quinta-feira, 25 de maio de 2023

As rasteiras do PT em Marina Silva e a troca do meio ambiente pela ilusão da riqueza fácil

Quando, às portas do segundo turno da eleição de 2022, Marina Silva anunciou o apoio à candidatura de Lula, até deu para compreender seu gesto. Do ponto de vista da sua trajetória política, o adversário do petista era de fato para ser impedido de se reeleger. No entanto, ao aceitar a entrada no governo de Lula, Marina cometeu um erro difícil de entender. Ela tinha experiência de sobra na relação com Lula e o PT e deveria saber muito bem do que o presidente e seu partido são capazes de fazer com quem não aceita submeter-se integralmente aos seus interesses.


Marina já conheceu na pele a maldade do PT, como quando teve a oportunidade da vitória na eleição para presidente de 2014, quando foi candidata no lugar de Eduardo Campos, morto em um acidente aéreo. Até o acidente fatal ela era vice de Campos. Foi uma das campanhas mais sujas do PT, principalmente porque os ataques se deram contra uma ex-aliada, de muita importância na própria construção do partido de Lula.


Vinda do Acre, onde era próxima de Chico Mendes, lendário líder ambiental assassinado em 1988, Marina ajudou a dar ao partido uma marca de preocupação ambiental e ligação com a defesa das matas por gente das próprias terras, em regiões afastadas dos grandes centros. Mas nem por isso foi poupada dos piores ataques contra sua reputação.


Naquela época, disputando com Dilma Rousseff e demonstrando nas ruas e nas pesquisas que poderia ganhar aquela eleição, um tema usado para atacar Marina de forma absolutamente desleal e mentirosa foi a autonomia do Banco Central, proposta defendida pela candidata.


Na campanha acirrada do PT, Marina chegou a ser nivelada ao ex-presidente Fernando Collor. Dilma a acusava de ser a “candidata dos banqueiros”. Sua forma educada de debater e até sua fragilidade física foi ironizada e desmerecida pelos petistas como um fator negativo de personalidade. A propaganda do PT manipulou de forma agressiva o sentido do apoio dado à candidata pela educadora Neca Setúbal, herdeira do grupo Itaú, como se o próprio banco estivesse por detrás da sua candidatura.


Além dos ataques, digamos, oficiais, na propaganda eleitoral, teve também muitas fake-news contra Marina, embora naquele tempo notícias falsas e ataques desonestos não tivessem esse nome. O PT se excedeu até pelo que é esperado da sua foi notória da sua forma suja de fazer campanha. O partido do Lula tem como componente forte de origem um ódio extremo que leva ao uso de uma terrível violência contra ex-companheiros, ainda pior do que faz contra os inimigos.


Parece herança genética do chamado socialismo real, de partidos comunistas que no poder passam a matar os próprios camaradas revolucionários. Foi mesmo uma barra pesada o que fizeram com Marina. Numa ocasião, ela chegou a chorar com as críticas pesadas do próprio Lula a uma jornalista da Folha de S. Paulo.


Esses ataques desleais, que no final impediram o sucesso de Marina, foram apenas uma continuidade do tratamento violento, até mesmo cruel, que o PT já vinha dando à ex-companheira desde sua demissão do Ministério do Meio Ambiente em 2008 e a saída do PT. O rompimento foi no governo de Lula, depois de muita divergência com o então presidente por variadas questões, que culminaram com a decisão desastrosa de Lula da construção da hidrelétrica de Belo Monte.


Como eu disse, no final do ano passado fazia sentido o apoio a Lula contra Jair Bolsonaro, mas a entrada no governo foi um grave equívoco, depois dessa trajetória de desentendimentos e atitudes explícitas de pouco compromisso de Lula e de seu partido com a defesa do meio ambiente. O PT é um partido atrasado, encerrado numa bolha anacrônica de um revolucionarismo bravateiro, com uma visão assistencialista sem base econômica real. Falta-lhes a compreensão plena da atual situação mundial, perigosa até na questão da própria sobrevivência humana.


Nunca tiveram consciência da interação entre o desenvolvimento e o meio ambiente. Essa crise criada com o desacordo entre Ibama e Petrobras sobre a exploração de petróleo no mar, nas costas da Amazônia, é apenas um acontecimento circunstancial que detona dificuldades incontornáveis de relação entre uma preocupação séria com os recursos naturais e os interesses meramente eleitorais de Lula e claro que também da sua cobiça pessoal — que ninguém esqueça que a Petrobras dá muito dinheiro. Serve até para reforma de sítio e apartamento.


Se não fosse detonada agora essa pororoca política, o desentendimento viria com certeza num tempo curto, logo que não houvesse mais como explorar situações de conflitos ambientais, como vem sendo feito por uma esquerda possuída de uma valentia de gogó, nos discursos bravateiros facilitados pela imensa distância dos lugares onde domina a violência, real e cotidiana, de bandidos capazes de matar.


O PT sempre dá para trás quando ocorre um confronto que exija obrigações políticas de fato e decisão entre a cobiça e o meio ambiente ou qualquer outra relação entre dinheiro fácil, evitando a exigência de trabalho organizado, duro e de longo prazo. É aí que entra a hipócrita liderança de Lula na barganha que amacia o caráter falsamente revolucionário da companheirada.


Marina tem idade e experiência para saber com quem estava lidando. Essa experiência também deveria contar para que ela tivesse a consciência de que Lula não terá nenhuma dúvida em trocar uma imagem internacional de estadista ligado ao meio ambiente pela lucratividade eleitoral de curto prazo da propaganda de mais um “pré-sal” milagroso, redentor da educação, da saúde, do emprego e o que mais tiver pela frente.


Ah, sim: nisso cabe também a necessidade da vingança, sempre presente, conforme eu já disse, como uma marca genética revolucionária do PT. Tudo indica que Marina já está para experimentar esta desventura. Pela via política, já está em andamento o enfraquecimento do ministério ainda de Marina, por forças políticas ligadas ao que tem de pior no chamado “agronegócio”, além de outros interesses em ganho eleitoral e financeiro.


Uma medida provisória que reduz a influência do Ministério do Meio Ambiente teve aprovação prévia nesta quarta-feira. Já se encaminha para ser aprovada de vez. Com ela, o ministério perde o Cadastro Ambiental Rural, a Agência Nacional de Águas e a política nacional de recursos hídricos. Sistemas de informações em

saneamento básico, resíduos sólidos e recursos hídricos vão para o Ministério das Cidades. Claro que tecnicamente não faz sentido que essas funções fiquem fora da pasta do Meio Ambiente. Mas não se trata mesmo de funcionalidade. É briga por poder.


