segunda-feira, 28 de maio de 2012


domingo, 27 de maio de 2012


Chantagem proteladora

A denúncia publicada pela revista Veja desta semana é um dos fatos mais graves da nossa história recente, afinal não é sempre que um ministro do Supremo Tribunal Federal acusa publicamente um ex-presidente de chantageá-lo para adiar um julgamento importante. A revista traz uma matéria de capa com Gilmar Mendes afirmando que Lula fez pressão para o adiamento do julgamento do mensalão para além das eleições municipais.

A militância vai ter dificuldade para desmerecer a reportagem. A fonte da revista é o próprio chantageado, o ministro Gilmar Mendes, que já foi presidente do STF. Ele diz que num encontro há um mês no escritório do ex-ministro Nelson Jobim, Lula propôs o adiamento do julgamento do mensalão em troca de sua blindagem política na CPI do Cachoeira. Na conversa, Lula insinuou que o ministro do STF teria muito a perder na CPI sem a defesa da base aliada do governo do PT. E para dar exemplo do poderia comprometer Mendes, no encontro o ex-presidente fez alusão a uma viagem que o ministro do STF e o senador Demóstenes Torres teriam feito juntos para a Alemanha.

Nesta referência, Lula deu credibilidade a boatos de que a viagem dos dois teria sido paga pelo bicheiro Carlinhos Cachoeira. A boataria que procura envolver Gilmar Mendes com o bicheiro Cachoeira vem sendo propagada em sites e blogs usados para defender o governo e atacar a oposição. Muitos desses blogs têm farta propaganda paga do governo.

A Veja conta que na conversa no escritório de Nelson Jobim foi oferecida proteção por Lula. O ex-presidente disse que tinha o controle da CPI do Cachoeira e poderia evitar complicações para Gilmar Mendes, mas o ex-ministro disse a ele que fosse fundo na CPI. Sobre a viagem a Alemanha, Mendes confirmou o encontro em Berlim com o senador Demóstenes Torres, mas disse ao ex-presidente que pagou as despesas de seu bolso. “Vou a Berlim como você vai a São Bernardo. Minha filha mora lá”, disse ele a Lula.

É claro que todo mundo quer saber a opinião de Lula sobre a denúncia, mas ele sumiu do mesmo modo que faz toda vez que surge maracutaia envolvendo o seu nome. Antes de publicar a reportagem a revista já havia tentado entrevistá-lo para ouvir sua versão, mas ele se negou a falar sobre o assunto.

Já pelo lado do ministro Gilmar Mendes a reportagem da Veja recebeu confirmação no mesmo dia em que a revista saiu às bancas. Ontem perguntaram ao ministro do STF se o que estava na Veja era tudo verdade e sua resposta foi a seguinte: “Claro que é! Eu mesmo confirmei tudo à revista”.
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POR José Pires

Um mensalão no meio do caminho

“Tenho convicção de que, se não fosse o mensalão, Dirceu seria o próximo presidente da República. Ele era o homem mais preparado para ser o presidente naquele momento. E não há nada contra ele, tecnicamente”.

A frase é de Antonio Carlos Almeida Castro, chamado até na imprensa de Kakay. A intimidade do apelido combina muito bem em um advogado tão de dentro do poder. Ele é o advogado de José Dirceu no processo do mensalão, além de ser seu amigo bem próximo. Almeida Castro, ou melhor, Kakay é também advogado do senador Demóstenes Torres.

Sua frase pode ter outra leitura, além do significado pretérito e condicional que dá um tom de sonhos desfeitos por uma injustiça. Dirceu, o homem que era chamado por Lula na Presidência de "meu capitão" e que no processo do mensalão é apontado pela Procuradoria-Geral da República como "chefe da quadrilha" será candidatíssimo à presidente do Brasil se derem certo os planos para sua absolvição no STF.
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POR José Pires

Ligando os pontos

Lembram daquele brincadeira de ligar os pontos que vinha em revistas da nossa infância? Na política e nos negócios também podem ser revelados panoramas interessantes quando ligamos os pontos.

Vamos lá então, de caneta na mão. Em março deste ano Henrique Meirelles foi nomeado presidente do conselho de administração da J&F, holding de empresas que controla o frigorífico JBS, o maior frigorífico do mundo. No Brasil, o JBS vem esmagando pequenos frigoríficos pelo país afora e tomando conta do mercado com uma voracidade que o governo faz de conta que não vê. Mas, sigamos ligando os pontos.

