quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

A esquerda do cala-boca

Um ornitorrinco não é um pato só porque tem um bico. Mas quando um animal tem orelha de porco, focinho de porco, olhos de porco, pés de porco e até o rabinho retorcido de um porco, com certeza certeza o bicho é um porco. Sem a intenção de nenhum desmerecimento aos porcos, não há como se enganar sobre o conceito que está expresso nas ofensas que grupos de esquerda fizeram à blogueira cubana Yoani Sanchéz.

Já escrevi aqui sobre a nauseante nostalgia dos piquetes da esquerda contra a liberdade de expressão da jornalista cubana em visita ao Brasil e falei da sensação ruim que causa essa posição totalmente fora do tempo dessa militância azucrinadora que busca requentar a Guerra Fria tentando colocar nosso país numa dimensão de tempo desconectada com o que nós todos — de esquerda, direita, centro ou seja lá o que for — tivemos a oportunidade de aprender no desenvolvimento da nossa própria história, inclusive com lágrimas que mancham até hoje a memória brasileira.

O que vimos na Bahia no absurdo desrespeito à liberdade de expressão feito por grupos que conseguiram impedir inclusive a exibição de um documentário dirigido pelo cineasta brasileiro Duda Galvão é algo bastante conhecido de todos nos últimos anos aqui no Brasil. Na imagem, a cubana caminha escoltada pela polícia em proteção contra ataques da esquerda. Esta intimidação da crítica e do livre debate vem de longe e bem lá de cima. Qualquer um que busca expor seus pensamentos hoje em dia em nosso país conhece muito bem os métodos dessa esquerda brasileira ainda tão cega pelos erros que não consegue ver nem a possibilidade do uso dos acertos que ficam para trás.

O que aconteceu na Bahia nasceu evidentemente no Palácio do Planalto com a concepção histórica de poder do PT misturada à necessidades ditadas pela propaganda política governamental e o marketing eleitoral progressivo que é mantido até nos assuntos de Estado. É um conceito que tem sua origem neste centro de poder e também das sedes oficiosas dentro do partido, além de escritórios políticos espalhados por todo o país, muitas vezes mantidos com dinheiro público.

Sabe-se que o próprio PT tem uma política de comunicação que abrange até táticas de contra-informação, buscando inclusive profissionalizar com ares de militância os espaços de opinião de leitores nas publicações impressas e na internet. A falta de responsabilidade com o direito alheio pode fazer dirigentes políticos ávidos de poder se despreocuparem com o efeito social de ações desse tipo, mas nós temos que nos ocupar disso antes que a serpente se instale de vez.

Que ninguém se engane. A mão que tentou tapar a boca da blogueira cubana na Bahia precisa ser discutida, atacada e desmoralizada dentro dentro deste trabalho árduo da construção da democracia em nosso país. Se esta mão pesada não for enfraquecida ela pode acabar tapando também as nossas bocas.
.....................  
POR José Pires

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Ecos de erros antigos

Quando finalmente for dado um fecho na Revolução Cubana e o grupo em volta dos irmãos Castro tiver que se mandar para um outro país o Brasil é um bom lugar. Quando soube das manifestações contra a blogueira cubana Yoani Sanchéz, que está em visita ao Brasil, tive a impressão de que temos aqui os últimos milicianos do regime de Fidel Castro. A selvageria e o despropósito das ações agressivas contra a moça me soou muito parecido com acontecimentos antigos ocorridos em Cuba. Mas isso há muito anos atrás, porque hoje em dia o desgaste que os cubanos sofrem no seu cotidiano não estimula um fanatismo de massa como já existiu antes dos anos oitenta.

Um grupelho bem restrito mesmo foi atazanar a visita de Yoani, conseguindo impedir até a exibição de um documentário sobre a liberdade de expressão feito pelo cineasta brasileiro Dado Galvão. A jornalista cubana é a figura central do filme. Ela ficou conhecida internacionalmente há poucos anos a partir de seu blog, onde trata de assuntos de seus país de forma crítica, na medida do possível em uma ditadura. O blog existe desde abril de 2007.

O bando que se articulou para ofender a blogueira tem por detrás o PCdoB, entre outros partidecos. Este partido foi o que lançou recentemente uma nota ridícula homenageando o falecido ditador da Coréia do Norte que deixou o filho para ocupar seu lugar no comando do país. O PCdoB está também sempre envolvido em escândalos de corrupção, uma rotina que levou até à demissão de um dos ministros da cota do partido no governo do PT.

