terça-feira, 23 de maio de 2023

Marina Silva e Lula: uma história de complicações que pode se repetir

A volta de Lula ao Brasil traz para suas relações com a ministra Marina Silva um tom de “Tchau, querida!”, por causa da queda de braço entre o Ministério do Meio Ambiente e a Petrobras, que teve barrado pelo Ibama seu plano de explorar petróleo no Oceano Atlântico, na região conhecida como Foz do Amazonas. 


A prospecção de petróleo é prevista para englobar as costas marinhas de seis estados: Amapá, Pará, Maranhão, Piauí, Ceará e Rio Grande do Norte. O projeto da Petrobras mostra em um mapa explicativo a Costa Equatorial brasileira tomada por pontos vermelhos, indicando poços exploratórios, estendendo-se do Amapá ao Rio Grande do Norte. 


Dá para imaginar  a volúpia eleitoral de Lula com este grande mapa com todos esses poços indicando riquezas imensuráveis aos políticos da região amazônica e do nordeste brasileiro, com a promessa da redenção econômica do povo desses lugares. Como não podia faltar nessa propaganda, o projeto da Petrobras já vem sendo chamado de “novo pré-sal”, pelo potencial de extração de petróleo que evidentemente já vem sendo colocado como coisa certa.


Alguém duvida que Lula está ansioso para anunciar que entraremos novamente na Opep? Foi o que ele fez na marotagem política do pré-sal. Foi uma pena que nessa primeira vez não houve a confirmação da expectativa da estupenda riqueza do pré-sal — jorraria grana para a educação e a saúde, lembram?. Pois é: não deu para entrar no clube dos maiores produtores do precioso líquido.

 

Agora, o desacordo com o Ibama evidentemente é pelo risco que essa corrida pelo ouro pode trazer para as costas brasileiras e a Amazônia. Podem ser irreversíveis os danos ambientais para a região. Um exemplo de dano previsto por ali: foi descoberto recentemente no Rio Amazonas um gigantesco recife de corais, com esponjas que podem passar de dois metros de comprimento. Com 9,5 mil quilômetros quadrados, o sistema todo é maior do que a Região Metropolitana de São Paulo. Vai do norte do Maranhão até a fronteira com a Guiana Francesa.


Essas informações aparecem agora com razoável destaque por causa do polêmico embate entre o Ibama e o “espírito empreendedor” de políticos que estão sempre vendendo facilidades que jamais entregam. Mas não são questões recentes, de modo que o presidente Lula — caso este viajante infatigável assentasse o traseiro para trabalhar no que realmente interessa — já deveria conhecer muito bem. É coisa para ser resolvida numa reunião de poucas horas com técnicos do Ministério do Meio Ambiente.


No entanto, Lula se faz de sonso, o que não é novidade. Finge desconhecer o problema. Ainda no Japão, onde foi participar como convidado da reunião do G-7, ele disse o seguinte: “Estou chegando no Brasil na terça-feira e vou cuidar disso”. Alguém pode crer que o presidente brasileiro só tomou conhecimento dessa coisa depois da confusão criada porque o Ibama se posicionou de forma contrária ao interesse da Petrobras?


O petista procura enrolar, mas foi ao mesmo tempo comentando o assunto, ainda no Japão, de uma forma que deu a entender que haverá dificuldade dele se entender com a ministra Marina. "Se explorar esse petróleo tiver problema para a Amazônia, certamente não será explorado, mas eu acho difícil, porque é a 530 quilômetros de distância da Amazônia", foi o que ele disse aos jornalistas, em Hiroshima.


Isso vai de encontro ao que a ministra Marina pensa sobre as pretensões da Petrobras. Está claro que Lula não fecha com a posição de Marina e do Ibama. Bem, ele pode tentar convencer sua ministra a mudar de opinião, uma tarefa bastante complicada. Ela teria de desistir do que construiu até agora e refazer todos os seus compromissos.


Este é um problema que traz à memória o conflito que levou à sua demissão na outra vez que ela foi ministra, também de Lula e também do Meio Ambiente. A discórdia era sobre a construção da hidrelétrica de Belo Monte. Também havia o Ibama apontando riscos. Em 2008, Marina se demitiu e saiu do PT. E o tempo mostrou que ela estava certa. Naquela ocasião, Lula desmereceu as preocupações com o meio ambiente e impediu o Brasil de se preparar para o que o mundo enfrenta agora, como o temor inclusive de um colapso. Belo Monte ficou como um problema ambiental e humano na região. E tampouco gera a energia prometida.


Na volta do Japão, qualquer resposta de Lula a esta questão ambiental levantada pelo projeto da Petrobras vai colocá-lo frente a pressões difíceis de administrar. O lobby político a favor da extração de petróleo na Foz do Amazonas junta forças políticas fundamentais para seu governo, com políticos dos mais variados cargos, empresários e as populações de cada estado, com muita gente que provavelmente estará convencida de que o ganho é garantido.


Claro que o próprio Lula tende a aceitar mais a lucratividade — em votos e até a financeira — que venha no curto prazo, do que a expectativa da qualidade, em um futuro que do ponto de vista pessoal podemos nem usufruir. O chefão petista não tem personalidade de quem planta para gerações futuras colherem os frutos. Creio que já ficou comprovado que ele prefere para já os hotéis caros e vinhos idem.


Mas neste caso ele terá de enfrentar pressões que afetam uma imagem muito importante para seu governo, com consequências políticas em todo o mundo. E são danos de curto prazo.  Lula pode ceder à exploração da Petrobras, mas para isso terá de abdicar do prestígio político da defesa do meio ambiente, que na atualidade é o ponto fundamental de sustentação do Brasil no plano mundial.

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Por José Pires

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