Henrique Meirelles foi o presidente do BC com mais tempo no cargo na história da instituição. Reinou de 2003 a 2010, durante os dois governos de Lula. Hoje o BC é presidido por Alexandre Tombini, que foi o braço direito de Meirelles na sua gestão.

As negociações para a contratação de Meirelles pelo Grupo JBS ocorreram em 2011, ao longo do período de quarentena imposto legalmente ao mais longevo presidente do BC. A força econômica do JBS vem de um imenso apoio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que hoje é o maior sócio do frigorífico.

O banco estatal tem mais de um terço de participação na empresa. Desde 2007 o BC já liberou 8,1 bilhões em quatro operações com o JBS e também entrou com dinheiro em outras empresas do holding presidido por Meirelles, como o financiamento de R$ 2,7 bilhões para a Eldorado Celulose e Papel.

José Batista Júnior é o dono do Grupo JBS. A empresa começou em 1953 de um pequeno açougue, em Anápolis, Goiás, e hoje domina um setor altamente estratégico da nossa balança comercial.

Mas, Batista Júnior tem interesse também na política. Lá em Goiás, ele é vice-presidente do PSB, partido que sempre foi da base aliada do governo petista. Ele pretende ser candidato ao governo estadual em 2014. E por coincidência, Meirelles também é de Goiás.

E sigamos ligando os pontos. Já demonstrei aqui que o atual quadro político do estado de Goiás faz muito mal ao fígado do ex-presidente Lula. O permanente chefão petista quer a destruição do governador Marconi Perillo (PSDB), principalmente porque lá atrás o político goiano afirmou que Lula sempre soube do mensalão.

Movido pelo fígado, Lula ordenou aos seus aliados a abertura da CPI do Cachoeira, um desatino político que fez surgir nas manchetes uma empresa muito poderosa, que até então era conhecida apenas nos bastidores das lucrativas empreitadas de obras públicas. Trata-se da empreiteira Delta Construções, empresa com vasta lista de obras do governo federal, que vem desde o governo Lula.

A Delta não tinha ex-presidente do Banco Central no comando, mas com o anúncio da CPI do Cachoeira começaram a surgir evidências de que nem precisou disso para ter um imenso crescimento. Desde 2007 ela é a empresa que mais recebe verbas orçamentárias do Executivo. Já surgem até boatos de que o interesse de Lula na empresa não é só político. Mas, enfim, os escândalos tornaram a Delta um problema político e administrativo para o governo do PT, de tal forma que para amenizar os estragos políticos e dar continuidade às obras públicas era obrigatório sua venda para outra empresa.

E aqui concluimos a ligação dos pontos: a Delta foi comprada pelo Grupo JBS.
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POR José Pires


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Imagem: Lula e Meirelles, quando trabalhavam juntos oficialmente.


segunda-feira, 21 de maio de 2012


Na onda do marketing

Em entrevista ontem ao jornal O Globo o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, diz o seguinte: “O BC está 200% preparado para reagir". Como jornalista brasileiro é danado para dar título que não confere com o conteúdo da matéria, fui até a entrevista e vi que ele falou mesmo esta bobagem. Quando a gente vê presidente do Banco Central falando com linguagem de vereador picareta, não há como não ficar preocupado. Um economista com esta cifra louca de “200%” também é outra coisa que não pode dar segurança a ninguém.

Li toda a entrevista do Tombini com um esforço danado, pois não é só os “200%” (vindo de um economista, isto merece um sic) do título que parece conversa de marqueteiro. O presidente do Banco Central fala como se fosse um vendedor de livros de auto ajuda. Em alguns momentos até parece o Paulo Coelho afirmando que é possível fazer chover no deserto com a força da mente.

Querem ver outra dele? Do Tombini, não do Coelho. Pois lá pelo meio do papo com o jornalista, quando já estamos até pensando em pedir um uísque já que a crise mundial está tão fácil de encarar , ele vem com essa: “É sempre uma boa filosofia esperar o melhor e se preparar para o pior”.

Uma conversa dessas seria espantosa até num boteco (ou saindo da boca do Coelho), mas o aforisma preocupa ainda mais porque Tombini está se referindo à crise que assola a Europa e está fazendo até economista alemão tremer quando fala no assunto.

