terça-feira, 27 de março de 2018

Sergio Moro: equilíbrio e objetividade no Roda Viva

Nesta segunda-feira o programa Roda Viva teve uma edição especial, não só pela presença do juiz federal Sergio Moro, mas por ser também o último comandado por Augusto Nunes. O jornalista tem uma ligação muito especial com o programa da TV Cultura, de tal forma que tornou-se marcadamente parte da cara do programa. Nunes sabe dar o equilíbrio entre o formato de bate-papo e entrevista que fez do Roda Viva o mais importante programa de entrevistas da televisão brasileira. Ele deixa a conversa correr solta e ainda consegue manter uma pauta coerente com o que tem que ser extraído do entrevistado. Com educação, evita que entrevistadores apareçam mais que o próprio entrevistado, o que pode atrapalhar qualquer entrevista.

A despedida do jornalista foi em grande estilo. Esta edição com Moro é de grande qualidade e para lá de oportuno, em razão de acontecimentos na área do Judiciário que exigem esclarecimentos de quem vive por dentro do sistema, com o conhecimento pleno sobre as conseqüências das evidentes articulações para barrar o caminho ético que a Lava Jato trouxe ao país, encampado pela maioria da população com um ativismo político do maior equilíbrio e espontaneidade, como nunca houve em nossa história recente.

Sergio Moro tem uma forma muito eficiente de encarar os problemas, que hoje em dia com a facilidade da internet pode ser observado em sua atuação profissional nos vídeos de interrogatórios e também no contato com a mídia. Ele responde toda pergunta objetivamente e não potencializa dramas construídos artificialmente pelo interesse de jornalistas, políticos ou quaisquer figuras que atuam mais sobre a dramaticidade das questões brasileiras do que na sua compreensão equilibrada.

O mundo não melhora depois de uma entrevista como esta do juiz Moro, mas com certeza assuntos importantes foram repostos em sua devida ordem, inclusive temporal, além de avaliados também nas suas conseqüências que podem ser muito graves, mas estão sempre sujeitas a ajustes democráticos. O caso da queda da prisão a partir de condenação em segunda instância, por exemplo, é um desses desajustes muito perigosos para o país, mas que ainda assim podem ser resolvidos depois.

Moro mostrou como a prisão em segunda instância não se atém à condenação de Lula. Este é um problema político que Lula e seus companheiros procuram criar artificialmente (e sou eu que digo isto, não o Moro). Pela condenação em segunda instância já estão presos vários tipos de criminosos, de traficantes a pedófilos. Resumindo — e sou eu de novo que digo —, a queda da condenação em segunda instância traria benefícios a Lula e outros salafrários da política, mas pode soltar também perigosos pedófilos. Com isso, porém, Moro não toca fogo na opinião pública como costuma fazer muita gente com acesso aos microfones da mídia. Para ele, caso isso ocorra, em poucos meses ocorrerá uma eleição que pode consertar o estrago. E ele está certo nisso. Temos problemas muito graves, mas nunca foi possível, em país nenhum do mundo, dar condução de qualidade aos problemas nacionais em clima de histeria coletiva. Queimar pneus nas ruas também não funciona na resolução dos mesmos problemas.

Quanto ao que o juiz falou no Roda Viva, não se escapa evidentemente das mais variadas interpretações sobre a entrevista, que podem dar uma dramaticidade aos assuntos que não existiu em sua fala. Para não cair em engodos de caça-likes basta ver o programa, o que é muito fácil na internet, inclusive em trechos que as pessoas costumam recortar e postar no Youtube.

Essa conversa de que ele deu um recado para a ministra Rosa Weber, por exemplo, é algo que não houve. Foi apenas relatada sua convivência profissional com a ministra, quando ele falou sobre sua capacidade técnica e a seriedade. Só isso. Mas já se vê o alarde muito comum hoje em dia, com a carga artificial de dramas da mídia e das redes sociais que atrapalham todo raciocínio sensato. A internet é uma montanha-russa, mas sobe nela quem quer. O indivíduo pode começar o dia com muitas esperanças na humanidade e depois passar a tarde desejando uma bomba atômica caindo sobre todo o mundo. Embarcar neste passeio não esclarece nada.

Esta histeria nacional recebe a contribuição até mesmo juízes da mais alta Corte do Judiciário, com alguns deles querendo atrelar a seus egos as grandes questões nacionais, fazendo do país um palco para seus defeitos de personalidade, problemas de temperamento, inquietações pessoais e até das dificuldades de relacionamento no ambiente de trabalho, com tudo isso, é claro, filmado e transmitido ao vivo para todos os brasileiros. Não é o caso do juiz Sergio Moro, o que pode ser comprovado no Roda Viva, nesta entrevista exemplar, ainda mais importante pela forma de encarar as graves questões nacionais com equilíbrio e profissionalismo. Caso um dia os brasileiros encontrem um jeito de dar ao país um clima de normalidade e relativo progresso, lá adiante, com o correr dos anos, poderemos assistir um programa como este e nos perguntarmos por que afinal havia tanta aflição nos dias de hoje.
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POR José Pires

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Imagem- Augusto Nunes conversa com Sergio Moro antes do início do programa

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