segunda-feira, 16 de outubro de 2023

O cancelamento do chocolate que apostou na integridade moral de Felipe Neto

O youtuber Felipe Neto passou um péssimo final de semana e vai entrar numa semana de muita tensão. Ele arrumou uma baita encrenca para o chocolate Bis, depois da sua contratação recente como garoto-propaganda do produto. Por causa do patrocínio, seus inimigos lançaram nas redes sociais uma campanha pedindo o boicote ao chocolate, envolvendo também a Lacta, fabricante do Bis.


A imprensa vem noticiando que o boicote é proposto por “bolsonaristas”, mas esta afirmação traz o desconhecimento sobre motivações muito mais amplas do que a relação com um outro lado de uma polarização política, que na verdade nem tem essa densidade, em um tema explorado em excesso por um jornalismo que acaba elevando Jair Bolsonaro ao centro de questões sociais e políticas em que ele apenas surfa, como fazia sempre em escalas menores, quando boquejava como representante do baixo clero da política.


Existe atualmente um debate acirrado nas redes sociais sobre liberdade de expressão e posicionamento quanto a questões de comportamento e da moral. Também recebe muita atenção as propostas de controle das redes sociais. É nesses assuntos que está a treta com Felipe Neto, que também é um adepto feroz de campanhas de cancelamento nas redes. O boicote pode ter começado com bolsonaristas, mas tem motivações que colocam na briga pessoas interessadas em outras questões e que nem simpatizam com Bolsonaro.


A adesão ao boicote pode ser até a simples razão de fazer tilintar o caixa. Está aí algo que anima quem lida, digamos, profissionalmente com redes sociais. Com youtuber famoso no meio, qualquer polêmica terá como base a luta por audiência de internautas. Isso traz propaganda nas várias plataformas, aumenta a monetização no Youtube. Serve também para vender produtos próprios e fazer propaganda, como é o caso agora da parceria entre o Bis e Felipe Neto. 


O debate político também entra nessa caixa registradora. A política, que já era profissão antes da popularização da internet, virou um estimulante precioso para ganhar dinheiro. Muitos dos mais animados bolsonaristas ou petistas estão na verdade caçando likes para faturar. Nas últimas duas campanhas eleitorais e nos quatro anos terríveis do governo Bolsonaro, além desse quase um ano muito difícil com Lula, o que esse pessoal vem fazendo é brigar para ganhar monetizações. Até políticos publicam vídeos monetizados.


Claro que o boicote ao chocolatezinho da Lacta também entra nessa jogada. A hashtag #BisNuncaMais foi um dos assuntos mais comentados do Twitter neste sábado, fazendo sucesso também em outras plataformas. A campanha da direita teve realmente um alto engajamento e dizem que mexeu até com a posição da Lacta na Bolsa de Valores. É impressionante a quantidade de material produzido nas redes sociais para o boicote, que vai além de textos curtos no Twitter, no Instagram ou em outra plataformas. São vídeos, logotipagem, memes dos mais variados. 


Enfim, com a contratação de Felipe Neto o marketing da Lacta arrumou o que nenhum produto quer encontrar pela frente: uma contra-propaganda agressiva, que a partir do impulsionamento vai estimulando a participação de forma espontânea de criadores de conteúdo, caseiro ou não, que chega a casa de milhões.


A complicação do envolvimento de uma marca comercial em um processo negativo desses nem é só pela perda de dinheiro, que é claro que preocupa, mas pelo risco de colar-se à imagem da empresa e do produto uma fama muito ruim. E tem pouca coisa pior do que um produto entrar em um debate político que qualquer um sabe que é dos mais agressivos, pelo que tem na origem e no que virá pela frente, ainda mais grudado a um lado da questão. 


Tudo fica ainda mais perigoso se a confusão tem cerca de 50 milhões de eleitores de cada lado, sem falar nos milhões que detestam os dois lados que foram para o segundo turno da eleição presidencial. E que não se pense que a esquerda vai começar a comer bis por causa de Felipe Neto. O estrago pode vir do outro lado, mas nem é o fato do Bis vender menos ou mais que demonstra o erro crasso de marketing.


Se a pecha pega, será um trabalho duro desfazer-se depois da carga negativa. O próprio Felipe Neto parece não ter entendido o risco comercial de imagem. Logo que começou a confusão nas redes, a Mondelez Brasil, detentora da Lacta, correu para justificar a entrada do youtuber como propagandista da marca, afirmando em nota que as contratações de influenciadores "estão relacionadas unicamente" à relevância deles no universo gamer e de entretenimento, "sem qualquer vínculo ou apoio político de qualquer natureza".