Esta mudança institucional muito ruim para o Brasil teve o aplauso público do PT, por meio até de postagem no Twitter — como pode-se ver na imagem. Para mim não é nenhuma surpresa, como também não deveria ser para Marina, afinal estamos falando de um partido que faz gênero de moderninho, mas é pateticamente anacrônico. Lula está apenas revelando o que sempre foi e seu partido segue o chefe, às ordens como sempre. Não há nenhuma novidade, inclusive o fato de Marina perceber isso tão tarde.

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Por José Pires

terça-feira, 23 de maio de 2023

Marina Silva e Lula: uma história de complicações que pode se repetir

A volta de Lula ao Brasil traz para suas relações com a ministra Marina Silva um tom de “Tchau, querida!”, por causa da queda de braço entre o Ministério do Meio Ambiente e a Petrobras, que teve barrado pelo Ibama seu plano de explorar petróleo no Oceano Atlântico, na região conhecida como Foz do Amazonas. 


A prospecção de petróleo é prevista para englobar as costas marinhas de seis estados: Amapá, Pará, Maranhão, Piauí, Ceará e Rio Grande do Norte. O projeto da Petrobras mostra em um mapa explicativo a Costa Equatorial brasileira tomada por pontos vermelhos, indicando poços exploratórios, estendendo-se do Amapá ao Rio Grande do Norte. 


Dá para imaginar  a volúpia eleitoral de Lula com este grande mapa com todos esses poços indicando riquezas imensuráveis aos políticos da região amazônica e do nordeste brasileiro, com a promessa da redenção econômica do povo desses lugares. Como não podia faltar nessa propaganda, o projeto da Petrobras já vem sendo chamado de “novo pré-sal”, pelo potencial de extração de petróleo que evidentemente já vem sendo colocado como coisa certa.


Alguém duvida que Lula está ansioso para anunciar que entraremos novamente na Opep? Foi o que ele fez na marotagem política do pré-sal. Foi uma pena que nessa primeira vez não houve a confirmação da expectativa da estupenda riqueza do pré-sal — jorraria grana para a educação e a saúde, lembram?. Pois é: não deu para entrar no clube dos maiores produtores do precioso líquido.

 

Agora, o desacordo com o Ibama evidentemente é pelo risco que essa corrida pelo ouro pode trazer para as costas brasileiras e a Amazônia. Podem ser irreversíveis os danos ambientais para a região. Um exemplo de dano previsto por ali: foi descoberto recentemente no Rio Amazonas um gigantesco recife de corais, com esponjas que podem passar de dois metros de comprimento. Com 9,5 mil quilômetros quadrados, o sistema todo é maior do que a Região Metropolitana de São Paulo. Vai do norte do Maranhão até a fronteira com a Guiana Francesa.


Essas informações aparecem agora com razoável destaque por causa do polêmico embate entre o Ibama e o “espírito empreendedor” de políticos que estão sempre vendendo facilidades que jamais entregam. Mas não são questões recentes, de modo que o presidente Lula — caso este viajante infatigável assentasse o traseiro para trabalhar no que realmente interessa — já deveria conhecer muito bem. É coisa para ser resolvida numa reunião de poucas horas com técnicos do Ministério do Meio Ambiente.


No entanto, Lula se faz de sonso, o que não é novidade. Finge desconhecer o problema. Ainda no Japão, onde foi participar como convidado da reunião do G-7, ele disse o seguinte: “Estou chegando no Brasil na terça-feira e vou cuidar disso”. Alguém pode crer que o presidente brasileiro só tomou conhecimento dessa coisa depois da confusão criada porque o Ibama se posicionou de forma contrária ao interesse da Petrobras?


O petista procura enrolar, mas foi ao mesmo tempo comentando o assunto, ainda no Japão, de uma forma que deu a entender que haverá dificuldade dele se entender com a ministra Marina. "Se explorar esse petróleo tiver problema para a Amazônia, certamente não será explorado, mas eu acho difícil, porque é a 530 quilômetros de distância da Amazônia", foi o que ele disse aos jornalistas, em Hiroshima.


Isso vai de encontro ao que a ministra Marina pensa sobre as pretensões da Petrobras. Está claro que Lula não fecha com a posição de Marina e do Ibama. Bem, ele pode tentar convencer sua ministra a mudar de opinião, uma tarefa bastante complicada. Ela teria de desistir do que construiu até agora e refazer todos os seus compromissos.


Este é um problema que traz à memória o conflito que levou à sua demissão na outra vez que ela foi ministra, também de Lula e também do Meio Ambiente. A discórdia era sobre a construção da hidrelétrica de Belo Monte. Também havia o Ibama apontando riscos. Em 2008, Marina se demitiu e saiu do PT. E o tempo mostrou que ela estava certa. Naquela ocasião, Lula desmereceu as preocupações com o meio ambiente e impediu o Brasil de se preparar para o que o mundo enfrenta agora, como o temor inclusive de um colapso. Belo Monte ficou como um problema ambiental e humano na região. E tampouco gera a energia prometida.


Na volta do Japão, qualquer resposta de Lula a esta questão ambiental levantada pelo projeto da Petrobras vai colocá-lo frente a pressões difíceis de administrar. O lobby político a favor da extração de petróleo na Foz do Amazonas junta forças políticas fundamentais para seu governo, com políticos dos mais variados cargos, empresários e as populações de cada estado, com muita gente que provavelmente estará convencida de que o ganho é garantido.


Claro que o próprio Lula tende a aceitar mais a lucratividade — em votos e até a financeira — que venha no curto prazo, do que a expectativa da qualidade, em um futuro que do ponto de vista pessoal podemos nem usufruir. O chefão petista não tem personalidade de quem planta para gerações futuras colherem os frutos. Creio que já ficou comprovado que ele prefere para já os hotéis caros e vinhos idem.


Mas neste caso ele terá de enfrentar pressões que afetam uma imagem muito importante para seu governo, com consequências políticas em todo o mundo. E são danos de curto prazo.  Lula pode ceder à exploração da Petrobras, mas para isso terá de abdicar do prestígio político da defesa do meio ambiente, que na atualidade é o ponto fundamental de sustentação do Brasil no plano mundial.

