quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Sarney mente em discurso

O jornal O Estado de S. Paulo pegou o discurso do presidente do Senado, José Sarney, proferido ontem para se defender da sucessão de escândalos que trazem seu nome à frente, e analisou ponto por ponto.

O jornal encontrou várias manipulações feitas em proveito próprio pelo senador — que o Estadão chama, sei lá por quê, de “deslizes”, quando são, na verdade, mentiras que tem por trás todo um planejamento de equipe. Algumas são de uma desfaçatez abusada, mesmo para um Sarney, como quando diz que não conhece Rodrigo Cruz, nomeado para um cargo no Senado. “Rodrigo Cruz, também não sei quem é”, ele diz. “Incluíram como se fosse nomeado por mim”. Rodrigo Cruz casou com a filha de Agaciel Maya, Mayanna. Sarney foi padrinho do casamento há poucos dias.

Abaixo estão algumas pérolas da manipulação feita por Sarney e desmentidas com fatos pelo jornal. Os trechos da fala de Sarney vão aspadas. As observações do Estadão estão em azul.


"Aguentei 12 mil greves, sem que nunca tivesse pedido um dia de prontidão militar, e crescemos, àquele tempo, a números que até hoje não se repetiram. Criamos uma sociedade democrática que, num sistema de capilaridade, penetrava em todas as camadas."
Em 1988, quando os metalúrgicos de Volta Redonda (RJ) entraram em greve e ocuparam a Companhia Siderúrgica Nacional, o então presidente Sarney enviou o Exército para reprimi-los. No conflito, três jovens operários foram mortos e 31 saíram feridos.

"Eu acho que ninguém aqui nesta Casa sabia ou podia pensar que existisse ato secreto. Acho que é necessário esclarecer primeiro ao povo brasileiro o que se chama ato secreto."
Sarney anulou os atos secretos num primeiro momento

"Assim, esses atos, a meu ver, tinham uma nulidade essencial. Por isso, eu, pelo Ato 294, de 14 de julho de 2009, anulei todos eles,"
Esta semana, o Senado anunciou que abrirá um processo para cada funcionário nomeado por ato secreto. Enquanto isso, esses funcionários seguirão trabalhando.

"não se nomeia para o gabinete quem não for requisitado para nomear pelo Senador; e ele foi feito. Está aqui a requisição ao Diretor-Geral, do Senador Epitácio Cafeteira, que já teve a oportunidade de confessar que não me disse que tinha nomeado."
Cafeteira confessou que nomeou João Fernando a pedido de Fernando Sarney, filho do senador.

"Eu requisitei do Ministério da Agricultura para a Presidência e pedi ao Senador Delcídio que a colocasse no gabinete em Mato Grosso, porque ela tinha se casado, e assim ela continuava trabalhando, não me julgando que nisso houvesse qualquer falha ou qualquer..."
Nomeada em 2003, Vera Macieira já vivia em Mato Grosso naquele ano. Ela não se mudou para o Estado na época da nomeação.

"Isabella Murad Cabral Alves dos Santos - Também não é minha parenta. Foi nomeada pelo Senador Cafeteira, que, segundo me afirmou, foi a pedido do Sr. Eduardo Lago, que é primo do Governador do Maranhão, que era meu adversário, e não por mim." Sarney não disse, mas Isabella Murad é sobrinha de seu genro, Jorge Murad. Ele apontou o parentesco do empresário Eduardo Lago com adversários seus na política maranhense. Lago, entretanto, é ligado à família Sarney. A Polícia Federal investiga depósitos feitos por ele, às vésperas da campanha eleitoral de 2006, em contas controladas pelo filho de Sarney, Fernando.

"Luiz Cantuária, também não sei quem é Luiz Cantuária."
É político do Amapá, ligado a Sarney. Foi nomeado para vaga no Conselho Editorial, que Sarney preside.

"Rodrigo Cruz, também não sei quem é. Incluíram como se fosse nomeado por mim."
Sarney foi padrinho de casamento de Rodrigo Cruz no dia 10 de junho. Rodrigo se casou com a filha de Agaciel Maia, Mayanna. Ele trabalhou dois anos no Senado por meio de ato secreto.

"Perdão, eu pulei Ivan Sarney. Ivan Sarney trabalhou aqui dois anos - em 2003 ou 2004, não me lembro, 2005 -, no gabinete do Senador João Alberto, que não é mais nem um gabinete, e é incluído aqui como se estivesse na lista entre a minha maneira de fazer nepotismo dentro da Casa."
Ivan Sarney é irmão de José Sarney. E o ex-senador João Alberto é aliado de primeira hora dos Sarney na política maranhense. Hoje, é o vice de Roseana.

"Outra denúncia que fizeram é que meu neto tinha sido privilegiado com agenciamento de créditos consignados de forma fraudulenta. Meu neto nunca teve nenhuma relação com o Senado."
O próprio neto de Sarney, José Adriano, admitiu ao 'Estado' que operava no Senado, que era, nas palavras dele, o 'carro-chefe' de sua empresa. A Sarcris representava o banco HSBC.

"Tratou-se também da Fundação Sarney, acusando-me de nela ter funções administrativas e ter negado isto desta tribuna."
Como presidente vitalício, posto que lhe é conferido pelo estatuto da fundação, Sarney tem responsabilidades sobre a entidade. A Fundação José Sarney desviou dinheiro recebido da Petrobrás para empresas fantasmas e para empresas da família Sarney.

"Não há nelas qualquer palavra minha, mesmo nessa gravação, em relação à nomeação por ato secreto. É claro que não existe o pedido de uma neta; se pudermos ajudar legalmente, qualquer um de nós não deixa de ajudar."
O senador não usa o termo ato secreto. Mas foi por ato secreto que, depois de seu empenho pessoal, o namorado da neta foi nomeado.

"Agora, quero mostrar aos senhores os métodos que foram adotados. Não encontrando nada contra mim, então faltando - acho - notícia, querendo generalizar - os senhores vão ficar pasmados - fraudaram a fita que distribuíram aos jornais e incluíram o meu nome com a voz de uma outra pessoa,"
Sarney se referia, especificamente, a gravação feita durante a Operação Navalha, que investigou o empreiteiro Zuleiro Veras, dono da construtora Gautama. No discurso, tentou generalizar a suspeita. Não há nenhum questionamento sobre as gravações em que ele se refere à contratação do namorado da neta, feitas em outra operação.
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POR José Pires

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