No entanto, Felipe Neto foi em direção contrária, alimentando a polêmica nas redes sociais com textos e vídeos com conteúdo político, falando do boicote. Ele chegou a lembrar as discussões que aconteceram durante a pandemia da Covid, sobre atitudes de prevenção contra a doença. Ora, mas é desse modo, fazendo de qualquer assunto um motivo para pancadaria, que Felipe Neto ficou rico. 


Quando começou o fuzuê, houve também o que se pode chamar de dano colateral, com a entrada de petistas no confronto. Aí é que entra o pior: a solidariedade da esquerda, que atualmente anda passando pano para o grupo terrorista Hamas nas redes sociais. Como exemplo de como piorou o problema sério da Lacta, os senadores Randolfe Rodrigues e Humberto Costa postaram vídeos nas redes sociais exibindo-se com o chocolate. Na foto patética, eles posam como se fossem esteio moral para alguma coisa. Para não perder o trocadilho, deram bis ao prejuízo da Lacta. 


Não é surpresa a falta de seriedade dessas duas figuras, mas as complicações da Lacta não é só pelo que ambos representam. Entra também a rejeição pessoal de cada um. Ressalte-se nessa encenação ridícula a demonstração da incapacidade das duas lideranças do governo Lula de compreender as dificuldades que essa politização inadequada pode criar para uma empresa, independente neste caso de qualquer juízo de valor sobre a honestidade política deles.


Com o garoto-propaganda, a Lacta comprou uma montanha de complicações. Coisas assim é que fazem pensar como é composto o setor de propaganda dessas indústrias. Será que a aparelhagem política, que em várias áreas universitária fazem os jovens saírem com um diploma tecnicamente precário e a lavagem cerebral esquerdista completa, contaminou também os cursos de propaganda?


Quem conhece as redes sociais sabe o que Felipe Neto representa como chamariz de treta. Expliquei acima que é disso que youtubers como ele usam como impulso para ganhar dinheiro. E não importa o lado ideológico. Direita e esquerda adotam do mesmo modo as provocações, às vezes até mudando de lado. Felipe Neto começou a carreira batendo no PT, inclusive xingando Lula diretamente. Agora trocou de lado, mas não do caráter dessa mudança. O negócio é “money”, entendem? 


Felipe Neto é um antigo arranjador de tretas na internet, desde que essa plataforma começou a se popularizar no Brasil. Conquistou fama, explorando um artifício comum até hoje: tratando de temas com o único sentido de causar confusão e debates inúteis, armando as maiores polêmicas e arrumando brigas com outros youtubers ou personalidades da política, da cultura ou de qualquer coisa que traga audiências, com os chamados likes e evidentemente a monetização do Youtube, que lhe deu uma dinheirama. Ficou milionário com suas tretas.


Na última eleição, ele foi um agressivo cabo-eleitoral de Lula, batendo firme em qualquer crítico do petista. Ele posa de “antibolsonarista”, mas isso é uma fraude. Foi tremendamente agressivo também com quem queria debater com mais profundidade a escolha do presidente, tratando mal a chamada “terceira via”, que foi demolida ainda no primeiro turno, em um esquema que juntou adeptos de Lula, figurões do judiciário e da política, liderados por uma aliança que tinha basicamente o interesse de afrouxar o rigor contra a corrupção no país.


Individualmente este espalhamento de sujeira pode ser lucrativo. Dá fama e dinheiro para quem vive de produzir porcaria em comunicação, sem nenhuma responsabilidade com as pessoas. Mas a consequência pode ser o contrário do ponto de vista dos benefícios de uma empresa, no fortalecimento do prestígio de um produto, na sua venda direta e na sustentação de longo prazo.


Sem dúvida, essa preocupação com a sustentação da qualidade sobre o que diz ou o que vende não faz parte da visão de mundo de alguém como Felipe Neto, que passou a vida lucrando com a disseminação de confusão e sujeiras, chegando a criar uma estrutura para manter vigorosamente ativa essa fábrica de dinheiro, a partir da desgraça na comunicação entre as pessoas. Alguém acredita que disso poderia sair um garoto-propaganda benéfico para uma marca comercial? Parece que o departamento de propaganda da Lacta acreditava que sim.

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Por José Pires

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