidente da República. Nem dá para dizer que Eduardo como líder do PSL seria uma “vitória de Pirro”. Esta mitologia não cabe em tamanha baixaria. Eduardo Bolsonaro e seus companheiros do PSL como missão está mais para outro mito, aquele do exército de Brancaleone, do filme genial e muito engraçado dirigido pelo italiano Mario Monicelli, com o grande Vittorio Gassman como ator principal.

Claro que lembro disso apenas pela estupidez do “exército” do filme e não pelo caráter dos malucos. Eram inocentes e lá também não tinha rachadinha. Nem milicianos, virtuais ou de mão armada dominando com crueldade bairros no Rio.

O “exército Brancaleone”, formado por Gassman no filme, virou sinônimo de ajuntamento de doidos depois do sucesso dessa obra no Brasil nos anos 70 e 80. O bando de incompetentes malucos bolsonaristas pode até usar o mesmo refrão cantado pelos alucinados e igualmente ineptos combatentes da cruzada medieval do filme italiano. Eles cantavam “Branca! Branca! Branca! Leone! Leone! Leone!”. Basta uma pequena mudança, para “Bolso! Bolso! Bolso! Naro! Naro! Naro!” e vai ficar perfeito.
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POR José Pires

Joice Hasselmann e o governo dos bocas-sujas

A deputada Joice Hasselmann postou um vídeo na internet em resposta ao colegas governistas que andam falando dela depois da sua destituição por Jair Bolsonaro do cargo de líder do governo no Congresso. Na gravação, a deputada responde especialmente ao deputado Eduardo Bolsonaro, refutando acusações que o filho do presidente vem fazendo. Esta briga é uma daquelas de pegar a pipoca para assistir, porém mesmo sem confiar em nenhum dos lados é possível constatar que Joice desmente Eduardo com fatos.

O jogo é sujo de ambos os lados, no entanto na briga feia que vem desde o início de mais esta crise no governo, o filho de Bolsonaro procura desconstruir a imagem da colega de uma forma que qualquer um que venha acompanhando a política nacional sabe que não tem relação real com o que já foi notícia. Mas a deputada Joice sabe se defender bem e também é perigosa no ataque. E mesmo quem não gosta dela não tem como discordar que seu espaço político se deve a um esforço pessoal e não à proteção paterna. Além dessa diferença essencial, os fatos lhe dão vantagem em relação ao filho mimado de Bolsonaro.

Esta é uma briga que não se deve apartar. A troca de porrada entre os dois tem a utilidade de revelar coisas que não viriam a público se não houvesse o estranhamento. Do vídeo de Joice, a informação interessante é sobre os bastidores do governo comandado por Bolsonaro, que segundo ela diz é um ambiente da maledicência e do palavrão. Para refutar Eduardo Bolsonaro em seu mimimi sobre os xingamentos a Bolsonaro que apareceram em áudio de reunião de seus adversários no PSL, a deputada conta que o cotidiano com Bolsonaro e sua equipe é uma permanente baixaria.

Veja o que Joice fala sobre a normalidade das discussões no governo: “Eu estou ali no meio [do governo]. Palavrão ali é praticamente interjeição, xingamento é interjeição, é ponto e vírgula, é exclamação. Quantas vezes pessoas com mandatos, governadores, senadores, foram xingados de coisas até mais pesadas em reunião internas, que ninguém gravou”.

Não é que não desconfiássemos da baixaria nos bastidores deste governo, mas é importante ouvir esta confissão de uma pessoa que até há pouco fazia parte da cúpula governista. O que Joice traz pode ser definido com a expressão “informação de cocheira”, neste caso até literal, dado às patadas que ela afirma ser a normalidade nas conversações de trabalho em torno de Bolsonaro. Curiosamente, a grosseria é mais uma aproximação de Bolsonaro com os hábitos de Lula e seus companheiros de partido, que na intimidade também eram extremamente grosseiros ao tratar das questões da política nacional.
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POR José Pires

domingo, 20 de outubro de 2019


quinta-feira, 17 de outubro de 2019

Desarticulações de um presidente que não se entende nem com seu próprio partido

Nesta quinta-feira temos o julgamento do STF que pode liberar os maiorais para fazerem suas lambanças sem o risco de ir para a cadeia na segunda instância, por isso está havendo menos atenção à definitiva comprovação do desmonte da autoridade pessoal do presidente Jair Bolsonaro. Foi exatamente hoje, quando ele sofreu uma derrota feia na disputa pela liderança do PSL na Câmara. Bolsonaro não tem influência nem no seu próprio partido, mesmo tendo jogado pesado, colocando a máquina do governo na pressão para colocar seu filho Eduardo Bolsonaro no lugar do deputado Delegado Valdir.

Bolsonaro se meteu pessoalmente na briga pelo cargo e foi bem do jeitão atabalhoado que costuma usar para fazer política. Ontem foram revelados diálogos, com ele cabalando votos para o filho. Hoje apareceu outro áudio, desta vez de uma reunião na noite de ontem do deputado Delegado Valdir com outros deputados do PSL. O deputado chama o presidente de vagabundo e afirma que tem uma gravação que pode implodir o governo.

