sexta-feira, 9 de outubro de 2020

Jair Bolsonaro, Dias Toffoli e seus currículos

Servem como retrato da degradação da qualidade profissional do país os problemas de currículo do desembargador Kássio Marques, indicado para o STF por Jair Bolsonaro. Ora, em qualquer empresa séria ele já estaria fora, porque nem é necessário uma discussão técnica do que ele apresenta como provas da suas capacitação. Quem aceitasse dar emprego a alguém com o evidente comportamento imoral do desembargador estaria colocando em risco a qualidade de sua empresa em todos os níveis.

A menos, é claro, que esse hipotético empresário estivesse na situação dos que desejam Marques como juiz do STF, que depois de encontrar um sujeito à altura do nível que estão precisando no momento, nem procuram salvar as aparências. Juntam-se em festinhas particulares regadas a uísque, cerveja, churrasco e pizza, em confraternização de advogados e juízes, acusados e acusadores, todos festejando o escolhido de Bolsonaro que, diga-se, ainda não passou pela sabatina no Senado.

Neste tema do currículo, quem é que se salva? Não só nesses cargos por indicação como no geral das contratações do serviço público, o que ocorreria se houvesse em todo o Brasil uma rigorosa auditoria de verificação de capacidades? E nem vou falar de produtividade, no que o desembargador também é precário, do mesmo modo que acontece com tantos outros funcionários públicos. É óbvio que existe uma defesa mútua entre os incapazes, que bem de cima, das chefias.

É de se apreciar a alegria do encontro de lazer e negócios de Bolsonaro e Toffoli. No flagrante filmado por um cinegrafista do encontro entre Jair Bolsonaro e Dias Toffolli fica muito claro o entusiasmo de ambos ao se encontrarem. É o baixo clero se reconhecendo. O presidente gosta de usar a palavra “casamento” para falar de suas parcerias. Pois parece que temos, enfim, um casal perfeito.

Toffoli, que ainda há pouco era presidente do STF, serve para demonstrar em que nível baixíssimo de qualidade caiu o nosso país na capacitação técnica das nossas lideranças. E se esta questão não for colocada como referencial das dificuldades do nosso país para se levantar, então a avaliação não pode alcançar um resultado satisfatório, nem haverá solução efetiva.

No currículo de Toffoli constam compromissos fortes com o projeto de governo do PT, que serviram inclusive de forma negativa como material de propaganda da eleição de Bolsonaro. Acontece que no giro do oportunismo de Bolsonaro, forçado pela necessidade de proteção pessoal e da abertura a negócios futuros, os interesses se encontraram. Hoje em dia, Bolsonaro teria a maior satisfação dele mesmo indicar Toffoli para uma vaga aberta no STF, como esta criada com a saída de Celso de Mello.

E faria isso por motivos muito parecidos aos do então presidente Lula, quando o chefão petista — que chegou a ser preso por corrupção — o apontou para juiz do Supremo. Toffoli foi advogado do PT e advogado de Lula, tendo sido também subordinado de José Dirceu, ex-ministro petista condenado no mensalão e depois no petrolão, que teve o mandato de deputado cassado por falta de decoro. Toffoli foi fiel aliado dos petistas em seu projeto de poder, enquanto se organizava primeiro o esquema do mensalão e finalmente o do petrolão, descoberto pela Operação Lava Jato quando ele já estava sentado em uma cadeira no STF.

São implicações políticas graves, mas ainda tem mais coisas interessantes em seu currículo. Toffoli não poderia ser aprovado pelo Senado porque não cumpriu profissionalmente um requisito básico: saber jurídico. Chegou a ser reprovado por duas vezes em concurso público na magistratura de São Paulo. O ministro do STF tem até uma condenação no Amapá, onde ele e sócios em um escritório foram condenados em 2006 a devolver R$ 420 mil aos cofres públicos do estado. Mas claro que ele nem precisou disso em seu histórico profissional para ser indicado por Lula ao STF.

Bolsonaro é outro que tem um currículo demonstrativo de causas básicas da atual degeneração da produtividade em nosso país e da qualificação ridícula de nossos dirigentes. Para começar, o capitão foi excluído do Exército Brasileiro de forma oficiosa. Ele teve que sair, depois de muitas complicações, pelas quais ele até foi preso por indisciplina. Ficou preso por 15 dias e a punição só não foi maior “em virtude de ser a primeira punição do oficial”. Ele já era capitão quando foi parar no xilindró. Antes de ser obrigado a pedir a reforma, teve também o plano de explodir bombas em várias unidades da Vila Militar, na Academia Militar das Agulhas Negras, relatado pela revista Veja em outubro de 2008. Esta ação, que acabou não ocorrendo, era referente à reivindicação de aumento de salários de militares.

Entre os documentos de um dos processos a que respondeu no Exército, chama a atenção um perfil psicológico de Bolsonaro. Ele é classificado como agressivo e imaturo. Quando tenente, então com 28 anos de idade, ele "deu mostras de imaturidade ao ser atraído por empreendimento de garimpo de ouro”. Bem, não havia descoberto ainda as maravilhas do nióbio. Noutro trecho, afirma-se que ele “deu demonstrações de excessiva ambição em realizar-se financeira e economicamente".

Neste episódio, Bolsonaro juntou cinco colegas de armas, dois dos quais "estavam sob seu comando", para garimpar ouro. Não encontraram nada, mas responderam a um processo interno. De regresso, segundo depoimento de Pellegrino, ele se "retratou", mas teria "confirmado sua ambição de buscar por outros meios a oportunidade de realizar sua aspiração de ser um homem rico". Ora, o que se viu é que depois de deixar o Exército, o fracassado capitão redirecionou sua vocação, finalmente chegando aos meios para realizar sua ambição pela riqueza.

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POR‌ ‌José‌ ‌Pires‌


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