segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Questão de currículo

Eu não seria maluco de cobrar respeito à capacidade técnica na política brasileira, muito menos dentro do PSDB, um partido com uma longa lista de exemplos que mostram que não é por este mérito que se faz carreira por lá, mas esta tentativa de recondução do ex-senador e agora deputado federal Sérgio Guerra à chefia do partido já é maluquice demais até para tucano.

Se o PSDB fosse uma empresa privada, uma sociedade anônima, Guerra nem adentraria o ano como presidente de nada. Já na eleição passada os sócios o teriam chutado, talvez até mesmo durante o próprio processo eleitoral, de tantos que foram os erros da própria direção partidária que levaram o candidato a presidente da República a perder uma eleição que já estava praticamente ganha.

Mas vamos a esta eleição. Numa relação administrativa normal para alcançar qualquer cargo conta muito o currículo do candidato, não? Numa conferida em seu currículo, Guerra não leva nada. Não, não vamos nem tocar em seu mandato de oito anos como senador, porque aí ele teria que abandonar até a política. Fiquemos, portanto, só na questão da organização do partido na base do agora deputado.

Em Pernambuco, onde Guerra é quem manda no PSDB, o partido acabou. No primeiro turno, no estado do então presidente do partido, Serra ficou em terceiro lugar, atrás de Marina Silva. No segundo turno, é claro que Dilma venceu. O tucano perdeu em todas as cidades pernambucanas.

O próprio Guerra hoje é deputado federal porque fugiu da disputa por uma cadeira no Senado, onde poderia tentar a reeleição. Ele se elegeu deputado, mas sabemos como isso funciona. Como é um cacique local, ocupa os espaços de rádio e TV do partido de forma personalista, marcando sua imagem. Vários caciques tucanos fazem isso. É um estratagema usado em todo o país e uma das razões mais fortes do esvaziamento do partido.

Não é um recurso permitido pela lei eleitoral, mas é o que fazem. O rebaixamento da política brasileira vem em grande parte dessa forma de uso da máquina partidária. Os partidos não se abrem para a sociedade, muito menos para a renovação de lideranças.

Quando vierem para cima de você dizendo que o Congresso Nacional que está aí é representativo do que somos, lembre-se dessas coisas que os caciques fazem. Desse jeito, poucos dos que vão para Brasília representam de verdade o que é nossa sociedade.

Mas voltemos ao presidente que quer voltar ao PSDB. O uso da máquina partidária, no entanto, não é o bastante quando existe uma disputa de fato. Por isso Guerra fugiu da eleição para o Senado. E por isso também seu partido não tem poder algum hoje em Pernambuco, um estado dominado nos últimos anos por Eduardo Campos, que começou a carreira como neto de Arraes e segue hoje como afilhado do Lula.

No seu currículo, Guerra tem também uma ação muito importante na eleição passada. Foi uma ligação telefônica sua que deu início ao desastre da escolha do vice do Serra, uma crise determinante para a cambulhada de outras que foram gradativamente eliminando a vantagem do tucano sobre Dilma.

Guerra passou para o presidente do PTB, Roberto Jefferson, a informação de que o vice seria o senador paranaense Alvaro Dias. O problema é que a decisão ainda não havia sido bem amarrada. E é claro que Jefferson saiu tuitando loucamente a informação de cima de sua moto. O que veio depois já é do conhecimento geral. Foi um dos episódios mais ridículos da nossa história política.

Pode ser que Guerra tenha pedido que Roberto Jefferson fizesse segredo [não vai colocar na internet, viu, seu malandrinho?], o que é o mesmo que colocar um balaio de espigas de milho na frente de um burro (ou mula, cavalo, tanto faz...) e pedir para que ele não mexa em nada.

Só por esta história com o Roberto Jefferson, o agora deputado Sérgio Guerra teria que ser despachado rápido da presidência. Nisso nem cabe um julgamento técnico. É muita falta de capacidade de percepção. Só um idiota político passaria um segredo para Roberto Jefferson. A menos que tenha sido para prejudicar a candidatura do candidato do seu partido que ele revelou a tão delicada decisão em primeira mão para o manjado falastrão que é o presidente do PTB. Mas seria demais o próprio presidente dos tucanos fazer uma coisa dessas, não é mesmo?
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POR José Pires

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