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Por José Pires

quinta-feira, 18 de maio de 2023

Fernando Collor na cadeia. Até quando?

O Judiciário no Brasil se desmoralizou tanto que deve-se desconfiar mesmo quando acontece uma decisão justa, como desta quinta-feira, com o STF considerando  Fernando Collor culpado pelos crimes de corrupção passiva, organização criminosa e lavagem de dinheiro.


Já está formada maioria para mandar Collor para a cadeia. Foi de Cármen Lúcia o sexto voto, entre os dez possíveis. O julgamento será finalizado na próxima quarta-feira, com os votos de Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Rosa Weber.


Quem abriu divergência foi Nunes Marques, que optou por inocentar não só Collor, como também os outros três envolvidos na trama corrupta: Leoni Ramos, operador do esquema; Pedro Paulo Bergamaschi; e Luís Pereira Duarte de Amorim, diretor financeiro das empresas de Collor.


Collor entra para a História mais uma vez, novamente por falcatruas pesadas. Ele é acusado de ter recebido cerca de R$ 29 milhões em propina, lavadas por meio de pagamentos para suas empresas de mídia em Alagoas. O esquema foi descoberto em investigações da Lava Jato.


Ora, então neste caso a Lava Jato merece o respeito do STF? Aqui é que entra a desconfiança que pesa sobre o nosso Judiciário, carente de revisão e de uma rigorosa limpeza. Já existe uma sugestão de pena de 33 anos e 10 de prisão para o ex-presidente, junto com uma multa de R$ 20 milhões. Foi feita pelo relator, Edson Fachin. É uma surpresa em uma Suprema Corte que vem facilitando para criminosos, condenados com muitas provas — mesmo bandidos do outro crime organizado, não o político mas o comum — que vão sendo soltos, um atrás do outro.


Uma decisão como esta condenação de Collor seria para o país fazer festa, pois, ainda que tarde, haveria um livramento — como se diz tanto hoje em dia — de um político que fez o diabo com o Brasil. Mas isto valeria num país “normal”, digamos, que é algo que o Brasil nunca foi plenamente, ainda que nunca tenha descido tão baixo, a um ambiente de plena imoralidade e desprezo pela honestidade. 


O STF pode até mandar Collor agora para a cadeia, mas eu não teria surpresa alguma se um pouco mais adiante, numa necessidade de reordenar o cenário político brasileiro no interesse de maiorais da política e do Judiciário, surja a ordem para que ele seja solto para dar uma mãozinha no serviço.

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Por José Pires

quarta-feira, 17 de maio de 2023

O relator da cassação do mandato de Deltan Dallagnol, seu amigo do peito e a missão cumprida

Para ilustrar de forma significativa a condição em que está o nosso Brasil, apresento na imagem recortes de um vídeo que registra um felicíssimo encontro do ministro Benedito Gonçalves, do TSE, com o então ex-presidente Lula, que estava acompanhado de Dilma Rousseff. Abaixo do post está o link. A filmagem foi feita durante a posse do ministro Alexandre de Moraes no comando da Corte, em agosto do ano passado.


Lula vinha de uma estadia na cadeia de 580 dias, condenado por corrupção — por dez juízes, não só pelo Sergio Moro, por mais ódio que o PT sinta dele. Lula havia saído do xilindró há menos de um ano, mas já transitava todo serelepe nas altas cortes do Judiciário. É notável no vídeo a solicitude do ministro Gonçalves, tratando o petista com a amabilidade de um antigo companheiro de aventuras. Lula dá tapinhas muito amigáveis no rosto do ministro. Eles se abraçam, grudando os corpos.


Gonçalves já estava atuando na eleição presidencial, como corregedor-geral da Justiça Eleitoral, que teve início em 2 de julho. Guardava distância dos demais candidatos. Uma das medidas de destaque do ministro do TSE foi a proibição do uso no programa eleitoral de Jair Bolsonaro de imagens da celebração do 7 de Setembro.


O vídeo que mostra a intimidade entre Gonçalves e Lula voltou a ser postado nas redes sociais depois da cassação de Deltan Dallagnol. Nele, é possível ouvir o ministro do TSE dizendo ao chefão do PT: “Vou ligar, pode deixar”.


A atitude prestativa do magistrado a Lula manteve-se depois da vitória do petista, em outubro. Já em dezembro, na cerimônia de diplomação pelo TSE como presidente da República, ao ser chamado para conduzir Lula ao plenário, foi captado pelo áudio a voz de Gonçalves, que ao passar pelo presidente do TSE, Alexandre Moraes, sussurra ao seu ouvido: "missão dada é missão cumprida".

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Por José Pires


Assista aqui ao vídeo do doce encontro entre Lula e o ministro do TSE


Cassação de Deltan Dallagnol atinge o eleitor brasileiro e a democracia

A condição política em que o Brasil é colocado pela cassação do mandato de deputado federal de Deltan Dallagnol é de total insegurança quanto ao processo eleitoral e até mesmo em relação à democracia brasileira. O voto do eleitor tem realmente algum peso frente ao domínio que se estabelece na política e no Judiciário de forças que não têm o propósito do respeito aos direitos civis e da honestidade na aplicação do dinheiro público? Cabe a pergunta.


O STF pode evitar este risco à nossa democracia na resposta ao recurso que a defesa do deputado já informou que vai levar à Suprema Corte. Se o STF confirmar a cassação, o país passará a viver sem segurança sobre o significado real do voto. Em razão da promiscuidade que se criou entre o Judiciário e a política, o Brasil passou a conviver com insegurança jurídica em várias áreas. Se acontecer a cassação de Dallagnol, estará inaugurada a insegurança eleitoral. 


O TSE  cassou o mandato por unanimidade, tendo como base a Lei da Ficha Limpa, com a alegação de fraude por ele ter pedido exoneração do cargo de Procurador da República no Ministério Público Federal. Dallagnol teve a maior votação como deputado federal no Paraná, com 344,9 mil votos. 


A acusação contra o ex-promotor da Lava Jato veio do Partido da Mobilização Nacional (PMN) e da Federação Brasil da Esperança, que tem também o PT, claro que na chefia do ajuntamento de partidos. No Paraná, Dallagnol é um grande temor de Gleisi Hoffmann, presidente nacional do partido do Lula e chefona petista no estado. O ex-procurador já é bem cotado politicamente, com amplas chances de sucesso muito anos à frente, até para governador, enquanto o partido de Gleisi só afunda.