Ah, Tombini, Tombini, se o Brasil tomba, pelo menos esse nome vai facilitar a piada. Isso não é filosofia. É só uma frase boboca e com o sentido inverso. Como é que alguém que espera o melhor pode se preparar para o pior? Tenho cá pra mim que uma frase dessas saiu de reunião de criação com marqueteiro.

Porém, não é exclusidade do presidente do Banco Central esta confusão conceitual sobre o enfrentamento dos evidentes problemas que vêm por aí mesmo que a Europa não afunde num abismo. Às vezes eu tenho a impressão de que o Brasil está sendo dirigido pelo João Santana, o marqueteiro do Lula e da Dilma. Como o PT resolveu administrar o país com o olho no ciclo de dois anos entre as eleições municipais e a eleição federal, botaram em primeiro plano o marketing do otimismo. Mas já faz tempo que eles não vêm sabendo fazer a separação entre a propaganda política e a administração do país.

Então, o marketing contaminou primeiro a linguagem dos políticos e depois passou para os quadros administrativos do governo. O contágio foi geral e hoje temos até técnicos embalados pelo marketing e fazendo análises que mais parecem jingle publicitário. E deu nisso: no meio de uma grave crise mundial temos um presidente do Banco Central que dá entrevista falando igual vereador picareta.
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POR José Pires

domingo, 20 de maio de 2012

Parceria blindada

Jornalistas do SBT flagram o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP) enviando uma mensagem ao governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB), durante reunião da CPI do Cachoeira. A mensagem do deputado petista: ""A relação com o PMDB vai azedar na CPI. Mas não se preocupe, você é nosso e nós somos teu [sic]".

Vaccarezza, que já foi líder do governo Lula e de Dilma na Câmara e hoje é líder da bancada do PT, apenas revelou sem querer e de forma explícita como tem se comportado este partido que antes de chegar ao poder era sempre o mais entusiasmado com CPIs. Toda a base do governo Dilma Rousseff, tendo a liderança nos bastidores do ex-presidente Lula, atua para blindar políticos envolvidos em negócios ligados ao bicheiro, para evitar que haja investigação séria da corrupção.

Antes de ter o poder o PT acusava a feitura de pizzas em qualquer CPI. Agora os petistas têm até receita própria e o forno do partido está sempre aceso para suas pizzas.
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POR José Pires


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Imagem: Isso que é revolução na política: o PT inaugura a falta de decoro via celular.




Quem foi que disse que o Brasil está se desindustralizando? A indústria da seca no Nordeste continua em atividade intensa.


Parceria oportuna

O PT encontrou o parceiro ideal para os ataques que o partido vem fazendo à imprensa: Fernando Collor, agora senador e ex-presidente que saiu corrido do Palácio do Planalto exatamente porque a imprensa cumpriu de forma correta seu papel de informar.

E agora que estão juntos, o PT e Collor deviam esclarecer alguns fatos da época em que eram inimigos. Podiam começar explicando para os brasileiros a que se referia Collor na eleição de 1989 quando falava do "aparelho de som" de Lula.
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POR José Pires


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Imagem: Num dos debates em que Lula amarelou, os dois agressivos adversários que depois viraram aliados bem próximos.


quarta-feira, 16 de maio de 2012

Verdades que precisam ser contadas

A Comissão da Verdade foi instalada e me chama atenção uma foto publicada na internet, que traz à esquerda da imagem Marco Aurélio Garcia, o assessor especial para assuntos internacionais da presidente Dilma Rousseff e que ocupou o mesmo cargo nos dois governos de Lula.

Como a comissão traz a palavra verdade no nome, creio que cabe lembrar aqui algumas verdades. Nem vou buscar saber o que é que Garcia faz no meio do grupo de ex-presidentes que chega para a instalação da comissão. Mas a presença dele me trouxe algumas lembranças que fui conferir nos livros que tenho sobre a época da luta armada no Brasil.