Vejam o que ele disse: “Eu vou implodir o presidente. Aí eu mostro a gravação dele. Eu tenho a gravação. Não tem conversa, não tem conversa. Eu implodo o presidente. Acabou o cara. Eu sou o cara mais fiel a esse vagabundo. Eu votei nessa porra. Eu andei, no sol, 246 cidades gritando o nome desse vagabundo”. A existência do áudio foi revelada nesta tarde pelo site O Antagonista, que depois teve a confirmação do deputado Delegado Valdir sobre o conteúdo das gravações. Ele só não disse ainda o que exatamente tem para implodir Bolsonaro.

Como consequência da briga com o partido, Bolsonaro rompeu com a deputada Joice Hasselmann, figura emblemática de seu governo e uma das primeiras pessoas a ficar do seu lado na disputa pela presidência da República. Nesta quinta-feira a deputada foi destituída por Bolsonaro da liderança do governo no Congresso e soube pela imprensa da perda do cargo.

Depois de ser tirada da liderança, Joice andou falando a colegas deputados que mandou uma mensagem ao ministro Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo. Ela fez uma lista dos aliados que Bolsonaro demitiu até agora e disse que o próximo será ele. Ramos é general da ativa e tem amizade de muitos anos de Bolsonaro. Nem assim ele conseguiu convencer parlamentares do PSL a apoiarem Eduardo Bolsonaro para a liderança do partido na Câmara.

Esta é a condição política dramática de Bolsonaro, resultado de seu espírito de deputado de baixo clero. Mesmo com o poder da caneta ele não consegue ter articulação política nem internamente em seu partido. E os filhos que ele colocou na política herdaram sua incapacidade de convencimento. Eduardo Bolsonaro ocupa a presidência estadual do PSL em São Paulo e foi o deputado mais votado do estado. Mas mesmo assim é fraquíssima sua influência entre os correligionários. Da mesma dificuldade de liderança padece Flávio Bolsonaro, senador pelo Rio de Janeiro e presidente do partido no estado. No mês passado, Flávio determinou a saída do PSL da base do governador, mas ninguém obedeceu.

Bolsonaro conseguiu a façanha inédita na política brasileira de ser o primeiro presidente da República que não tem o respeito nem do seu próprio partido, que dirá dos outros. Os poucos projetos relevantes de seu governo, como a reforma da Previdência, foram também tomados por lideranças de outros partidos na Câmara e no Senado, sofrendo mudanças e sendo encaminhados sem a sua interferência. O governo só se movimenta quando se manifestam forças externas a seu comando.

A coisa está feia para o homem que a ministra Damares Alves profetizou que comandará o Brasil nos próximos 16 anos. Parece que a ministra pirou de novo na goiabeira. Se Bolsonaro completar os quatro deste mandato já vai ser um milagre.
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POR José Pires

quarta-feira, 16 de outubro de 2019

Bolsonaro e Luciano Bivar: não tem mais negócio entre os parceiros do PSL

O Brasil acordou nesta terça-feira com a notícia sobre a Polícia Federal cumprindo mandado de busca e apreensão em endereços ligados ao deputado federal Luciano Bivar, presidente do PSL. Como se sabe, o presidente Jair Bolsonaro tem um conflito com o deputado, numa briga em público pelo controle do PSL, que envolve a dinheirama do fundo partidário.

Em 2019 o partido presidido por Bivar deve ficar com R$ 115,1 milhões. Há poucos dias, em matéria sobre as encrencas entre Bolsonaro e Bivar, o jornal O Globo fez a soma do quanto vai ganhar o PSL com o fundo partidário e o fundo eleitoral. Estão sentados? O partido vai ficar com 737 milhões de reais.

Ter um partido na mão, mesmo que seja um partideco, é um negócio tão lucrativo quanto fundar uma igreja. Por isso mesmo certos salafrários montam um partido depois de fundar a igreja. A briga pelo controle do PSL, com Bolsonaro no ataque tendo ao lado os três filhos, vai demolir o PSL e prejudicar ainda mais a base política do governo, que já não tem unidade alguma.

De fato, Bolsonaro é um fenômeno: nem com a caneta na mão consegue reunir em torno de uma base política sólida. Incompetente como nenhum outro presidente anterior, ganha até de Fernando Collor na incapacidade de articulação. desse jeito vai passar todo seu governo fazendo compras no varejo.

Políticos como Luciano Bivar merecem rigorosa investigação, sendo evidente que em um sistema partidário decente ele teria dificuldade até para entrar em um partido, quando mais ser o dono. No entanto é muito curioso como esta operação da PF se ajusta de forma perfeita ao interesse do presidente da República.

No mínimo, tudo isso dá a impressão de que Bolsonaro andou se articulando, mesmo que do jeito dele muito conturbado, aproveitando-se de informações confidenciais. Esta operação da PF levou dois meses para ser autorizada. Dá tempo para muita manobra. Se além de sistema partidário decente, neste país houvesse também mais atenção ao cumprimento de leis, a situação poderia ficar complicada para o presidente.