Esta cassação parece ser mais uma das tramóias de Lula e do PT para armarem um cenário eleitoral favorável para mantê-los com a hegemonia do poder, além de claramente fazer parte da vingança petista contra a Lava Jato, no mesmo espírito de “vendetta” que levou à destruição do trabalho de juízes da Itália contra a máfia e políticos corruptos, até com um atentado que matou o juiz que mais simbolizou aquela honrosa luta, o juiz Giovanni Falcone.


Esta situação encaixa-se também — e como! — no clima de intimidação que foi instituído no país contra a livre manifestação do pensamento. A impressão é que alguém eliminou esta parte da Constituição. O próprio Ministério Público fica altamente pressionado com essas coisas. Qual é o promotor que se atreveria a agir com o rigor da lei depois desses golpes contra quem ousou combater a corrupção?


E evidentemente o temor de cobrar honestidade e apontar ilegalidades tende a se espalhar pela população. Francamente, pode dar medo até de fazer alguma pergunta que não gostem. A libertação equivocada de Lula vai ficando cada vez mais custosa. O clima de impunidade criado no país estimula até a perversidade dos criminosos comuns e do crime organizado, pois o pior pode — e sem dúvida vai — acontecer quando roubalheira de milhões e mais milhões e o aparelhamento criminoso do Estado não dão em nada.


A cassação pode ser revertida. O STF terá a chance de consertar este erro, mas por ter chegado até este ponto, o Judiciário brasileiro mostra que a necessidade de uma revisão séria de seu funcionamento. O relator da ação contra Dallagnol, ministro Benedito Gonçalves, diz em seu voto que a renúncia ao cargo foi feita “de forma dissimulada” para “contornar vedação estabelecida em lei, que é a indisponibilidade de disputar a eleição”. Porém, essa teoria não se confirma como fato. Na época da demissão o então procurador não respondia a nenhum processo administrativo disciplinar.


A tese do relator se baseia em hipóteses. Procedimentos existentes contra Dallagnol, ele afirma no seu voto, “poderiam vir a ser convertidos ou dar azo a processos administrativos disciplinares”. A demissão ocorreu onze meses antes das eleições do ano passado. Ou seja, com quase um ano de distância, o acusado coloca em prática um plano para fugir de processos que ainda não existiam e podiam nem ocorrer, visando uma eleição ainda muito longe. 


O fato comprovado é que Dallagnol não respondia a nenhum processo disciplinar quando saiu do Ministério Público. No entanto, o relator instituiu o crime por hipótese. Não é exatamente a letra da lei. Parece mais com leitura da mente do acusado e previsão do futuro — com quase um ano de antecedência ou até mais que isso, afinal Dallagnol teria de estar pensando nesta trama muito antes da própria demissão.


A confirmação da cassação recebeu votação unânime de seis colegas do ralator e lança o país em mais uma confusão política. Este é o estado a que chegamos, como dizia há muitas décadas Aparício Torelly, o inesquecível Barão de Itararé. Ele se referia à ditadura de Getúlio Vargas, do Estado Novo, um estado a que, obviamente, espero que não cheguemos, ainda que seja evidente o esforço que muitos vêm fazendo para que algo parecido aconteça.

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Por José Pires

segunda-feira, 15 de maio de 2023


 

terça-feira, 9 de maio de 2023

O PT volta ao poder sem capacidade de governar e com o futuro do partido sob risco grave

A eleição de Lula foi uma infelicidade para o país, o que eu já sabia muito bem. Não houve como articular uma opção ao menos razoável no primeiro turno, sobrou a escolha entre os dois mais negativos ao nosso futuro. Porém a realidade vem sendo pior do que se esperava, porque Lula e seus companheiros estão numa regressão política que extrapola a expectativa ruim. O governo do PT já se encaminha para a metade do ano e ainda não se sabe nem como eles pretendem enfrentar os graves problemas econômicos que aí estão.


Na realidade, cercado de ministros longevos na idade e na carreira, Lula lidera um governo que parece de primeira viagem. Já de início, deixaram até as portas do Palácio do Planalto serem arrombadas. Por enquanto, repetem velhos erros, alguns deles até aperfeiçoados. Já houve tempo para que fossem apresentados planos eficientes em várias áreas, atacando problemas muito graves que foram objeto da campanha petista em peças agressivas, com promessas de soluções que viriam com urgência.


O povo mantém-se na espera, já sabendo de antemão que não haveria cerveja e picanha. Mas cadê as medidas que ao menos sirvam para amenizar estragos e estabeleçam um caminho razoável para melhorar a vida, mesmo que de forma modesta? Não se esperava muito, mas não tão pouco assim. Acontece quase nada e também não há nenhuma previsão de trabalho efetivo que encaminhe soluções atualizadas em relação ao contexto novo mesmo de velhos problemas que não tiveram, lá atrás, um tratamento de qualidade.


Uma coisa que ficou clara é que, em matéria de futuro, os petistas e seus aliados colocam na frente seus próprios interesses. Como é forte esta característica egoísta que hoje em dia marca o PT, no lugar do diferencial político que deu projeção ao partido, a partir da consagração eleitoral garantida pelo discurso que prometia dias melhores para o país. O Brasil tornou-se algo menor na pauta partidária, a não ser, é claro, em cada eleição, quando os petistas tornam-se novamente os arautos de mudanças revolucionárias.


Um fato importante sobre o estado a que chegou o PT, na sua transformação de um partido como outro qualquer do ponto de visto da ética e do valor efetivo de suas ações, é esta notícia desta semana sobre a nomeação de esposas de ministros para postos de altos escalões, em alguns casos apenas para engordar salários.


O Estadão desta terça-feira traz cinco dessas mulheres, com nomeações que já eram conhecidas, até para tribunais de contas estaduais. As esposas de Rui Costa, da Casa Civil, e de Wellington Dias, do Piauí, estão nesta lista. Vão receber salários altíssimos, ainda mais porque os pagamentos saem dos cofres de estados com população muito pobre há décadas.  Os salários de cada uma é de respectivamente R$ 37.589,96 e R$ 35.462,22, podendo ultrapassar R$ 50 mil com auxílios e indenizações.


