Neste período de festas a hastagh “BolsonaroTraidor” foi às alturas e a verdade doeu para o próprio presidente Jair Bolsonaro, que foi para as redes sociais queixar-se do descrédito geral quando completa um ano de governo. Bolsonaro sancionou mudanças no Código de Processo Penal, o chamado “projeto anticrime” votado na Câmara, repleto dos chamados “jabutis”, as emendas traiçoeiras que parlamentares costumam encaixar em projetos que tramitam por lá. Foi seu presente de Natal para os que ainda acreditavam que ele é contra a corrupção. A lei chegou às mãos de Bolsonaro com emendas que favorecem corruptos e outros bandidos. E o presidente sancionou as piores, mantendo até o juiz de garantias, causando uma revolta entre o que sobrou de seus seguidores.
Não faltaram avisos sobre a necessidade de vetos, com um alerta direto do ministro Sérgio Moro. A emenda do deputado Marcelo Freixo é um despropósito que deve criar problemas sérios até na sua aplicação. A proposta é tão furada que o próprio Bolsonaro, com aquele seu jeitão de deputado do baixo clero, já colocou em dúvida em um vídeo nas redes sociais se ela poderá de fato entrar em vigor. Da parte do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, seu encaixe no projeto anticrime parece ir um pouco além dos costumeiros agrados na parcela poderosa de políticos interessados em desmontar o rigor que a Lava Jato implantou contra os corruptos no Brasil. Ele quis comprometer negativamente Bolsonaro. E conseguiu.
Este é apenas um problema do safado pacote. Entre outros “jabutis”, as mudanças aprovadas pelo Congresso vão dificultar até decretação de prisões preventivas. Como eu disse, Bolsonaro foi avisado pelo ministro Moro, mas assinou a lei sem os vetos necessários. O juiz de garantias serve como peça simbólica do desastre, como uma complicação séria para a popularidade de Bolsonaro, pelo impacto negativo em uma bandeira essencial na sua imagem política.
Mesmo que não seja armação de Maia, o que está muito claro é que ele deixou tudo ir à frente como forma de pressão sobre o presidente da República. E Bolsonaro deu aval a uma bomba. O juiz de garantias dificulta o enfrentamento de crimes, indo ao encontro do interesse corruptivo de parcela influente parcela de políticos. A medida tem também dificuldades práticas e orçamentárias, inclusive para governos estaduais, além de ter vício de iniciativa: teria de ser proposta pelo Judiciário. Não teria como Rodrigo Maia não saber das incongruências, pois o projeto esteve na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, onde foi definido como inconstitucional.
A presidente da CCJ, senadora Simone Tebet, disse que o veto a este item no pacote havia sido acertado com o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), mas, ora, atualmente Bezerra está mais preocupado em evitar ir para a cadeia por corrupção do que desenvolver leis eficientes contra o crime. Em setembro, a Polícia Federal fez buscas no Congresso, com mandado de busca e apreensão no gabinete do senador e também no do seu filho, o deputado Fernando Bezerra Filho (DEM-PE). Mesmo com tudo isso, Bezerra foi mantido por Bolsonaro na líderança de seu governo. Para ter dúvida sobre a posição de Bolsonaro no enfrentamento da corrupção, só se o sujeito for muito mal informado, diria um idiota político consumado, ou tiver comprometimento com malfeitos graves.
O juiz de garantias é apenas um símbolo da derrocada de Bolsonaro em conceitos fundamentais para seu prestígio político, que vem sendo corroído rapidamente desde sua posse como presidente e agora ficou totalmente abalado até entre eleitores remanescentes na crença do mito. Não são isolados os gritos de traidor, com o presidente de perfil direitista sendo acusado nos meios que foram a sustentação da onda eleitoral que o levou até o Palácio do Planalto.
Um ponto que deixa muito bem marcado o nível dessas complicações políticas são os elogios efusivos a Bolsonaro vindos do deputado Marcelo Freixo, que tem sido um parlamentar de intensa atuação a favor da impunidade, trabalhando ativamente para amenizar o rigor da lei não só contra o crime do colarinho branco, como também para o narcotráfico, estupradores, assaltantes e ladrões.
Neste pacote, Freixo está dando todo apoio a Bolsonaro, até porque é do deputado esquerdista um importante jabuti da impunidade. Pode-se dizer que são elogios em que os extremos se encontram no estimulo à corrupção, Bolsonaro fazendo gesto de arminha na extrema-direita e Freixo com o cinismo da extrema-esquerda, atuando pela impunidade e vestido com camiseta exigindo punição aos matadores da sua companheira de partido.
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POR José Pires