Vanucchi é um dos cinco ministros de Lula mencionados pela revista Câmbio, da Colômbia, como relacionados com membros das FARC. Os outros são: José Dirceu, ex-ministro chefe da Casa Civil, afastado devido a desgaste do escândalo do mensalão e depois cassado por falta de decoro; Roberto Amaral, ex-ministro da Ciência e Tecnologia; Erika Kokay, deputada do Partido dos Trabalhadores; Gilberto Carvalho, chefe de Gabinete da Presidência da República; Celso Amorim, ministro das Relações Exteriores; Marco Aurélio Garcia, assessor de Assuntos Internacionais; Perly Cipriano, subsecretário de Direitos Humanos; Selvino Heck, assessor especial da Presidência.
A reportagem da Câmbio foi publicada em julho de 2008 e baseia-se nos e-mails armazenados no computador de Raul Reyes, chefe do grupo guerrilheiro colombiano ligado ao narcotráfico que foi surpreendido e morto por forças militares colombianas em território do Equador. Algumas informações contidas no computador apreendido pelo governo colombiano com Reyes foram reveladas pelo então presidente Alvaro Uribe em conversa privada com o presidente Lula, que esteve em visita àquele país em julho de 2008. Até hoje não se sabe o que os dois conversaram, mas me lembro que nesta viagem Lula não fez suas costumeiras piadas.
As mensagens trocadas entre os chefes guerrilheiros que comprovariam a relação com autoridades brasileiras, que a revista afirma serem muito fortes, são de 2007. Estas datas são importantes para analisar o contexto em que se deu as relações com as FARC. Até aquele momento ainda era desconhecida a dimensão do fracasso militar da guerrilha colombiana. Chefes importantes ainda estavam em atuação, como Reyes e Pedro Antonio Marín, o Tirofijo, figura lendária que morreu logo depois de Reyes, pelo que se sabe, de causas naturais.
O fato é que até então as FARC pareciam ter um bom potencial futuro numa partilha de poder na Colômbia. Se o governo Lula buscava proximidade apostando nisso, ainda é algo para ser aprofundado, mas é uma hipótese bem provável.
Em vários e-mails, os homens da FARC discutem estratégias para fortalecer sua penetração política no Brasil, para a qual seria importante evitar a extradição do representante das FARC no Brasil, Olivério Medina, o que acabou mesmo não ocorrendo. Nesses e-mails eles elogiam a colaboração de vários brasileiros, como parlamentares e ministros, para a obtenção desse status de refugiado.
Dois desses e-mails servem para compreender a influência dos grupos simpáticos às FARC dentro do governo brasileiro, pois parecem tratar de uma tática de infiltração de uma pessoa (a mulher de Olivério Medina) no governo Lula, em Brasília, para facilitar inclusive o pedido de refúgio, o que acabou de fato acontecendo. O governo Lula concedeu a Medina tal status e até hoje ele permanece no Brasil.
Numa mensagem enviada a Reyes em janeiro de 2007, Medina fala do plano de levar “La Mona” para Brasília. A mensagem é identificada como “Cura Camilo”, um de seus codinomes. Mona é como ele se refere à sua mulher, Ângela Maria Slongo. Ela acabou sendo cedida pelo governo do Paraná ao Ministério da Pesca, com pedido assinado pela própria Dilma Rousseff, que era então ministra a Casa Civil de Lula. Ângela, ou Mona, está até hoje no cargo em Brasília.
Já em outro e-mail, de abril do mesmo ano, ele festeja o sucesso do andamento do plano para encaixar “Mona” no governo Lula e fala de sua cautela para “não facilitar ao inimigo argumentos que levem a questionar o refúgio” pretendido por eles.
Veja os dois e-mails:
EL EMPLEO
17 de enero de 2007
De: 'Cura Camilo'
A: 'Raúl Reyes'
"El lunes 15 inició 'la Mona' su empleo nuevo y para asegurarla o cerrarle el paso a la derecha por si en algún momento les da por molestar, entonces la dejaron en la Secretaría de Pesca desempeñándose en lo que aquí llaman un cargo de confianza ligado a la Presidencia de la República".
