quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Um colar de irresponsabilidades


Pena que o presidente Lula não goste de ler. É também mentiroso, pois disse que prefere uma esteira. Esteira? O barrigão prova que ele também não é chegado nisso. Mas deixa a esteira pra lá. Lula deveria ler a autobiografia de Eric Clapton. É uma história cheia de lances interessantes, a trajetória de um artista que conseguiu fazer música popular de grande qualidade ultrapassando os limites da indústria cultural dos Estados Unidos. Clapton é inglês, mas é como se ninguém estivesse interessado nisso. Está mais vinculado aos Estados Unidos, onde descobriu a riqueza da música popular, especialmente o blues, matéria-prima que usou para criar uma das obras musicais mais marcantes no mundo.

É claro que alguém como Clapton tem muita história para contar e, neste livro, ele narra com sinceridade o que viu. A autobiografia é também um interessante relato do desvio ocasionado pela droga, desvio que acaba em um inferno, mas do qual, no final, ele acabou escapando.

As drogas quase acabaram com a sua vida. Somando tudo o que ele aspirou, injetou ou jogou boca abaixo em seu corpo, é até uma surpresa que ele tenha sobrevivido. Do amontoado de viagens trágicas saiu até uma música, "Cocaine". É como se fosse um anti-jingle e ele vai no ponto certo, tocando na força sedutora da droga, na sua função como fuga eficaz da complexidade da vida e até dos problemas. A miséria, é claro, vem depois.

Mas milhões de pessoas não tem a felicidade de escapar do pior. Em vários países do mundo a droga destrói cedo a vida dos jovens. Famílias inteiras se destroem quando a droga se faz presente. A cocaína é uma das mais poderosas, tanto no efeito sedutor, quanto na força que ela acabou conferindo ao crime no mundo todo. Hoje bandos terroristas dominam comunidades inteiras, onde os bandidos têm poder de vida e morte sobre as pessoas. Os criminosos chantageiam, subornam, torturam e matam. Estão entrelaçados com setores da polícia e também já entraram com peso na política partidária.

Claro que Lula poderia ter a informação sobre o problema terrível que é a cocaína recebendo informações até na cidade onde tem sua casa, ou melhor, seu apartamento de cobertura no ABC paulista. Não precisa do livro de Clapton, nem precisa ler nada. O porteiro de seu prédio poderia informá-lo o que as drogas significam em São Bernardo do Campo e em todo o Brasil.

Não é o porteiro que vai lhe dizer isso, mas talvez sua consciência, se ainda houver um pouco de responsabilidade lá por dentro, bem fundo, onde a política ainda não implantou o cinismo, então pode até acontecer de ele perceber que não é correto sair em fotos com um colar de folhas de coca no pescoço.
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POR José Pires

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