domingo, 27 de janeiro de 2008

Paulo Patarra, um bravo jornalista

O jornalista Paulo Patarra morreu na segunda-feira passada, aos 73 anos, vitimado por um câncer na garganta. Patarra fumou durante 61 anos. Passou seu último ano de vida sem poder falar, depois que a doença obrigou a retirada da laringe e das cordas vocais. O cigarro é mesmo um vício terrível: horas antes da operação,em 2006, o jornalista fumou um último cigarro. Não duvido que tenha desejado uma última tragada antes de ir.

Mas Patarra era mesmo um bravo. Estava bem humorado em sua última entrevista, feita por escrito e publicada em abril do ano passado pelo ABI Online, site da associação Brasileira de Imprensa. Depois de quatro horas de entrevista − feita no hospital − escreveu nas anotações do repórter: “Falamos, não? Imagina só se eu não estivesse mudo!”.

Conheci Patarra no jornal Ex, em São Paulo, na década de 70, ele já um jornalista consagrado e eu recém-chegado em São Paulo com 16 anos e trabalhando na imprensa alternativa que fazia oposição à ditadura militar. Como criador da revista Realidade, uma as mais importantes publicações da nossa história jornalística, ele já era uma lenda nos meios jornalísticos. Pedira demissão da Editora Abril, onde tinha um bom cargo, e investiu sua indenização no jornal. Com a entrada de Patarra, o Ex teve um forte crescimento e passou a ser ainda mais visado pelos militares.

A edição com a reportagem sobre a morte do jornalista Vladmir Herzog, em outubro de 1975, colocou o jornal ainda mais no foco repressivo. O jornal, que já vinha crescendo,com a injeção do capital e do talento de Patarra saltou de 7 ou 8 mil exemplares para 30 mil e, na edição da morte de Herzog, tirou 50 mil exemplares em duas edições.

Mas o que era para se tornar a grande publicação alternativa do país acabou tendo morte prematura sob a pressão do regime militar. Vista de longe, a capa com a morte de Herzog (acima, à esquerda) pode até não parecer grande coisa. Mas para fazer aquilo era preciso muita coragem, já que o resultado podia ser tanto a prisão quanto a morte. Os aplausos para quem combate uma ditadura são sempre tardios.

Mylton Severiano da Silva, o Myltainho, um dos editores do Ex, conta que colegas do sindicato dos jornalistas de São Paulo chegaram a ir até a redação no dia do fechamento da matéria para pedir que nada fosse publicado. “Foi patético”, ele conta em uma ótima entrevista no site de Luiz Maklouf Carvalho. “Nós, implacáveis, decididos a publicar, e os colegas jurando que estavam tentando nos proteger ao pedir que não publicássemos”. Além de contar a história do Ex, Myltainho também faz um importante relato sobre nossa história política recente, com destaque para a importância de Patarra na modernização da imprensa brasileira.

Mas o jornal acabou tendo que fechar. A Polícia Federal apreendeu 50 mil exemplares de uma edição extra e, logo após, foi determinada a censura-prévia, o que impossibilitaria totalmente a feitura de um jornal como o Ex. Desse modo, a ditadura militar forçou sua falência.
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POR José Pires



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