Costa e Dias são ex-governadores, com mandatos seguidos. O grupo de ambos domina a política em seus estados há pelo menos vinte anos, em lugares que estão exatamente na mesma condição de domínio e pressão sobre os mais pobres, na mesma exploração em que estavam quando o PT começou a ganhar eleições nacionais. As promessas não só ficaram para trás, os petistas repetem o que faziam os velhos caciques, antes chamados pela esquerda de “elite exploradora”.


É neste tipo de atitude — coisas asquerosas e até sem senso de humanidade — que pode-se encontrar uma visão mais prática do que amolda a opinião pública e cria esta forte rejeição ao PT, especialmente da classe média com informação mais razoável do que fazem esses crápulas. O partido do Lula acabou. E ele próprio deu um final ao mito em torno da sua figura. Que infelicidade foi sua eleição, repito, mas teve pelo menos esta compensação: foi o fim do mito.


Pode-se comprovar com resultados eleitorais, especialmente na eleição para presidente, que já passou da hora do PT passar a ter medo de ser feliz. Nesta eleição presidencial houve um ponto de alta simbologia desta decadência. Mesmo criando armações poderosas com muito dinheiro e articulações escusas, Lula quase perdeu a eleição em segundo turno para um candidato com defeitos políticos e de personalidade tão terríveis, que não consta nele sequer compaixão pelos mortos e o sofrimento de amigos e familiares com as perdas trágicas que assolaram o nosso país.


Perde-se muito tempo em variadas interpretações sobre a flagrante derrocada sofrida na imagem de transformação política, que foi uma identidade forte da esquerda, criando um impulso ao crescimento do PT e de outros partidos de linha esquerdista, que foram gradativamente ocupando espaços em eleições legislativas e do Executivo, em várias instâncias. Engabelando os brasileiros com diferenças que nunca foram verdadeiras, o PT foi trabalhando na ampliação de poder até a conquista de quatro mandatos de presidente da República.


Não coloco na soma esta última eleição, na lamentável volta de Lula. A continuidade cessou no último mandato de Dilma Rousseff, decepado pelo meio. Esta última eleição de Lula nada teve a ver com o convencimento eleitoral progressivo do discurso esquerdista. Em 2022, Lula se elege impulsionado por uma ampla rede de interesses com o objetivo de se apoderar do Estado e demolir de vez a consciência social encampada pela população, de que a fonte básica das complicações nas mais variadas áreas estava na corrupção, que inviabiliza tecnicamente o enfrentamento dos problemas brasileiros.


Lula foi o ponto de apoio escolhido por elites do empresariado e da política — associados para sugar os cofres públicos — para “estancar a sangria”, expressão usada em maio de 2017, por Romero Jucá, líder do governo Temer e então senador por Roraima, um estado com maiores possibilidades de conquistar um mandato em arranjos de bastidores e muito dinheiro. Jucá dava o alerta de que havia urgência de acabar com a Lava Jato e apagar a animação popular que acreditava ser possível um país que botava corruptos na cadeia.


Não é preciso trazer muitas considerações sobre a falta de vigor do PT e da esquerda nesta eleição. Na disputa por cargos executivos, a derrota foi geral. No Congresso Nacional foi a mesma coisa. A exceção foi em estados, como se deu na Bahia e no Piauí, onde petistas souberam usar eleitoralmente os mesmos esquemas das antigas oligarquias. 


É visível que do ponto de vista da organização o PT está destroçado. No Paraná temos um exemplo significativo e que pode abranger o desastre político no plano nacional desse esfacelamento orgânico — esta palavrinha que a esquerda gosta tanto. É a base eleitoral de Gleisi Hoffmann, presidente nacional do partido, colocada no cargo por Lula em troca da sua total submissão.


Gleisi tem 57 anos e foi senadora por apenas um mandato, até 2019, quando não tentou se reeleger porque com certeza sofreria uma derrota humilhante. Optou então pela eleição mais fácil, como deputada federal. Cada mandato seu fica caro para o contribuinte. Na eleição passada, ela gastou exatos R$2.636.662,91. Deste total, 91,4% veio do fundo eleitoral: R$2.410.000,00.


A eleição desse pessoal tem essa facilidade financeira. Conta também o uso da máquina partidária e do Legislativo, em viagens por todo o estado durante todo o mandato, a exposição contínua da imagem inclusive nos horários gratuitos do partido, além dos diretórios municipais que podem atuar a serviço das candidaturas. É claro que isso permanece escondido nos bastidores.


Mas o que de fato existe como trabalho pessoal de Gleisi na organização de seu partido? Na última eleição, Lula teve menos votos no Paraná que Jair Bolsonaro nos dois turnos. No primeiro foi 55,26% a 35,99% dos votos válidos. No segundo turno, Bolsonaro aumentou bastante a vantagem, de 62,40% a 37,6%. 


Para governador, o PT teve que recorrer a Roberto Requião, que depois de 40 anos no MDB saiu corrido do partido para filiar-se ao PT. A derrota do neopetista Requião foi acachapante. Ratinho Júnior ganhou no primeiro turno, com dois milhões e seiscentos mil votos à sua frente — Requião teve exatos 1.598.204 votos. Gastou R$ 4.379.307,89 do contribuinte, quase 100% dos cofres do partido. 


Para o Senado, a coligação do PT teve Rosane Ferreira, do PV, que ficou em quarto lugar com baixa votação. É a situação de um partido totalmente sem lideranças novas, como está o PT até agora. No final, no desespero para impedir a eleição de Sergio Moro, os petistas apelaram também para o apoio à candidatura de Alvaro Dias, que acabou em terceiro lugar. 


Um ponto fundamental que mostra incapacidade de liderança de Gleisi está na eleição de Moro para o Senado. Na sua primeira disputa eleitoral, o ex-juiz acabou sendo muito bem votado, depois de enfrentar artilharia pesada de todos os lados, inclusive dos bolsonaristas, que tinham um candidato forte. Faltaram apenas 50 mil votos para que Moro alcançasse os dois milhões. Ficou com 33,50%, deixando o candidato bolsonarista em segundo lugar, com 29,12%.


Outra vitória importante, que merece constar no currículo de Gleisi como dirigente partidária, foi a eleição de Deltan Dallagnol, como o deputado federal mais votado do estado. Ressalte-se a diferença de gastos eleitorais em relação à Gleisi, com Deltan gastando 73% do fundo eleitoral.  Sem máquina partidária (no Podemos, que praticamente não existia no Paraná), o ex-promotor da Lava Jato gastou R$ 1.450.000,00, contra os já citados R$ 2.636.662,91 da deputada petista.