Mas eu falava da nauseante nostalgia que vi nas manifestações contra a cubana Yoanni, em acontecimentos que lembram o que de pior já aconteceu em Cuba. Pois em um post publicado hoje em seu blog, ela escreve que ouviu durante as manifestações dos extremistas azucrinadores (o adjetivo é meu) lemas que não se escutam mais há anos nem em Cuba.

O texto publicado por ela é, de certo modo, uma resposta ao desrespeito que ela sofreu da parte dessa militância ridícula que tem logicamente mãos muito acima manipulando seus cordéis. Publico abaixo a tradução que fiz do post, pois vejo nele um documento interessante, quase um aviso de que podem estar sendo repetidos por aqui erros que fizeram muito mal ao país de onde a blogueira só conseguiu sair recentemente, pois em Cuba até pra viajar é preciso permissão do governo.

Só mais uma coisa, antes que a militância azucrinadora venha encher os meus piquás: não recebi nenhum tostão da CIA pela tradução.
.....................  
POR José Pires

___________________


O TEXTO DE YOANI SANCHÉS:

“Talvez vocês não saibam – porque nem tudo se conta em um blog – mas o primeiro ato de repúdio que vi na minha vida foi quando eu tinha apenas cinco anos. A agitação no prédio chamou a atenção das duas crianças que éramos minha irmã e eu. Nos debruçamos sobre a grade do estreito corredor para olhar o que acontecia no andar de baixo. As pessoas gritavam e levantavam o punho ao redor da porta de uma vizinha. Eu era tão nova que não tinha a menor ideia do que ocorria. E mais, agora quando recordo aquilo tenho apenas uma lembrança do corrimão gelado entre meus dedos e um vislumbre brevíssimo dos que gritavam. Anos depois pude finalmente armar aquele caleidoscópio de recordações infantis e soube que havia sido testemunha da violência contras os cubanos que queriam sair do país pelo porto de Mariel (*).

Pois bem, desde aquele acontecimento vivi vários outros atos de repúdio. Seja como vítima, observadora ou jornalista... nunca – vale esclarecer – como vitimizadora. Recordo um especialmente violento que sofri junto às Damas de Branco [grupo de parentes de prisoneiros políticos de Cuba], quando os bandos da intolerância cuspiram em nós, nos empurraram e até puxaram os nossos cabelos. Mas o que aconteceu ontem à noite [no Brasil] foi inédito para mim. O piquete de extremistas que impediu a projeção do filme de dado Galvão em Feira de Santana [Bahia} era algo mais que uma porção de adeptos incondicionais do governo cubano. Todos tinham, por exemplo, o mesmo documento – impresso em cores – com uma série de mentiras sobre mim, tão maniqueístas como fáceis de rebater numa simples conversação. Repetiam uma cartilha idêntica e grosseira, sem ter a menor intenção de ouvir o que eu tinha para dizer. Gritavam, interrompiam, em um momento foram até violentos e de vez em quando gritavam um coro de lemas como esses que já não se diz nem em Cuba.

Entretanto, com a ajuda do senador Eduardo Suplicy e a calma diante das adversidades que me caracteriza, afinal conseguimos começar a falar. Resumo: só sabiam gritar e repetir as mesmas frases, como autômatos programados. E isso tornou a reunião ainda mais interessante! Eles tinham as veias do pescoço inchadas, eu esboçava um sorriso. Eles faziam ataques pessoais, eu levava a discussão para a situação de Cuba, que sempre será mais importante que esta humilde cidadã. Eles queriam linchar-me, eu conversar. Eles obedeciam à ordens, eu sou uma alma livre. No final da noite eu me sentia como depois de uma batalha contra os demônios do mesmo extremismo que atiçou os atos de repúdio daquele ano de oitenta em Cuba. A diferença é que desta vez eu conhecia o mecanismo que fomenta estas atitudes, eu podia ver o longo braço que os move desde a Praça da Revolução em Havana.”

(*) Aqui ela fala da saída em massa de cubanos do país ocorrida em dezembro de 1980, conhecido como "Fuga de Mariel". Um total de 125 mil pessoas deixou Cuba pelo porto de Mariel, com destino à Flórida.

domingo, 10 de fevereiro de 2013

sábado, 2 de fevereiro de 2013

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013