sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Queermuseu: MBL e o curador da exposição afinal se encontram

A rádio Guaíba, de Porto Alegre, conseguiu juntar representantes do MBL e Gaudêncio Fidelis, para debater os acontecimentos que levaram ao fechamento da mostra “Queermuseu”, que virou notícia nacional depois da medida tomada pelo banco Santander, patrocinador da exposição. O encontro foi no programa "Esfera pública". O debate é inédito e deve ficar por aí, porque é improvável que Fidelis, curador da exposição, queira ver de novo frente a frente algum integrante do movimento de rua.

Uma situação tão rara poderia ter sido melhor explorada, mas faltou habilidade profissional aos dois apresentadores do programa para conduzir com equilíbrio o debate de assunto tão quente, ainda mais com gente envolvida em um conflito político agressivo como este. Os apresentadores Juremir Machado e Taline Oppitz não tiveram o devido distanciamento. Machado até que se conteve em boa parte do programa, mas Oppitz parecia fazer parte da equipe do curador Fidelis. Ela é do tipo que não deixa ninguém falar. Foi bastante agressiva com a dupla do MBL, em especial contra Arthur do Val, o youtuber que ficou conhecido na internet com suas intervenções em manifestações políticas de esquerda, de onde extrai um bom material, criando discussões com entrevistas provocadoras, com situações às vezes explosivas e altamente reveladoras.

Também pelo MBL, no debate estava Paula Cassol, coordenadora estadual do MBL gaúcho. Teve boa participação, conduzindo-se com equilíbrio e mostrando uma qualidade rara hoje em dia, que é saber ouvir. É também bem articulada, sabendo também colocar muito bem seu pensamento. Na discussão, tanto ela quanto do Val mantiveram-se no aspecto político, sem se envolverem nas questões artísticas do tema. Em teoria, na questão cultural o curador Fidelis é quem se daria melhor, mas ele ficou muito aquém dessa expectativa, trazendo pouca fundamentação para uma melhor compreensão dos aspectos conceituais da polêmica exposição.

Tenho visto entrevistas do curador da “Queermuseu” e em nenhuma delas é possível obter dele boas avaliações no ponto cultural deste debate. Por sinal, é a primeira vez que vejo um curador indignado com a repercussão de algo de sua criação. E não estou com ironias. O sujeito fez uma mostra que tem como fundo a política de gênero, assunto que não é de hoje que vem criando muita polêmica. Mas parece que ele não gosta nem um pouco que haja divergência sobre sua forma de ver e expor a sexualidade nos dias de hoje. Está sempre insistindo em desqualificar o MBL e fica só nisso. Não amplia o debate cultural e ainda acusa o MBL por algo que o movimento não vem fazendo, que é censura. Não tenho nenhuma identificação política com o MBL, mas no caso dessa exposição o movimento não vem fazendo nada mais do que qualquer instituição parecida faz no mundo todo, inclusive movimentos de esquerda, que mesmo no Brasil já fizeram até pior.

Fidelis tem dificuldade de enfrentar um debate. Quase abandonou o programa no meio, durante a transmissão ao vivo. Chegou a se levantar e sair da mesa por duas vezes. Voltou só depois de apelos dos apresentadores. No programa da Guaíba esteve também Álvaro Clark, filho de Lygia Clark, artista já falecida, que tem uma obra na exposição. Pode-se até achar que não faria sentido sua presença num debate como este, mas do ponto de vista da arte ele trouxe elementos importantes sobre a obra de Lygia Clark, uma das que estão no centro da polêmica. E o interessante é que sua explicação sobre esta obra não confere com a interpretação de Fidelis, exposta na apresentação do projeto do “Queermuseu”. A obra é de 1967, bem distante das preocupações atuais da esquerda com política de gênero, que é base do conceito desta exposição.
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POR José Pires

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Imagem- O curador se levanta para sair, numa das vezes que abandonou o debate

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