Na semana passada ocorreu um estranho diálogo entre Bolsonaro e um desavisado que estava entre o pessoal que costuma ficar à espera do presidente na saída do Palácio do Alvorada. O sujeito apontou a câmera do celular e disse: “Eu, Bolsonaro e Bivar, juntos por um novo Recife”. Imediatamente, Bolsonaro falou: “Esquece o PSL, tá ok? Esquece”. Depois, ainda pediu “Cara, não divulga isso, não. O cara [Luciano Bivar] está queimado para caramba lá. Vai queimar o meu filme. Esquece esse cara, esquece o partido”.

Não tem como deixar de desconfiar que Bolsonaro seguia um roteiro estabelecido a partir de informações de bastidores, para lá de privilegiadas. Sim, eu sei que não tem presidente que não tenha feito isso, mas explicitamente desse jeito é algo inédito. Cabe a suspeita do uso do cargo em proveito próprio, na disputa de poder dentro do partido que no ano passado acolheu às pressas sua candidatura a presidente. Sendo comprovado, isso configura crime, além de não haver dúvida de que é absolutamente imoral.

Mas é claro que para ir a fundo nisso teríamos que ter um sistema partidário decente, além de existir o cumprimento de leis, conforme o que eu já disse anteriormente quando relacionei os fatos a um país que ainda precisa sofrer reformas rigorosas de alto a baixo.
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POR José Pires

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Imagem- Bolsonaro faz pose festiva com Luciano Bivar, no dia em que fechou negócio
para sua entrada no PSL, em março do ano passado

Maria do Rosário e seus companheiros de gritaria e provocação

Desde ontem o deputado Felipe Francischini, do Paraná, vem fazendo sucesso nas redes sociais e o motivo é muito simples. Presidindo reunião na CCJ da Câmara, de discussão da PEC da prisão em segunda instância, ele disse para a deputada Maria do Rosário que ela é chata demais. Esta é sua fala: “Você é chata demais, deputada. Tudo é machismo. Vocês só sabem gritar. Ganhem no regimento”. Francischini expressou o que sente a maioria das pessoas que acompanha a política brasileira.

Maria do Rosário é muito chata e também seus colegas de bancada, que desde o processo de impeachment de Dilma Rousseff atazanam a paciência de seus colegas e por extensão dos eleitores que acompanham os trabalhos no Congresso. E para chatear ainda mais, contam com o puxadinho do Psol.

A esquerda estabeleceu um método de atuação na Câmara que é de uma chatice impressionante, agressivamente desrespeitoso e totalmente inadequado ao debate sério de qualquer assunto. Petistas e seus colegas do puxadinho do Psol interrompem os outros o tempo todo, fazem exigências que já estão sendo atendidas, trazem temas que nada tem a ver com o que está sendo discutido. E fazem isso quase sempre aos gritos. Esta agressividade é estendida a qualquer convidado que os desagrade.

A participação do PT e do Psol em comissões e audiências públicas da Câmara tornou uma inutilidade esses importantes instrumentos de debate dos problemas brasileiros. Com a azucrinação esquerdista é impossível trabalhar direito.

O desabafo do deputado Francischini veio depois de aturar durante horas o clima enervante criado por Maria do Rosário e outras deputadas de esquerda. No final, apenas por causa de uma bobagem supostamente regimental levantada pela deputada petista apenas para paralisar o andamento da sessão, ela chamou o presidente da CCJ de “machista”. Com a reação dele, todas as mulheres esquerdistas se levantaram, como se fosse um descumprimento da lei Maria da Penha. É uma tática recorrente.

A bancada feminina de esquerda ataca com agressividade, depois apelam para falsas acusações em caso de réplica. É uma hipocrisia que banaliza de forma desrespeitosa à justa luta pelo fim da violência contra a mulher.

Recentemente o método da deputada petista foi explicitamente revelado em filmagem em vídeo que mostra ela cochichando algo com colegas do PT e depois indo de encontro a deputados adversários, dando trombadas propositais em alguns deles e ainda empurrando um político do PSL. A provocação é óbvia, mas ela não esperava que estivesse sendo filmada.

Em todos os trabalhos da Câmara percebe-se facilmente que a tática é criar um conflito para tachar o adversário de desrespeitoso ou violento. E também é óbvio o uso que os partidos de esquerda fazem de suas bancadas femininas, para falsamente criar um clima de desrespeito aos direitos da mulher.

Dizer que Maria do Rosário é “muito chata” nada mais é do que uma constatação do que ela e seus colegas de esquerda vem fazendo no Congresso Nacional. Mas no final da sessão, Maria do Rosário chamou Francischini de “projeto de ditador” e que ele teria aprendido “com o canalha do presidente”, que é claro que todo mundo sabe que é Jair Bolsonaro. Isso faz lembrar do que a petista fazia em passado recente, quando em entreveros do mesmo tipo teve início a projeção nacional do então deputado do baixo clero.

O resto da história é bem conhecida. Os eleitores projetaram em Bolsonaro a rejeição popular ao partido de ladrões e incompetentes da deputada, sentimento estimulado por ele com a contraposição aos otários do PT e do Psol. Mas parece que até agora Maria do Rosário não percebeu o efeito reverso dessa forma muito chata de fazer política.
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POR José Pires

segunda-feira, 14 de outubro de 2019

Direita bancada com dinheiro público e dificuldade de pensamento

O encontro de direita comandado pelo deputado Eduardo Bolsonaro fechou com chave de ouro. O CPAC, sigla de Conservative Political Action Conference do original americano, teve bancados seus custos com R$ 1,1 milhão do fundo partidário do PSL. O alto volume de dinheiro público foi revelado pelo site O Antagonista. A previsão era de R$ 800 mil reais, mas o orçamento seguiu a linha de planejamento de gasto de obra pública, com aditivo bem alto. É claro que nos Estados Unidos o evento original não usa dinheiro público, mas a direita daqui usa método local, aliás de muita semelhança com o que faz a esquerda, que esteve recentemente no poder. A forma de lidar com o dinheiro do contribuinte é a mesma.

