A crise venezuelana aterrissou na Espanha, atingindo com impacto o governo do socialista Pedro Sánchez, recém-conduzido à presidência do governo espanhol. A complicação se deve a uma estranha passagem pela Espanha na semana passada de Delcy Rodríguez, vice-presidente do ditador Nicolás Maduro. Seu avião privado desceu em Madri, em escala técnica de viagem até Istambul, na Turquia, contrariando sanção imposta pela União Européia (UE) contra o governo de Maduro. O problema maior para os socialistas foi um encontro no próprio avião entre a vice de Maduro e o ministro de Transportes, José Luis Ábalos. Segundo o governo espanhol, o ministro foi para alertar a dirigente venezuelana de que a venezuelana não poderia tocar o solo espanhol, sob o risco de ser presa.
Delcy Rodríguez está entre 25 personalidades venezuelanas proibidas de viajar a qualquer país membro da UE. Devem ser presos se pisarem o solo europeu. Naturalmente, a oposição reagiu ao encontro de um dos ministros mais influentes do governo Sánchez com a vice-presidente venezuelana, argumentando que bastaria um aviso da torre do aeroporto. As sanções da UE obrigavam a Espanha a impedir o trânsito da vice-presidente venezuelana. O governo esquerdista espanhol vem sendo cobrado por ter aceitado a visita inoportuna. Cabe apontar que certamente a atitude do governo Sánchez seria diferente com a visita incômoda da autoridade de uma ditadura de direita.
Lembro também que foi por ordem de um juiz espanhol, Baltasar Garzón, que o ditador Augusto Pinochet foi preso em 1998 na Inglaterra, depois de ter tomado um chá com ex-primeira-ministra inglesa Margareth Thatcher. Sua prisão marcou de tal forma a jurisprudência internacional em relação a governantes criminosos que obrigou Fidel Castro a tomar mais cuidado com suas viagens ao exterior. Depois disso, o ditador cubano não saiu mais da ilha sob seu poder.
O governo espanhol poderia ter dado seguimento à regra, fazendo a prisão da companheira de governo do criminoso Maduro. Acontece que o Partido Socialista de Sánchez sofre a influência de poderosos membros com forte ligação com o governo bolivarianista da Venezuela. São laços suspeitos, que parecem ser de contas a pagar, obrigações que não seriam apenas ideológicas. É muito parecido com as suspeitas que caem sobre o ex-presidente Lula e seu partido, na incondicional submissão dos petistas ao regime instalado por Hugo Chávez na Venezuela e também à ditadura cubana. No caso espanhol, alguns opositores falam de um possível financiamento dos socialistas espanhóis pela narcoditadura de Caracas.
Independente disso ser ou não verdadeiro, razões muito especiais impediram o presidente Sánchez de recusar a se encontrar em Madri com o opositor venezuelano e presidente da Assembleia Nacional, Juan Guaidó. Em viagem a Davos para o Fórum Econômico Mundial, Guaidó foi recebido em Paris pelo presidente francês, Emmanuel Macron e pelo primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, em Londres. Em Madri, Guaidó se encontrou neste sábado com a ministra das Relações Exteriores, Arancha González Laya. A reunião foi na instituição da Casa da América, mas não na sede do ministério, como manda o protocolo.
O presidente espanhol justificou a indelicadeza como sendo para preservar a Espanha como intermediadora na crise venezuelana. A oposição o acusa de não definir seu lado em relação a uma ditadura.
O posicionamento em favorecimento ao governo de Nicolás Maduro criou um racha importante no Partido Socialista, opondo duas figuras históricas do partido, os ex-presidentes José Luis Rodríguez Zapatero e Felipe González. Zapatero acha que Sánchez acertou em não receber Guaidó, no entanto este ex-governante espanhol é antigo parceiro da ditadura bolivarianista, desde quando Hugo Sánchez estava vivo. Já González, afirmou que Guaidó teria de ser recebido pelo presidente da Espanha, ressaltando sua posição dizendo que ele é “o único representante legitimado democraticamente” e definindo o atual governo venezuelano como “tirania de Maduro”.
A visitinha da vice de Maduro teve um peso negativo alto para o governo Sánchez, que voltou ao poder no início deste ano em eleição parlamentar com a diferença de apenas dois votos, em um governo de coalizão com o ultraesquerdista Unidas Podemos. A eleição teve a oposição fortalecida, inclusive com o sucesso eleitoral de uma direita mais radical. Para voltar ao poder, Sánchez teve também que fazer acordo com a esquerda separatista da Catalunha, garantindo a vitória com a abstenção de 13 deputados da Esquerda Republicana da Catalunha (ERC). Isso coloca o Partido Socialista como alvo fácil da oposição, que procura se posicionar no papel da defesa da unidade da Espanha e marcar a esquerda como anticonstitucional e divisionista.
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POR José Pires
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Imagem- O presidente espanhol Pedro Sánchez, em pose com outro criminoso latino-americano, durante visita em
fevereiro de 2015 ao ex-presidente Lula, condenado por corrupção e lavagem de dinheiro. A foto é do
fotógrafo particular do petista, Ricardo Stuckert