sábado, 25 de fevereiro de 2017


O goleiro Bruno e as premissas das punições sem rigor

O goleiro Bruno Fernandes de Sousa teve habeas corpus concedido nesta sexta-feira pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Quem mandou soltar o ex-goleiro do Flamengo foi o ministro Marco Aurélio de Mello, com uma decisão bastante compreensiva para com ele: “Colocou-se em segundo plano o fato de o paciente ser primário e possuir bons antecedentes. Tem-se a insubsistência das premissas lançadas. A esta altura, sem culpa formada, o paciente está preso há seis anos e sete meses. Nada, absolutamente nada, justifica tal fato”. O goleiro estava preso preventivamente, enquanto aguardava o julgamento de sua apelação ao TJMG.

Da forma que se aplica a lei no Brasil até que demorou para o STF soltá-lo e isso só não aconteceu antes em razão da comoção causada pelo crime. Como todo mundo sabe, ele estava preso pelo assassinato em 2010 da namorada, Eliza Samudio. O caso é horroroso, tão terrível que vale aquela pergunta que ficou até comum no Brasil, sobre a situação difícil de quem mora no mesmo bairro para onde Bruno vai voltar em liberdade. O crime tem elementos que mostram um grupo que parece ser de criminosos patológicos.

Alguns meses antes de ser morta, Eliza foi espancada e forçada com uma arma na cabeça a tomar um abortivo, que não funcionou. Bruno fez isso com a ajuda de um comparsa, Luiz Henrique Romão, o Macarrão. Eliza estava grávida do goleiro. Depois, ela foi atraída até a chácara do então ídolo do Flamengo e lá permaneceu em cárcere privado por vários dias. Estava com o filho, que nunca teve a paternidade reconhecida por Bruno. Até ser morta, Eliza sofria esse horror, com várias pessoas passando pela chácara, uma delas inclusive para levar o filho dela. Bruno foi condenado a 22 anos de prisão em 2013 pelo crime.

Sua condenação foi por homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, asfixia e uso de recurso que dificultou a defesa da vítima) e também por sequestro e cárcere privado, esses dois crimes previstos para o cumprimento em regime aberto. Ele foi condenado também por ocultação de cadáver. O corpo de Eliza jamais foi encontrado. Os crimes tiveram a confissão do goleiro. Bem, o que mais se teme de quem comete esses horrores é a possibilidade de que a pessoa tenha um grave desajuste psicológico, com as possíveis consequências violentas. Já aconteceu em outros casos e não foram poucas vezes, mas nossa Justiça não sofre nenhuma reforma que traga o rigor exigido por esses tempos trágicos. Por isso também que em muitos países existe prisão perpétua, além de haver o cumprimento integral da pena. Não é o que ocorre no Brasil. Por isso, aqui é preciso torcer para ter a sorte de não topar pela frente nenhum inocente que foi solto por “insubsistência das premissas lançadas”.
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POR José Pires

Doria, o prefeito que não sai de cena


O prefeito João Doria é profissional antigo de comunicação, expert no estilo que entremeia propaganda com jornalismo, que não é do meu gosto, mas que, enfim, tem uma penetração cujo resultado está aí, com sua eleição. Doria sabe fazer isso muito bem, com a vantagem de ser ele mesmo que vai para a frente das câmaras. E faz isso com grande competência. Sendo assim, o prefeito paulistano deve estar sabendo o que faz. Mas sua estratégia política e de comunicação vem explorando uma excessiva exposição dele próprio, de um jeito que amplia as expectativas da população. Logo vai chegar o momento que, por mais que Doria realize coisas boas, ainda vai haver muito paulista que pode achar que é pouco. Expondo-se demais, por melhor que seja o pudim o sabor ficará aquém da expectativa. E o forno das nossas prefeituras, qualquer uma delas, não é grande coisa.

Na minha visão, o prefeito já começa a patinar em sua própria visibilidade. Nesta semana ele divulgou um vídeo que já não dá muito certo. A gravação foi feita com o roqueiro Lobão, conhecido por uma faixa mais ampla de brasileiros por seu ativismo contra o governo do PT. Parece um desses programas de entrevistas, faltando só aquela caneca que chuparam de talk-show americano. Lobão acaba servindo de escada para Doria. O vídeo ficou com cara de peça de propaganda eleitoral. O prefeito não conseguiu alcançar o tom informal exigido num caso assim. E como ninguém é perfeito, essa dificuldade de aparentar informalidade é um grave defeito de Doria como comunicador. Outra coisa: avaliando os que gostam de Lobão, a faixa de audiência favorável alcançada por Doria já é a favor dele. O que pode sobrar é a rejeição do cantor, talvez de milhares que saíram às ruas pelo mesmo motivo dele.

A ideia do vídeo é fazer algo do mesmo tipo outras vezes, toda semana. E aí corre-se um risco. É impressionante o alcance que a administração da prefeitura da capital paulista atingiu na mídia. Hoje em dia parece que só existe Doria como prefeito recentemente eleito no país. Mas uma coisa é o efeito da adesão espontânea de personalidades, em apoio ao que ele vem anunciando. E outra é o próprio prefeito chamar para o lado dele personalidades para apoiá-lo. Aí ele terá não só o bônus garantido por fãs e admiradores dessas figuras. Doria provavelmente vai pegar a rejeição que qualquer um tem com certeza, seja o Lobão ou qualquer outro artista. E também é certo que os adversários farão questão de procurar colar à imagem do prefeito tudo o que nessas personalidades cause alguma rejeição. Sem falar em algum mal entendido que pode ocorrer com alguém durante uma gravação. Se ocorrer, o que fará Dória? Se cortar, o efeito negativo será ainda maior com a repercussão nas redes sociais.

O mesmo pode acontecer com as visitas do prefeito divulgadas por ele em vídeo na internet. O estrago pode ser grande se um esquerdista com a cara de pau do rapaz do “Mamãe falei” aparecer também de surpresa na frente de Doria. Pode surgir também um popular ou até mesmo algum funcionário maluco fazendo o mesmo papel. Nunca político algum sobreviveu ileso a muita exposição. A vida não é um programa de televisão. E os reflexos negativos de expor-se demais são muito mais rápidos para um administrador público. Até aqui, Doria vem se deliciando com a popularidade midiática. Mas tenho a impressão de que ele pode se lambuzar neste melado.
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POR José Pires