Além desta marca, digamos, conceitual como prática política, o CPAC brasileiro não trouxe nada de destaque na área do pensamento, até porque a impressão que ficou é que no plano internacional o evento teve dificuldade de contatar alguma estrela do pensamento conservador, o que talvez se deva a um fato importante que já apontei: ao contrário do que se falou durante o fim de semana, o evento não é conservador. É um evento de direita. E numa classificação política mais rigorosa, seu promotor Eduardo Bolsonaro nem pode ser definido politicamente dessa forma. Na verdade, o filho do Bolsonaro é de extrema-direita.

Esta confusão que vem sendo feita de modo deliberado pela direita brasileira e que a mídia vem engolindo pode acabar demolindo a credibilidade do pensamento conservador no Brasil. Para dar um exemplo internacional, basta observar como essa direita trata a chanceler alemã Angela Merkel, uma dirigente importante do conservadorismo no mundo. Para eles, essa mulher é uma liberal, sendo que alguns devem achar até que ela é comunista. O equívoco não vem apenas da dificuldade mental da conturbada psicologia dos bolsonaristas nem de seu absoluto desconhecimento até do que é mais básico em história e política. É só a comprovação de que de fato situam-se à direita do conservadorismo.

O evento do filho de Bolsonaro teve dificuldade de trazer estrelas do pensamento conservador pela mesma razão que fez Marine Le Pen refutar na hora a relação que tentaram fazer de sua imagem com a de Jair Bolsonaro, logo que ele foi eleito. Uma estrela da CPAC foi a ministra Damares Alves, digo só para vocês sentirem o nível de qualidade da coisa. Uns mais gaiatos dirão logo que cada evento tem a musa que merece, no que até que estão certos, além de que Damares como atração em qualquer rodinha de conversação facilita bastante para saber o nível intelectual dos presentes. E para provar que não estou errado, a outra estrela do espetáculo foi o inacreditável ministro Abraham Weintraub.

Mas não é que no final a ministra Damares foi quem melhor definiu o nível de qualidade desta CPAC brasileira? Pois é, ela fez isso dando aos jornalistas uma avaliação sobre o público presente aos trabalhos. Sabe-se que é mesmo pela avaliação da plateia que se pode fazer um bom exame de qualquer evento, de modo que serão notadas as diferenças entre fãs de show de rock heavy metal, de samba e claro que também de participantes de uma conferência política internacional.

Foi interessante o exemplo utilizado por Damares na sua explanação sobre a qualidade do público do evento de direita. A ministra usou bandalhices pornográficas da eleição passada para a comparação, que na visão dela qualifica a plateia da conferência. A fala da ministra está gravada em vídeo, que rola na internet. Fazendo cara de quem acaba de sacar uma tese muito brilhante, ela disse o seguinte: “Estou aqui há 24 horas e ninguém me ofereceu ainda um cigarro de maconha e nenhuma menina introduziu um crucifixo na vagina”. Ora, ainda que provavelmente sem querer, isso  foi mesmo um achado. A percepção de Damares sobre a qualidade das pessoas que compareceram ao CPAC mostra que o nível intelectual do público esteve à altura dos pensadores no palco.
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POR José Pires

sábado, 12 de outubro de 2019

Eduardo Bolsonaro e a direita que não assume sua verdadeira cara

Eduardo Bolsonaro trouxe um evento internacional de direita e para isso usa dinheiro público. Como já é de praxe dizer, temos uma direita com hábitos muito parecidos com os da esquerda. Como se não bastasse se alimentarem mutuamente, ainda fazem da política uma farra em proveito próprio. O evento é promovido todos os anos nos Estados Unidos desde 1973 e já foi realizado algumas vezes no Japão. A Conferência de Ação Política Conservadora, o CPAC Brasil, terá seu custo bancado pelo instituto Índigo, vinculado ao PSL. A verba é do fundo partidário, de modo que a conferência começa de modo apropriado: tem a cara da direita brasileira.

A edição brasileira começa nesta sexta-feira em São Paulo e não promete nada de especial. Dificilmente escaparão do palavrório sem fundamento, trazendo uma séria discussão de ideias. A direita tem uma dificuldade histórica no terreno do pensamento político, por isso quem é de direita costuma se apresentar como conservador, como é o caso dessa conferência em São Paulo. O interessante é que acabam desfazendo na prática o que temos ouvido bastante nos últimos tempos, sobre o surgimento no Brasil do orgulho de ser de direita, depois de muitos anos em que ninguém tinha a coragem de declarar-se nesta posição.