Creio que este relato da performance da apadrinhada de Lula como liderança política e da organização do partido, especialmente no seu próprio estado, serve como demonstração da condição em que está o PT. O partido não tem prefeito em nenhuma das cidades importantes do Paraná e também tem pouca participação nas câmaras municipais. 


Este cenário precário não é muito diferente nos demais estados. Em 2020, o PT não elegeu prefeito em nenhuma capital e na próxima eleição não existem candidatos com potencial de vitória na maioria das grandes cidades. É a partir disso que os petistas terão que enfrentar as eleições municipais do ano que vem. Se alguém acha que  é possível um crescimento político dentro deste padrão liderado por Gleisi e seu chefe Lula, terá então que contar apenas com a  sorte para que seu desejo vire realidade.

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Por José Pires

Julian Assange, do Wikileaks, encontra afinal seu salvador

Lula voltou da viagem a Londres com mais uma tarefa que arrumou para se complicar: ele disse que vai lutar pela libertação de Julian Assange, o fundador do Wikileaks. O presidente falou sobre a sua nova missão na sexta-feira durante entrevista coletiva, quando explicou que o assunto não havia sido tratado na reunião que teve com o primeiro-ministro do Reino Unido, Rishi Sunak.


Foi um jornalista que trouxe a lembrança de Assange, atualmente preso no Reino Unido e com a extradição para os Estados Unidos autorizada pelo governo inglês. Lula chegou a se desculpar, “porque esse foi um assunto que esqueci de falar”. O presidente garantiu que ligaria para o primeiro-ministro assim que chegasse ao Brasil. 


Eu duvido que tenha mesmo feito isso, mas seria interessante saber como o primeiro-ministro inglês receberia um assunto desses. É uma decisão do Judiciário e os ingleses costumam tratar desse tipo de coisa com uma discrição que Lula não demonstra em assunto algum. Entre os ingleses não é também como em certos países, onde questões judiciais transitam livremente pelo meio político, de uma forma privilegiada e podendo inclusive influenciar resultados, até mesmo em temas tratados no Supremo.


Falando sobre Assange depois de interpelado pelos jornalistas, na prática Lula acusou o sistema judiciário inglês de parcialidade, aproveitando para atacar novamente o governo dos Estados Unidos. A imprensa brasileira não deu atenção às palavras do petista, no entanto é óbvio que são declarações que revelam novamente um sujeito que parece perturbado. Mas com Lula, como se sabe, grande parte da imprensa tem uma tolerância inesgotável.


“É uma vergonha que um jornalista que denunciou a falcatrua de um Estado contra outro esteja preso e condenado a morrer em uma cadeia", disse ele após ser questionado por uma jornalista. Estamos ouvindo aqui o mesmo Lula que cala-se em relação aos crimes da ditadura de Daniel Ortega e até o defende, enquanto o ditador prende e mata opositores, além de perseguir padres e freiras.


A extradição de Assange vem obedecendo todos os trâmites legais. Ele teve todo o direito à defesa, sem ter que viver o terror que é enfrentar uma prisão em regimes que Lula costuma defender. E na realidade, o fundador do Wikileaks foi preso no Reino Unido pela acusação de estupro, em pedido de prisão feito pela Suécia. 


A extradição para os Estados Unidos veio depois e está para ser cumprida. Ele é acusado pelo governo americano por espionagem, roubo e conversão de propriedade do governo. Os vazamentos de registros militares e diplomáticos do país ficaram famosos na mídia e por isso ele pode ser condenado a 175 anos de prisão.


Mas por que afinal Lula está se metendo nisso? Ora, trata-se do efeito da reversão histórica e política que vem acometendo o petista. Lula se parece cada vez mais com o oposicionista anterior à sua chegada ao poder. Está cada vez mais “terceiro mundista”. O problema é que o Terceiro Mundo não existe mais, se é que existiu algum dia. 


E não é que Lula já não tenha cometido besteira parecida a esta, de atacar o próprio sistema judiciário de um país estrangeiro. Ele já fez isso como presidente, quando em 2010 seu governo deu guarida ao terrorista italiano Cesare Battisti, condenado na Itália à prisão perpétua por quatro assassinatos cometidos na década de 1970. Na época, os petistas atacaram o sistema judiciário italiano, acusado por eles de perseguir um inocente.


Três anos atrás, Lula disse ter se arrependido pelo refúgio concedido ao criminoso. Battisti já havia sido extraditado para a Itália pelo governo da Bolívia, onde entrou irregularmente depois de ter fugido do Brasil. O trapaceiro passou 40 anos alegando inocência e recebeu o aval dos petistas no Brasil> Pois há quatro anos ele confessou que de fato havia praticado os crimes. Para mim não haverá surpresa se uma confissão de culpa também surgir um dia da parte do fundador do Wikileaks.


Uma certeza absoluta é de que seus vazamentos não se pautaram pela liberdade de expressão ou pelo sentido exclusivamente jornalístico. No caso dos vazamentos feitos pelo seu Wikileaks, sem dúvida houve muita parcialidade nos assuntos escolhidos para repassar para a imprensa. No Brasil, por exemplo, o foco era o favorecimento dos petistas, o que pode ser que seja um motivo da solidariedade de Lula. Ou pode haver outros compromissos, nunca se sabe.


Nos Estados Unidos também havia um lado nos vazamentos, o que acendeu a suspeita que permanece até hoje da possível relação do Wikileaks com Vladimir Putin. Durante a disputa da presidência entre Donald Trump e Hillary Clinton, em 2016, foram divulgados e-mails da candidata do partido Democrata, que prejudicaram bastante sua campanha.


As informações que favoreceram Trump foram hackeadas da conta de John Podesta, chefe de campanha de Hillary. O Wikileaks trabalha basicamente com a invasão de informações confidenciais por meio de hackeamento, sem que nunca se saiba quem fez o serviço e como foi pago. Esse “modus operandi” torna difícil conceituar Assange exclusivamente como jornalista, como faz Lula.


