quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

A desgraça no Charlie Hebdo

O cartunista francês Charb, que desenhou esta charge da capa do semanário "Charlie Hebdo" foi morto no atentado desta terça-feira à sede do jornal, em Paris. Doze pessoas morreram no ataque a tiros feito por um grupo terrorista islâmico. O jornal já vinha sendo ameaçado desde 2011, quando publicou uma charge do profeta Maomé, e foi alvo também de uma bomba incendiária, quando publicou outra charge de Maomé, em 2012.

Charb era um cartunista da nova geração do humor francês, que historicamente sempre foi feito com uma carga satírica muito forte. Os franceses sempre foram muito viscerais no cartum, sempre muito engraçados e sem barreiras de qualquer tipo. Atacam a todos, sem nenhuma distinção política ou de outra espécie. Não existem tabus. Praticam o humorismo mais autêntico, que deve ter mesmo este sentido de crítica absoluta a qualquer comportamento humano, sem ter o rabo preso em qualquer norma ou filosofia. Já fizeram charges pesadas com vários papas, inclusive os mais recentes, como João Paulo II e Bento XVI. Mas a Igreja Católica aceita de forma tolerante o convívio com as divergências. Com os católicos o debate tem sido democrático.

Porém, não é este o caso da religião islâmica, que tem preceitos que proíbem qualquer imagem de seu profeta. Quando acontecem atos bárbaros como este atentado criminoso à liberdade de expressão de hoje, em Paris, sempre aparecem aqueles que afirmam que o crime é culpa exclusiva de uma minoria. Pode ser, mas é duro agüentar o profundo silêncio da maioria dos islâmicos sobre esse tipo de atentado e também das ameaças que os precedem. É claro que não podemos crer que temos hoje uma religião em sua totalidade numa guerra contra o Ocidente, querendo impor costumes bárbaros nos países dos outros. Mas o fato é que não se vê entre os islâmicos uma movimentação rigorosa para acabar com estes crimes e nem de condená-los publicamente.

Além do jovem cartunista Charb, morreu no atentado ao "Charlie Hebdo" uma lenda do humorismo internacional, o cartunista Wolinski. Ele já tinha 80 anos e era um dos últimos remanescentes dos criadores do "Charlie Hebdo". Wolinski tinha um desenho marcante pela liberdade do traço. Seu desenho era da maior simplicidade, um estágio que quem conhece sabe muito bem que é muito difícil de alcançar. Sua influência no humor e nos quadrinhos foi muito grande em todo mundo, inclusive no Brasil, onde pelo menos três gerações de desenhistas aprenderam muita coisa com ele. O semanário de humor “O Pasquim” teve grande influência editorial do "Charlie Hebdo". E dos cartunistas brasileiros, raro é o que não pegou alguma coisa de Wolinski, nem que seja apenas da sua forma de fazer humor.

Outros humoristas que morreram no atentado foram Tignous, um ótimo cartunista da nova geração, e Cabu, que era mais próximo da geração de Wolisnki e foi um dos mais habilidosos desenhistas que já existiu. Não se deve estimular a vocação para o martírio como costumam fazer em religiões atrasadas, mas esses humoristas presentes nesta trágica terça-feira na redação do "Charlie Hebdo" nesses tempos perigosos dão a todos nós o exemplo do empenho pela liberdade de expressão. Cabe a quem tem dignidade não deixar que os patrulheiros da intolerância avancem.
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POR José Pires

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