O problema para a direita é arrumar fundamentos respeitáveis para defender sua visão tosca de mundo. Se for questionado sobre o assunto, um direitista vai acabar citando algum pensador conservador, o que obviamente é muito diferente como posição política. A direita tem também um passado de trevas, o que complica na sustentação política e na articulação de uma linha histórica. E não adianta vir com fake news dizendo que nazismo e fascismo eram de esquerda. A mentira histórica é de fazer Hitler e Mussolini se revirarem nas suas covas.

Este é um estigma que aflige líderes direitistas em todos os cantos. Na França, por exemplo, Marine Le Pen brigou publicamente com o próprio pai Jean-Marie Le Pen, líder histórico da direita francesa expulso pela filha do partido fundado por ele. O rompimento entre pai e filha foi para evitar a contaminação política do partido Frente Nacional com o legado histórico da direita francesa, profundamente negativo, com a marca na memória da colaboração da direita com a força de ocupação dos nazistas da Alemanha, na Segunda Guerra Mundial e o governo colaboracionista de Vichy, a grande vergonha francesa.

Voltando ao Brasil, o exemplo de Marine Le Pen serve também como referência do problema da direita brasileira para encontrar um pensamento político aceitável e com algum fundamento que possa ser levado a sério. Logo que Jair Bolsonaro foi eleito, jornalistas tentaram criar uma relação de ideais entre Marine e Bolsonaro, comparação repelida por ela com vigor. Foi muito esperta. Não seria nada sensato aceitar uma associação com alguém que não consegue ter reações adequadas nem em situações banais da política, além do tosco repertório de manifestações pessoais, onde não dá para extrair nenhum pensamento substancial, a não ser insultos, palavrões, xingamentos e uma total incapacidade de ouvir o que o outro tem a dizer.

Existe também sua galeria de ídolos, com destaque na relação de governantes de nomes como Alfredo Stroessner e Augusto Pinochet, que além de assassinos foram também ladrões. Com a ajuda de um estudioso, Bolsonaro poderia exaltar também os esquadrões paramilitares da direita em vários países, muitos deles subvencionados, treinador e armados por organizações da direita americana e pelo próprio governo dos Estados Unidos, como os chamados “Contras” da Nicarágua, que nos anos 70 e 80, logo depois da revolução sandinista, torturavam e matavam professores em aldeias afastadas para evitar qualquer progresso que na visão deles pudesse favorecer o governo sandinista.

Bolsonaro é uma figura política lamentável, mas para ser de direita no Brasil não há outro jeito, senão o de sustentar barbaridades do tipo que são ditas por ele, com as grosserias e seus tolos enganos, baseados em uma visão equivocada que não resiste a uma mínima avaliação de fatos históricos. O sujeito é sincero. Pelo menos cita Brilhante Ustra em vez de José Guilherme Merquior. Nisso ao menos Bolsonaro não mente: na doutrina de direita em terras brasileiras é preciso ressaltar a importância de tipos como Stroessner e Pinochet, cabendo também um lugar, digamos, de honra, ao sempre citado torturador Brilhante Ustra, tomando-se o cuidado inclusive de não misturá-los a figuras como o general Ernesto Geisel, que na cabeça dessa gente tinha uma certa queda liberal.

Quem é que pode encarar um panteão de restos mortais como estes para formar a base de um pensamento político? Está certa Marine Le Pen de ter escapulido rápido de certas referências tropicais. Daí este subterfúgio direitista também no Brasil, desta conferência da CPAC, que se apresenta como um movimento conservador. Conservador de jeito nenhum. São direitistas. Ao contrário do que dizem, o que conservam é a vergonha de assumir integralmente esta posição política. Para ser coerente, esta conferência deveria ter como epígrafe uma frase de Brilhante Ustra, talvez acompanhada de algo de Stroessner e Pinochet ou então uma fala do brigadeiro Burnier, envolvido no plano de explodir uma bomba durante um show no Riocentro, no final da ditadura, em 1981, que mataria centenas de jovens espectadores se não explodisse acidentalmente no colo de um oficial do Exército, conforme o que foi revelado depois por aquele velho militar que até hoje essa direita não aceita, o general Geisel.
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POR José Pires

quinta-feira, 10 de outubro de 2019

Peter Handke, o indesejado premiado

Ao dar o Prêmio Nobel de Literatura ao escritor austríaco Peter Handke os responsáveis pela premiação deram também um belo chega-pra-lá no politicamente correto. Handke, de 76 anos, ganhou o prêmio de 2019 e o de 2018, que estava pendente por causa de problemas internos na Academia Sueca, ficou com a polonesa Olga Tokarczuk, completamente desconhecida no Brasil e com poucas edições traduzidas mesmo na Europa. Ela tem 57 anos. O jornal El País conta que poucos romances seus foram traduzidos para o espanhol. O escritor austríaco teve mais obras traduzidas para o português, porém, como ocorre sempre no Brasil, quase todos seus livros estão esgotados.

Handke foi bastante traduzido para o espanhol, uma sorte para mim. Nos últimos meses andei baixando muita coisa dele, pelo interesse em seus ensaios. Ele é também um ótimo ensaísta, coisa rara entre escritores, Como este vem sendo o tipo de leitura que mais tenho feito ultimamente, para a minha satisfação vários livros seus de ensaios já foram traduzidos para o espanhol.

