O alerta de Joaquim Barbosa
Hoje, no julgamento dos embargos infringentes dos mensaleiros no Supremo Tribunal Federal, teve uma fala do ministro Joaquim Barbosa que é para mim um dos depoimentos mais importantes da nossa história recente. É um desabafo e um grave alerta feito logo após a absurda absolvição dos mensaleiros do crime de quadrilha. Já escrevi na segunda-feira que anular a condenação deste crime feria a própria lógica do processo. Pois foi o que fizeram. O alerta de Joaquim Barbosa é extremamente sério. O tempo é que vai demonstrar se ele terá um peso em nossa história como um vaticínio do desastre político que pode vir por aí ou da sensibilização dos brasileiros para a recomposição de forças na defesa da nossa democracia.
Por enquanto me parece que existe mais possibilidade de se configurar a primeira hipótese. Os brasileiros estão desatentos ao processo de tomada de poder que acontece no país e essa desatenção existe inclusive entre a maioria dos jornalistas, que até por dever profissional deveriam estar na linha de frente da defesa da democracia. Bem, quem viver verá. E Barbosa já avisou: isso que eles fizeram hoje "é só o primeiro passo".
Aqui está o link do vídeo e abaixo publico a transcrição que fiz desta fala que já nasce memorável no dia de hoje.
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Por José Pires
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"Uma maioria de circunstância, formada sob medida para lançar por terra todo um trabalho primoroso levado a cargo por esta Corte no segundo semestre de 2012. É isso que nós acabamos de assistir. Inventou-se inicialmente um recurso regimental totalmente à margem da lei com o objetivo específico de anular, de reduzir a nada um trabalho que fora feito.
Sinto-me autorizado a alertar a nação brasileira de que este é apenas o primeiro passo. Porque esta maioria de circunstância tem todo tempo a seu favor para continuar nessa sua sanha reformadora. Agora inventou-se um conceito fantasioso e discriminatório para o crime de quadrilha. Segundo este novo conceito são suscetíveis de enquadramento na prática do crime de quadrilha somente aqueles segmentos sociais dotados de certas características socioantropológicas, aqueles que rotineiramente incorrem na prática de certos delitos como os crimes de sangue ou os crimes contra o patrimônio privado. Criou-se com isso um novo determinismo social.
Eu ouvi com bastante atenção argumentos tão espantosos quanto aqueles que se basearam simplesmente em cálculos aritméticos e em estatísticas totalment
e divorciadas da prova dos autos. Totalmente divorciadas da gravidade dos crimes praticados e documentados nos autos desta ação penal. Enfim, totalmente divorciados do contexto probatório individualizado que restou demonstrado no acórdão proferido por esta Corte em 2012. Eu ouvi até mesmo a seguinte alegação: "eu não acredito que estes réus tenham se reunido para a prática de crimes".
Há dúvidas de que eles se reuniram, de que eles se associaram e que esta associação perdurou por quase três anos? Ninguém ousou dizer que esta associação não existiu. E o que dizer dos crimes que eles praticaram e que hoje em relação aos quais cumprem pena em presídio da capital federal. Como sustentar que isso não configura quadrilha? Crimes contra a administração pública, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, crimes contra o sistema financeiro nacional, tudo provado, tudo provado, decisão condenatória transitada em julgado. Esta é uma tarde triste para este Supremo Tribunal Federal porque com argumentos pífios foi reformada, foi, como eu disse, jogada por terra, extirpada do mundo jurídico uma decisão plenária sólida, extremamente bem fundamentada, que foi aquela tomada por este plenário no segundo semestre de 2012."
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