Pode-se também fazer algumas ligações que permitam saber melhor com quem estamos tratando, sob a capa do defensor da liberdade de expressão. Assange está em uma penitenciária inglesa desde 2019. Antes disso, ficou asilado na embaixada do Equador em Londres desde 2012, onde entrou para escapar de um pedido de extradição da Suécia. Seu plano era conseguir asilo na Rússia. O presidente do Equador era Rafael Correa, também amigo de Lula. Com a saída de Correa do governo, Assange acabou sendo entregue à justiça inglesa.


É interessante a boa vontade do governo russo com o fundador do Wikileaks. Assange chegou a fazer uma série de programas de entrevistas na Russia Today, rede de televisão internacional fundada na Rússia e financiada pelo governo russo. Os programas são todos direcionados ideologicamente, na pauta e na escolha dos entrevistados.


Para se ter uma ideia da parcialidade, uma das conversas é com Sayyed Nasrallah, líder da organização terrorista Hezbollah. A transcrição mostra uma entrevista parcial, como um papo entre amigos. Cabe dizer que o Wikileaks jamais divulgou nenhum hackeamento com informações internas do Hezbollah.


O nome da série é “O Mundo Amanhã”, que parece ser um projeto ou antevisão do que vem por aí. Tomara que o plano não dê certo. Uma série de programas como estes jamais seria contratada sem a permissão de Vladimir Putin. Ou pode ser que o próprio Putin tenha feito o convite ao amigo do Lula.

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Por José Pires

quinta-feira, 4 de maio de 2023

O cartão de vacina de Jair Bolsonaro e outros outros alvos que surgem no caminho da investigação

A primeira pergunta que me veio à cabeça quando caiu do nada a operação da Polícia Federal, que teve até busca e apreensão na casa de Jair Bolsonaro, é que raios o ex-presidente podia querer com a falsificação de um cartão de vacinação, ele que sempre fez questão de afirmar que não se vacinou e até fez disso uma marca pessoal. É natural que seus inimigos estivessem buscando coisas para incriminá-lo, até mesmo neste tema absurdo do negacionismo da vacina, que acabou complicando sua tentativa de reeleição. O que não se esperava é que o alvo fosse um cartão de vacinação.


O próprio nome da operação policial pode servir como explicação da surpresa de todos, não a surpresa de terem enfim colocado a polícia de manhã na casa do ex-presidente, mas do modo como lá se chegou. Cá pra nós, os adversários gostariam de procurar muita coisa na casa do Bolsonaro, mas um cartão de vacinação não estava, pelo menos até agora, entre esses objetos de desejo.


E não estou falando só do foco principal, que é Bolsonaro. São 16 pessoas investigadas pela Polícia Federal, incluindo o ex-assessor Mauro Cid, tenente-coronel que foi um faz-tudo durante todo o mandato do ex-presidente. Cid foi preso e teve também a casa devassada pela polícia. O que será que saiu dali, onde, em tese, procuravam cartão de vacina? A curiosidade cabe também ao que o tenente-coronel pode falar, além do que pode sair da boca de mais cinco que foram presos preventivamente.


Venire é o nome da operação policial, que vem da expressão em latim "Venire contra factum proprium". Em português, significa "vir contra seus próprios atos". “Factum proprium” indica algo da parte do próprio autor. E “venire contra” é a situação de contrariedade da expressão.


Não é exatamente a expectativa do encontro de um cartão de vacinação que movimenta a polícia e o Judiciário, em ações que evidentemente não cessam com a desta quinta-feira. Bolsonaro já andava chorando bestamente nos últimos meses e ao explicar-se diante de repórteres nesta manhã, logo depois da passagem da polícia por sua casa, o chorão também derramou lágrimas. Mas desta vez ele tem mesmo motivo pra chorar. E o motivo é que o que está em curso é do tipo "Venire contra factum proprium".


Quem já fez movimentos sociais usando técnica e inteligência sabe muito bem do que estou falando. Promotores, juízes e até mesmo políticos, que agem com o sentido pleno da palavra inteligência, adquirem muita experiência nisso. O método é focar em algo que na aparência é menos grave, às vezes até pouco, quase nada importante do ponto de vista jurídico, para chegar ao que realmente importa. Pode-se até ver uma contradição entre o que se procurava com o que de fato foi encontrado, mas só quem foi flagrado é que não vai gostar deste resultado.


Em política, pode-se, por exemplo, ignorar uma montanha de ilegalidades, enorme do ponto de vista jurídico e dos milhões, para fixar-se em uma falcatrua menor, que pode ser por exemplo o pagamento com dinheiro público de um show com uma estrela global. Ou então a reforma de um sítio no interior paulista. Pode ser também um triplex reformado no litoral ou algumas pedaladas. Tudo parece mixuruca frente aos milhões aparentemente ignorados, mas dá desmoralização política do mesmo jeito e às vezes até cadeia ou queda do poder.


É isso: a ação parece não ter relação com o objetivo, ocultando o propósito real, que pode ser um flagrante no adversário para empurrá-lo para as mãos da Justiça. Indícios ou provas que surgem podem até ser vistos por jornalistas e comentaristas dos mais variados como incriminações que surgiram contra os próprios atos, neste caso a busca de um cartão de vacinação — falso ou autêntico, não importa.


Esse modo de agir parece mais um exercício — ou uma busca ao acaso, para quem vê de fora. O processo aparenta ser aleatório, no entanto obedece a uma técnica e tem rumo, ainda que esteja aberto à inspiração ou a um impulso casual. Esse jeito de fazer a coisa certa serve também como atividade criativa, para encontrar o ponto em que numa encenação, um estudo ensaístico, num romance ou noutra forma escrita e até mesmo na música, no desenho ou na pintura ocorre o encontro da unidade de todo o conjunto criativo.


Venire contra factum proprium. É também uma forma de estudar o terreno, garimpar entre coisas que nada provam, até encontrar o que realmente importa. Como se viu, funciona para entrar na casa do adversário sem bater: “Bom dia, vim ver como está o cartão de vacinação”. Mas em gavetas e armários, num celular, entre papéis guardados ao acaso numa prateleira, tem todo um mundo a ser descoberto, ainda que esta revelação venha contrariando os próprios atos de quem encontra o que queria fazer crer que não estava procurando.