Olga Tokarczuck não deu sorte ao ser escolhida exatamente com Peter Handke. A história pessoal do austríaco tem aspectos políticos que já está fazendo a imprensa dar mais atenção à sua premiação. No popular, ele rouba a cena de qualquer um. Handke é uma das maiores surpresas da história do Prêmio Nobel e o espanto se deve ao seu apoio ao sérvio Slobodan Milosevic, ex-presidente da antiga Iugoslávia que morreu na prisão do Tribunal Internacional de Haia, em março de 2006. Milosevic esteve no comando de tropas responsáveis por um dos maiores horrores do final do século passado, a guerra dos Balcãs, na desaparecida Iugoslávia. Ele estava preso, acusado de genocídio.

Handke chegou a visitar o criminoso de guerra na prisão e esteve em seu enterro, que ocorreu em um dia em que caia muita neve, na cidade natal de Misolsevic. O El País conta que seu corpo foi enterrado embaixo de uma árvore, em sua casa natal. Sua mulher e seus filhos não compareceram, pelo risco de serem presos. Ficaram escondidos em Moscou. Handke não faltou e no funeral discursou em homenagem ao morto. Para ele, Haia havia errado e Milosevic era um injustiçado.

Pagou caro pelo apoio destemido. Sofreu isolamento e pressões. Enfrentou protestos e teve seu trabalho seriamente afetado. Uma peça sua teve cancelada a apresentação em Paris. Foi obrigado a recusar o prêmio literário Heinrich Heine, de 50 mil euros, concedido pela cidade de Düsseldorf, por causa da polêmica criada em torno de seu nome. Até agora vivia afastado do mundo literário, morando em uma localidade próxima de Paris, onde seus vizinhos nem sabem qual é sua atividade. Cercado pelos jornalistas no quintal de sua casa, logo que se soube da premiação, ele disse que a Academia Sueca “teve valentia” ao premiá-lo e não há como não concordar sobre a ousadia desse prêmio a um renegado.

Como poucas vezes nos últimos anos, os jurados pautaram-se acertadamente na qualidade literária, sem fazer concessões ao clima de julgamento moral tão em voga na atualidade. Não deram a mínima para o politicamente correto. Pode-se até se indignar com Peter Handke, quanto ao seu relativismo moral na avaliação da indignidade monstruosa ocorrida nos Balcãs, mas é indiscutível sua qualidade como escritor. Até pelo debate muito apropriado aos tempos que vivemos e que certamente será quentíssimo, o Prêmio Nobel se revigora com esta escolha.
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POR José Pires

Quem te viu e quem te vê, Chico Buarque

Chico Buarque é uma das figuras mais enganosas da esquerda brasileira, não só por seu papel lamentável no apoio incondicional a Lula, inclusive participando dos esquemas partidários do chefão do PT, nas campanhas em que o próprio condenado por corrupção se elegeu presidente, como também nas suas manipulações para exercer o domínio personalista sobre o partido e manter-se em destaque na cena política. É uma barra pesada o que esse pessoal anda fazendo com o nosso país, mas Chico fez coisas até muito piores que isso.

Nos anos 70 e 80, o compositor teve uma participação intensiva de apoio à ditadura de Fidel Castro. Não era apenas uma questão de opinião. Chico atuava diretamente como se fosse da diplomacia da ditadura, convencendo colegas brasileiros a participarem de shows e eventos culturais em Cuba, criando uma relação benéfica ao regime comunista cubano e com isso determinando pautas favoráveis na mídia brasileira, além evidentemente de fortalecer o castrismo na própria ilha.

O trabalho político de Chico servia também para evitar entre a esquerda brasileira a discussão sobre questões dramáticas que ocorriam em Cuba, como a falta de liberdade de expressão e o desrespeito aos direitos humanos, com a prisão de opositores, a tortura e a morte nas mãos das forças de segurança do Estado ou pelo sistema judiciário em que Castro sempre fez o que quis.

Em paralelo com as jogadas promocionais organizadas por Chico, a ditadura cubana vivia momentos de alta repressão, tendo havido nessa época até a morte de antigos companheiros de revolução de Fidel Castro, com prisões, torturas e fuzilamentos ocorridos em meio a uma luta interna pelo poder.

No Brasil, Chico servia como intermediário do esquema político de Fidel Castro, que ia além dos limites da ilha onde exercia seu domínio com mão de ferro, se estendendo a vários países latino-americanos com o financiamento de partidos e grupos políticos e também de movimentos armados. Uma história que mostra a interferência política direta de Chico foi quando acompanhado por alguém da embaixada da Nicarágua ele procurou o poeta Carlos Drummond de Andrade no meio da noite. A história é dos anos 80.

Os dois queriam falar de uma crônica publicada por Drummond no Jornal do Brasil sobre o fechamento do jornal La Prensa pelo governo sandinista. Exigiam que Drummond reconsiderasse as críticas feitas ao regime autoritário que começava a ser instalado na Nicarágua. Drummond contou que disse a Chico e ao funcionário do governo nicaragüense que só publicava algo quando estava bem fundamentado. E botou os dois para fora de sua casa.

