O ex-governador Olívio Dutra, do Rio Grande do Sul, é um dos fundadores históricos do PT, atuando junto com o ex-presidente Lula na formação do partido e na caracterização inicial do petismo como uma via ética para a política brasileira. Há muito para discordar de Dutra em sua carreira política, mas no entanto ele tem qualidades que fazem bastante falta entre nossas lideranças, inclusive dirigentes da iniciativa privada. Uma qualidade importante dele é a de não ter sido seduzido pelas pompas do poder. Leva uma vida compatível com os ganhos de uma pessoa de classe média e vive o cotidiano de Porto Alegre, da mesma forma que as demais pessoas, a maioria de nós que não somos protegidos pela redoma dos privilégios concedidos pelo poder ou por grandes empresas.
Olívio Dutra não abandonou nem o hábito de andar de ônibus, necessidade que vem dos tempos de sua atuação sindical honesta e da qual pelo visto não tomou nenhum ganho para elevar sua renda e patrimônio pessoal. A militância petista exalta de forma cínica a simplicidade do ex-presidente uruguaio José Mujica porque a distância até geográfica não exige que sigam seu exemplo de humildade. Por que não fazem o mesmo com Dutra, que teve sempre um padrão de vida simples? É que desta forma a voz discordante do companheiro gaúcho soaria mais forte, além do que no partido poderia ser estabelecida a exigência de ganhar o pão com o suor do próprio rosto, sem o uso da chave dos cofres públicos e os benefícios ganhos em trocas políticas. Tenho minhas divergências com o ex-governador gaúcho, assim como discordo de Mujica, mas ambos têm este valor pessoal de viverem próximos aos seus concidadãos, sem se elevarem em conforto e luxo, dispensando até mesmo a solenidade hipócrita dos poderosos.
Olívio Dutra deu uma boa entrevista na última quinta-feira ao diário gaúcho Zero Hora, quando fez afirmações que deveriam estar sendo replicadas na internet pelos próprios petistas, em razão da importância das suas palavras numa mais que urgente reforma de seu próprio partido. Mas ficarão caladinhos, é claro. Aliás, estranhamente até a imprensa não tem feito questão alguma de trazer as importantes opiniões do ex-governador gaúcho. À bem da verdade, o PT não tem nada do que se queixar desta nossa imprensa. Dutra fez críticas fortes ao partido. Ele afirmou na entrevista que o PT "caiu na vala comum dos demais partidos" e que, algumas condutas individuais de seu partido "pretenderam até superar a malandragem dos outros". Epa, Dutra pode acabar sendo tachado de "antipetista", que é o que fazem comigo e outros críticos do partido do Lula. Este rótulo sobre quem é independente é um juízo de valor desonesto ou tolo, é claro, já que minha opinião crítica contra o uso abusivo do poder serve inclusive como indignação contra os patifes que subjugam o partido.
Já faz um certo tempo que o ex-governador vem dizendo coisas parecidas com as da entrevista à Zero Hora. Foi a única liderança, entre os fundadores do PT que ainda permanecem no partido, que afirmou que era justa a condenação dos mensaleiros, algo que só um petista muito tolo ou cúmplice dos patifes poderia contestar – e milhares de petistas fazem isso pelo país afora. O problema de militantes como o Olívio Dutra é que agem pouco no âmbito partidário para livrar seu partido do domínio de lideranças nefastas, que têm seu ponto forte na presidência da República. Nesta eleição, por exemplo, ele saiu candidato a senador pelo PT do Rio Grande do Sul e abraçou a candidatura de Dilma Rousseff, algo que uma pessoa honesta e sensata deveria saber que é um abraço em que a prática política decente é que sucumbirá em caso de vitória. Foi o que se deu, como se vê pelos passos atuais de Dilma. Além de perder a eleição, ele diminuiu-se politicamente entre os gaúchos, por razões que não são de sua responsabilidade direta. Petistas como o Olívio Dutra só têm o ônus neste jogo sujo do grupo que domina seu partido. Mas eles parecem ter uma dificuldade danada de compreender isso e reagir de forma rigorosa para recuperar a dignidade de seu partido.
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POR José Pires
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