quinta-feira, 7 de março de 2013

O dia em que José Dirceu voltou no pinote de Caracas


José Dirceu não vai poder ir ao velório de Hugo Chávez. O presidente do STF, Joaquim Barbosa, recusou a licença que ele pediu ontem para fazer a viagem. O passaporte do ex-ministro de Lula está confiscado em razão da sua condenação à prisão no processo do mensalão.

A decisão de Barbosa não vai permitir que se esclareça uma dúvida que me ocorreu quando soube do pedido feito por Dirceu. Como seria a recepção a ele no velório de Chávez? O relacionamento entre os dois nunca foi próximo, mesmo quando ainda não havia sido revelado seu papel como chefe da quadrilha do mensalão. E Chávez certamente nunca levou à sério políticos de esquerda como Dirceu.

No único contato oficial entre os dois, Dirceu levou um carreirão de Chávez em Caracas e voltou bem rápido para o Brasil. Ninguém se lembrou desse episódio. A coisa não está nem no cocuruto do Google, como já verifiquei. Mas modestamente a nossa memória só perde pra elefante bom da cuca.

Foi uma viagem ligeira do José Dirceu para Caracas em 2005, quando o clima estava fervendo nas relações entre a Venezuela e os Estados Unidos. De um lado Chávez, que governava desde 1999, e do outro George W. Bush, que não precisa ser apresentado. Eram dois coisas ruins. E é preciso lembrar também que em abril de 2002 o presidente venezuelano quase foi tirado do poder por um golpe, que ele sempre atribuiu ao governo americano.

Chávez estava à toda na Venezuela. E por aqui, no Brasil, Lula e seu grupo governavam embaladíssimos no projeto de poder perpétuo para o PT. A denúncia do mensalão só viria três meses depois na famosa entrevista do então deputado e presidente do PTB, Roberto Jefferson, ao jornal Folha de S. Paulo.

É claro que Lula e Dirceu embalavam também o sonho de ocupar a liderança da esquerda latino-americana. No plano local o domínio do Congresso Nacional já estava encaminhado por meio dos subornos do mensalão. Faltava só abarcar o continente no projeto partidário que, para os dois, era para muitas décadas de poder.

Mas nisso Chávez era uma barreira, pois além do peso da sua personalidade ele tinha também divergências com a visão ideológica dos líderes brasileiros, colocando isso em prática no governo da Venezuela. Seu projeto sempre foi pelo confronto direto com os Estados Unidos, bem diferente do que pensavam Lula e Dirceu, partidários de uma conciliação parecida com a que faziam no plano local e que até então estava dando certo.

Naquele mês de abril de 2005 a então secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice, fez uma visita oficial importante ao Brasil. É possível até que fosse um dos lances de algum arranjo entre Lula e Bush, que já havia sido acertado nos bastidores. Porém, Chávez estava numa briga feia com os ianques. Foi aí que José Dirceu, que ocupava a chefia da Casa Civil, fez as malas e foi para a Venezuela conversar com o presidente venezuelano. A idéia era propor uma amenizada nas ações e discursos de Chávez.

Até hoje não se sabe como foi a conversa e seria muito interessante para a história política de Nuestra América que este colóquio entre os dois tenha tido alguma testemunha ou que esteja documentado. Seria bom demais saber o que é que Dirceu ouviu naquele dia, pois ficou muito evidente que ele mais ouviu do que falou. O que sabemos até agora da conversa é apenas sua conclusão. Dirceu voltou na mesma hora para o Brasil, bem rápido mesmo, sem falar nada sobre este dia em que ele e o Lula tentaram suavizar o Hugo Chávez.

E o Chávez continuou o mesmo, sempre à toda, até ser parado pelo câncer. Como se sabe, a liderança da esquerda no continente ficou entre seus braços e neste papel ele até influiu para vexames ao governo Lula, como foi o caso da encampação da Petrobrás pelo governo de seu pupilo boliviano, Evo Morales.
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POR José Pires

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