Hoje em dia está absolutamente comprovado que era Drummond quem estava certo. Chico defendia Daniel Ortega, que está provado atualmente que além de gatuno é um sujeito bastante cruel. Centenas de opositores já foram mortos nos últimos meses na mesma Nicarágua, sobre a qual Chico atualmente não diz nenhuma palavra. Do mesmo modo, o compositor não deixa claro sua opinião sobre o que aconteceu com Cuba, até hoje um país sem liberdade e totalmente arrasado por um governo incompetente.

Cubanos que foram parceiros de Chico da época em que ele fazia a ponte aérea promocional do regime comunista entre Brasil e Cuba fazem críticas na atualidade sobre a falta de abertura democrática em seu país. Pablo Milánez, grande cantor cubano que já fez shows com o compositor brasileiro, dá entrevistas criticando a falta do cumprimento de Raúl Castro da promessa de abrir politicamente a ilha. O cubano Milánez aponta a necessidade da democracia, cobra rapidez na abertura. Já o Chico nem quer ouvir falar do assunto. Se alguém for questioná-lo é capaz dele ficar indignado, como faz sempre que é confrontado com suas responsabilidades.

Todos sabem como ele se faz de ofendido quando é cobrado politicamente. E logo ele, que se mete em tudo. No entanto, Chico Buarque deve explicações não só sobre suas posições atuais como também pelo seu papel de propagandista de uma ditadura terrivelmente brutal. Quando serviu de garoto-propaganda de Cuba nos anos 70 e 80, Chico usou seu prestígio para abafar discussões importantes na esquerda brasileira sobre a democracia e a liberdade de expressão.

Foi uma das lideranças que atuavam para evitar críticas ao legado histórico do totalitarismo e sua influência negativa nas lutas pela democracia na América Latina. Com esta estratégia, muita gente foi enganada durante todos os anos 70 e parte dos 80, deixando de saber o que de fato acontecia em Cuba e a influência negativa do autoritarismo esquerdista na atividade política em nosso país.

Bem, tudo isso que eu disse vem de fatos muito bem comprovados e Chico tem, sim senhor, que dar respostas sobre o que é de sua responsabilidade histórica, até porque se aquilo pelo que lutou desse certo, hoje em dia nossa situação poderia ser pior até do que a Venezuela.

Mas fica muito difícil levar esse debate necessário, exigindo compromissos democráticos dessa gente, quando entra em cena Jair Bolsonaro com sua truculência idiota, criando complicações em uma situação que é meramente de praxe, como no caso da sua assinatura como presidente da República no Prêmio Camões.

Bolsonaro abre a possibilidade de Chico se vitimizar e com ele toda a esquerda, como se todos fossem figuras inocentes que desejam apenas o bem da humanidade. E o pior é que este mimimi fraudulento não fica por aqui. Vai sendo repercutido no exterior, inclusive com declarações do compositor, que é claro que para falar sobre isso não se sente oprimido.

É para isso que serve Bolsonaro e esta direita de baixa qualidade mental, incompetente até em seus próprios objetivos. Torna vítima aos olhos do mundo uma esquerda que tinha mais é que dar explicações pelos males que só não causaram a nossa total desgraça porque os brasileiros reagiram antes do plano deles dar certo.
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POR José Pires

quarta-feira, 9 de outubro de 2019

Gilmar Mendes, um insucesso de público

Nos anos 70 e 80 havia em São Paulo um jornalista que era temido pela sua destruidora capacidade de fazer colar apelidos e qualificações terrivelmente irônicas em personalidades da cultura e da política. Telmo Martino tinha uma coluna no Jornal da Tarde. Era muito bem informado, escrevia bem, muito bem mesmo, e não perdoava ninguém. Claro que sua coluna era muito lida e isso num jornal que tinha uma qualidade de texto e gráfica que nenhum outro ultrapassou no Brasil. Naqueles tempos não havia jeito de deixar de pegar o Jornal da Tarde para saber quem tinha sido a vítima do Telmo Martino naquele dia. Mas isso é coisa bastante antiga. Meninos, eu vi. E vocês jamais verão coisa igual. O Jornal da Tarde fechou, Telmo Martino morreu em 2013, parece que no Brasil só vai ficando o que não presta.

E falando nisso, foi por causa da entrevista do ministro Gilmar Mendes ao programa Roda Viva, nesta segunda-feira, que me lembrei do Telmo Martino. Fiz questão de perder. Esta figura que Joaquim Barbosa acusava de ter capangas no Mato Grosso desgastou-se demais, de modo que que sua opinião deixou de fazer sentido. Afinal, quando Gilmar Mendes expressa uma opinião jurídica, fala algo sobre política ou trata de qualquer outro assunto, quem vai saber se ele está mesmo falando sério ou simplesmente fazendo jogo sujo? Acho que nem ele sabe mais. De tanto que troca de convicção, até em sessão do STF acaba dando voto contrário à decisões suas do passado.

Então, por excesso de exposição e carência de seriedade pessoal e como juiz, Gilmar Mendes deixou de ser uma figura que mereça a atenção. E pelo que eu soube da audiência do programa da TV Cultura, está mesmo muito feia a saturação do cara-de-pau. Foi daí que Telmo Martino me veio à memória. Foi um fiasco a audiência da entrevista com o ministro do STF. Com uma média de 0,8% no Ibope, o programa ficou em sexto lugar na TV aberta, ficando na rabeira até da Band e da Rede TV. É provável que isso faça os jornalistas pararem de botar o microfone na boca do Gilmar. Colegas, muito cuidado: ele espanta a audiência.