ACTUAR CON CAUTELA
14 de abril de 2007
De: 'Cura Camilo'
A: 'Raúl Reyes'
"Debo actuar con cautela para no facilitar al enemigo argumentos que lleven a cuestionar el refugio. En ese sentido, el haber conseguido el traslado de 'la Mona' y 'la Timbica' para la capital del país, ha sido importante. Ese bajo perfil lo mantendré hasta la neutralización. Obtenida esta, tendré pasaporte brasileño y lo primero que debo pensar es en irlos a ver".
Noutra mensagem revelada pela revista Câmbio, Reys comenta com outro líder das FARC sobre o apoio de “amigos solidários” das FARC, composto inclusive de ministros de Estado. Leia na íntegra:
"Bastante significativa la solidaridad de los partidos comunistas de Brasil y de otros países con la lucha de las Farc en el empeño de impedir la extradición del 'cura' (Francisco Medina, 'Cura Medina'). Existe en Brasil un importante grupo de amigos solidarios con nosotros en los que hay sindicalistas, maestros, congresistas, ministros, abogados y personalidades ocupados de presionar la libertad inmediata de Camilo".
O "Camilo" a ser libertado era Medina, preso à espera da resposta brasileira ao pedido de extradição feito pela Colômbia. A pressão dos "amigos solidários" parece ter funcionado, pois Medina foi solto. Em outro e-mail, de fevereiro de 2007, o ministro Paulo Vanucchi tem seu nome citado, em um importante encontro organizado por “Mona”, a mulher de Medina.
"La defensora pública le está organizando a 'la Mona' un encuentro con el Ministro, el Viceministro y el principal asesor de la Secretaría de Derechos Humanos vinculada a la Presidencia, en su orden Paulo Vannuchi, Perly Cipriano y Dalma de Abreu Dalasi [parece ser Dalmo de Abreu Dallari] , que es un prestigioso jurista al que el ministro relator le tiene pavor. El viceministro Perly hablará con el presidente de la Comisión de Derechos Humanos de la Cámara Federal. Serán visitadas entidades importantes que nos apoyaron, comenzando por la Comisión Brasileña de Justicia y Paz".
A revista Câmbio mostra com farta documentação a relação de autoridades do governo Lula com as FARC. A reportagem cita também o PT como responsável pela presença das FARC no Brasil, conforme se pode ler neste trecho: “A juzgar por el contenido de los mensajes, la presencia de las Farc en Brasil llegó hasta las más altas esferas del gobierno de Lula, el Partido de los Trabajadores, PT -el partido del Presidente”.
Caberia ao PT e também ao governo Lula esclarecer um assunto de tamanha importância para o país, mas o comportamento do partido é o de fazer-se de vítima, como aconteceu ontem quando entraram com ações na Justiça por declarações sobre o tema, feitas por Índio da Costa, vice de José Serra.
Que antes de participar junto com as FARC do Foro de São Paulo os petistas não tenham pesado as consequências da transformação que já vinha ocorrendo há tempos deste grupo armado, de força insurgente de esquerda para aliados do narcotráfico, é um erro de avaliação grave, mas nada que não possa ser sanado. Uma ruptura pública, por exemplo, seria um bom começo.
Já quanto ao governo Lula, é bem provável que as FARC estejam inseridas na estratégia de juntar forças de esquerda governistas e de oposição em um bloco de atuação no continente latino americano, plano que incluiria o governo venezuelano de Chávez e o regime castrista de Cuba. Aqui houve o erro de avaliação de que falei. Ao invés de se fortalecer, as FARC sofreram uma derrota militar imposta pelo governo Uribe.
No caso desse modelo de “diplomacia”, por mais que a realidade venha impondo derrotas fragorosas a esta idéia de impor ao Brasil uma inserção ideológica de esquerda no plano internacional, não parece que o governo Lula queira voltar atrás. Pelo contrário, a visão da candidata de Lula indica que no mandato presidencial que pode ser conquistado por ela, a tendência é que este projeto seja radicalizado.
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POR José Pires