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Por José Pires

quarta-feira, 3 de maio de 2023

O argentino Alberto Fernández pede socorro ao companheiro de Brasília: me dá um dinheiro aí

Lula não parece ainda estar satisfeito com a quantidade de tarefas que arrumou, entre elas a de levar a paz para o mundo, reformular o Conselho de Segurança da ONU, além de outras atividades de um complexo plano de transformação global que talvez um dia ele explique melhor. Ah, sim: tem também o projeto de revisar rigorosamente a bibliografia histórica do pensamento econômico, cujos livros, segundo afirmou, estão ultrapassados. O cara sabe arrumar coisas difíceis de fazer pelo mundo afora, de tal modo que um estrangeiro desavisado pode até achar que o país que ele governa é um tédio em matéria de coisas para serem feitas.


Pois agora Lula vai atuar também para tirar do buraco países da América Latina praticamente falidos. Começará por um dos países mais complicados, a Argentina de Alberto Fernández. O presidente argentino esteve com o presidente brasileiro nesta terça-feira em Brasília e voltou ao seu país depois de uma reunião de quatro horas, com a promessa de que o governo brasileiro vai abrir um crédito para que a Argentina compre produtos brasileiros.


O plano é espantoso: o Brasil financiará exportadores brasileiros e importadores argentinos para que os argentinos possam comprar nossos produtos. Provavelmente o processo será o mesmo usado pelos governos anteriores do PT, com o BNDES bancando o crédito. No final, quando a dívida não é paga, o custo fica para o governo brasileiro.


Lula ainda não falou do financiamento de obras na Argentina, como foi feito por governos do PT com Cuba e Venezuela, mas isso é questão de tempo. Fernández quer construir um gasoduto e veio buscar dinheiro com Lula. Não apenas sobre esta obra estrangeira, que tudo indica que ficará na conta do contribuinte brasileiro, Lula disse que irá fazer “todo e qualquer sacrifício” para ajudar o país vizinho.


Já se sabe o desfecho de coisas desse tipo. O preço é caro. A ditadura cubana e a ditadura venezuelana até hoje não pagaram o que devem. Outro país que teve contas pagas pelo Brasil foi Moçambique, em empréstimos concedidos entre os anos de 2009 e 2012 para a construção do aeroporto de Nacala. A obra da Odebrecht custou ao Brasil 125 milhões de dólares, 625 milhões de reais na cotação atual.


Lula aproveitou o encontro com Fernández para arrumar outras obrigações. Ele disse que vai procurar o FMI para defender seu colega argentino. "Eu pretendo conversar, através do meu ministro da Fazenda, com o FMI para tirar a faca do pescoço da Argentina. O FMI sabe como a Argentina se endividou, sabe para quem emprestou o dinheiro, portanto, não pode ficar pressionando um país que só quer crescer, gerar emprego e melhorar a vida do povo", ele disse.


Uma fala como esta revela um homem fixado num passado distante. Fico só esperando ele vir com a conversa do perdão às dívidas de países pobres ou do “Terceiro Mundo”, como esbravejava a esquerda nos anos 60 e 70 do século passado. Esse tipo de papo anacrônico vem voltando o tempo todo nas falas de Lula. Seria divertido assistir ao Lula e Haddad tentando convencer a diretoria do FMI a “tirar a faca do pescoço da Argentina”, de acordo com sua linguagem sofisticada. Talvez devessem levar o MST para ocupar este fundo improdutivo.


Pode até ter faca no pescoço nessa história, mas foi a Argentina que a colocou no próprio pescoço. Parece coisa de ficção a situação desastrosa da Argentina, que em grande parte tem sua origem nos governos do casal Kirchner, com dois mandatos do falecido marido de Cristina Kirchner, Néstor Kirchner, e mais dois dela, que atualmente ocupa a vice-presidência do país. Fernández era muito próximo do casal. Foi chefe de gabinete do marido de Néstor Kirchner. Hoje, ele e sua vice nem se falam.


A trágica situação tem lances até curiosos. O peso argentino vale tão pouco atualmente que os bancos não têm mais espaço para armazenar as cédulas. A inflação passa dos 100% ao ano. A cotação cambial está em 500 pesos para 1 dólar. O governo tem que emitir notas em tanta quantidade que esta impressão precisa ser feita no exterior. E tem até a ironia da dificuldade do governo para pagar esta impressão.


Uma solução para diminuir ao menos o desconforto do excesso de cédulas seria emitir notas de valor superior aos mil pesos — a mais alta que circula na Argentina. Porém, o governo acha que isso daria um sinal de que a inflação está fora de controle. Ah, bom.


Ainda assim, recentemente surgiu a notícia de que o governo pensa na emissão de uma nota de 10 mil pesos, que poderia ter a imagem do jogador Lionel Messi, uma “homenagem”, que, cá pra nós, não passaria pela cabeça nem dos torcedores que mais odeiam a seleção da Argentina.


Dados oficiais apontam 43,1% dos argentinos (19,8 milhões) abaixo da linha de pobreza. O cenário social é catastrófico, com famílias de argentinos tendo que morar nas ruas. O efeito político disso em um país com a população mais concentrada acaba sendo até pior do que em lugares — como sabemos bem — onde a miséria se esparrama amenizando, digamos assim, o cenário trágico.


Com um governo incompetente e de arrogância política que chega a ser risível, o país vai afundando. As reservas cambiais brutas estão no mais baixo patamar dos últimos anos. Suspeita-se que as reservas líquidas internacionais da Argentina estão abaixo de zero. Ou seja, nem é questão de raspar o cofre. Não tem nem raspa. O país de Alberto Fernández está sem dinheiro para pagar importações essenciais, o que explica a visita desesperada ao companheiro Lula.


Essa proposta de financiamento para a compra pelos argentinos de produtos do Brasil indica mais uma negociação política de Lula com dinheiro público dado a um governo amigo a fundo perdido. E o negócio deve ficar para ser resolvido depois, na Argentina, por um governo de oposição. Este governo acabou antes do fim do mandato. Fernández só não renuncia porque não tem dignidade. Ele já declarou que não é mais candidato à reeleição, desistência que tampouco é por honra, mas porque a derrota humilhante seria certa.


Terão de tentar inventar um engodo eleitoral, com um novo nome que o povo argentino engula. O esforço de Lula, por sinal, passa a impressão de interferência na eleição presidencial, em outubro. Tudo isso nada mais é que uma ajuda para que Fernández possa se revigorar para favorecer aliados. Até por defesa da própria imagem, muito parecida com este governo argentino que levou a Argentina a esta situação catastrófica, não interessa a Lula e seu partido que a oposição ao peronismo-kirchnerista seja vitoriosa.

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Por José Pires