Pois na época em que Telmo Martino era um sucesso entre os leitores do Jornal da Tarde uma conhecida apresentadora de televisão recebeu dele um apelido fatal, que acabou pegando. A vítima do fino esculacho foi Marília Gabriela, que vivia estreando programa novo porque nenhum pegava no gosto do público. É capaz dela ter trocado mais de emissora que o Ciro Gomes de partido. Com a dificuldade de Marília Gabriela conquistar audiência, Telmo Martino apelidou-a de “mulher-traço”. Vejo que temos agora outro fenômeno de falta de telespectadores. O ministro Gilmar Mendes é o “homem-traço” da atualidade.
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POR José Pires

segunda-feira, 7 de outubro de 2019

Direita leva um chega-pra-lá dos eleitores em Portugal

Neste domingo a eleição em Portugal trouxe uma má notícia no plano internacional para Jair Bolsonaro, com a vitória da esquerda e a acachapante derrota da direita. O Partido Socialista vai se manter no poder. As coisas já não vão bem internacionalmente para o governo de Bolsonaro, atrelado a um discurso totalmente fora das necessidades atuais do mundo, que busca até de um modo desnecessário o confronto com as propostas de governos de países fundamentais na política internacional. Pois com o resultado em Portugal neste fim de semana as relações externas de seu governo ficaram ainda mais complicadas.

Entre os derrotados na eleição portuguesa se destacam forças políticas que se alinharam publicamente com Bolsonaro. A direita foi rejeitada totalmente. O maior perdedor foi o Partido Nacional Renovador (PNR), que festejou a eleição de Bolsonaro e se coloca entre os portugueses de forma muito parecida ao imponderado discurso bolsonarista. Levando aos portugueses propostas parecidas com as de Bolsonaro o PNR teve uma votação ridícula. Recebeu apenas 0,3% dos votos e ficará fora do Parlamento.

Outro partido de extrema-direita alinhando com as ideias de Bolsonaro, o Chega, teve melhor sorte, mas ainda assim elegeu somente um deputado entre os 130 da Assembleia da República. No geral. O resultado desta eleição é avaliado como um referendo à gestão do primeiro-ministro socialista António Costa. A contagem final deu 106 deputados ao PS, 36% dos votos em um parlamento de 230 cadeiras. A apenas dez cadeiras da maioria absoluta, a sigla deve se compor com facilidade com partidos de esquerda apoiadores do governo socialista nos últimos quatros anos.

A eleição foi um sinal positivo às políticas de esquerda de Costa, que no discurso de vitória deu um chega-pra-lá na direita. O resultado é tido pelo líder socialista como a “maior derrota da direita em Portugal”, onde a definição de direita traz naturalmente a memória do salazarismo, regime fascista comandado por Antonio Salazar, ditadura fascista que durou 33 anos e deixou o país entre os mais atrasados da Europa, em pior situação até do que alguns países do leste europeu dominados pela então União Soviética. Não adianta a direita brasileira procurar fraudar os acontecimentos mundiais para seduzir os brasileiros com uma ideologia ultrapassada. De um modo até pior que o comunismo, na Europa a direita é ligada ao passado pelo atraso de pensamento, o desrespeito à democracia e os crimes contra os direitos humanos.

Ao contrário da má lembrança que o passado traz grudado à direita portuguesa, o PS é associado historicamente ao honroso legado do 25 de abril, da Revolução dos Cravos, que no ano de 1974 derrubou a ditadura de Salazar. Com isso, Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e Timor Leste também ganharam a independência. O regime salazarista tinha até esse componente de atraso, estendendo a opressão militar de forma colonial em terras africanas. Como se vê, a direita portuguesa tem uma carga pesada.

O voto dos portugueses neste domingo foi também um não à proposta do enfrentamento de problemas pela via do discurso violento e desagregador, algo que aqui no Brasil já é possível saber que tecnicamente é um absoluto desastre, além tornar a vida muito chata. Bolsonaro nunca disse o que pensa de Salazar, mas para um sujeito que gosta do sanguinário ditador Pinochet é provável que na sua cabeça o ditador português mereça um lugar de destaque em galeria pessoal de ídolos, onde conforme declarações suas, consta com muita honra o ditador paraguaio Alfredo Stroessner.

A votação dos portugueses indica que não haverá encontro entre os caminhos de Portugal e Brasil por meio de conversas extremadas, com ideias atravessadas de direita e a exaltação requentada de fórmulas políticas autoritárias, cruéis e de um atraso que é da mais espantosa burrice. Assim, deixamos de ter aberta uma porta importante para nossa entrada na Europa. O problema é que para este improvável presidente tudo resolve-se de forma pessoal. E pelo nível de empatia, o mais provável é que nosso país-irmão tenha ficado um pouco mais longe de nós neste domingo.
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POR José Pires


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Imagem- Outdoor em homenagem à eleição de Bolsonaro, colocado em Portugal em novembro
do ano passado pelo Partido Nacional Renovador. Na eleição deste domingo o partido português
de direita não elegeu nenhum deputado