Em 1971, com o desmantelamento dos grupos de esquerda que faziam a luta armada no Brasil vários de seus componentes correram para o Chile, o que foi uma desgraça para o governo de Salvador Allende. O presidente chileno, que acabou sendo derrubado por um golpe militar em setembro de 73, já tinha muitos problemas internos causados pela extrema esquerda chilena. Receber esta leva de brasileiros em fuga de seu país depois da tentativa de tomar o poder pelas armas só ajudaria a engrossar as fileiras da militância extremista chilena que tinha dificuldade em aceitar o pragmatismo político exigido na situação do Chile.

Um dos movimentos mais radicais era o MIR chileno, dito Movimiento de Izquierda Revolucionária. O MIR aprontava ações extremistas o tempo todo, criando um clima político que fortalecia o golpismo da direita chilena e dos militares. Este MIR é o mesmo que depois veio ao Brasil fazer o sequestro de Abílio Diniz exatamente na época da nossa primeira eleição direta para presidente, em 1989. Mesmo dizendo-se prejudicado pela ação, o PT estranhamente sempre tratou com a maior solidariedade os sequestradores, que depois foram presos. Esta é uma daquelas histórias do PT que jamais foram bem explicadas.

Mas, voltando às ações do MIR, vários participantes brasileiros da luta armada foram se incorporar a esta organização extremista no Chile, depois de saírem corridos do Brasil. Ou seja, como se não bastassem os problemas criados por eles para a oposição democrática em seu país, os extremistas brasileiros foram se meter nas questões internas do Chile, que vivia então um período altamente crítico, tão grave que teve como consequência o sangrento golpe militar comandado pelo general Augusto Pinochet.

Pois Marco Aurélio Garcia foi um dos brasileiros que se incorporaram ao MIR. Sabe-se pouco o que ele aprontou por lá, mas o que ficou claro é que ele e seus companheiros do MIR eram apenas bravateiros que bagunçavam no governo de Allende, pois não mostraram capacidade militar alguma para a resistência ao golpe que acabou acontecendo.

A presença de Marco Aurélio Garcia na instalação daComissão da Verdade reforça, portanto, este significado de que a credibilidade da comissão depende da investigação profunda de todos os lados dessa página muito ruim da nossa história. Direita e esquerda cometeram excessos e também seus crimes, que não podemos analisar apenas tendo em vista a violência de fato, mas também em relação à violência contra a democracia no Brasil, que acabaria sendo vitimada caso houvesse a vitória da luta armada de esquerda.
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POR José Pires


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Imagem: Na instalação da Comissão da Verdade, Marco Aurélio Garcia e a presidente Dilma Roussseff, dois participantes da luta armada num período de trevas do país. A foto foi distribuída pela comunicação da Presidência da República.


Da verdade mesmo?

Sempre foi muito elogiado no Brasil o trabalho da comissão que produziu o Relatório Nunca Mais, com o resultado da investigação sobre desaparecidos políticos na Argentina e os crimes da ditadura militar. O relatório foi concluído em setembro de 1984 e é realmente muito bom, até porque a comissão era presidida por Ernesto Sábato (1911-2011), grande escritor e um homem que conseguia manter em conjunto com sua posição de esquerda o respeito pela democracia.

A investigação da comissão foi exemplar, mesmo sendo indiscutível que os problemas políticos e a violência na Argentina sempre foram bem mais graves e de uma complexidade impossível de comparar com o que houve no Brasil.

Mas cabe lembrar algo que nunca foi destacado no Brasil, que o relatório produzido na Argentina deixa claro logo no primeiro parágrafo de sua apresentação que o terror vivido na Argentina era produzido tanto pela extrema direita quanto pela extrema esquerda. Para ser ainda mais preciso no que estou falando, cabe também dizer que no Brasil a extrema esquerda era representada pelos grupos que promoveram a luta armada. E esta luta armada nunca teve como objetivo o estabelecimento de uma democracia por aqui.

Diz o Relatório Nunca Mais argentino em seu primeiro parágrafo: “Durante a década de 70 a Argentina foi convulsionada por um terror que vinha tanto da extrema esquerda como da extrema direita, fenômeno ocorrido em muitos outros países”.

Ainda neste primeiro parágrafo, o relatório produzido pela comissão presidida por Sábato lembra a luta entre o terror de esquerda e as forças policiais na Itália, também na década de 70, e que culminou com o sequestro de Aldo Moro. O relatório cita um diálogo entre o general Carlo Alberto Dalla Chiesa e um membro dos serviços de segurança, que propunha torturar um detido que parecia saber muito. Dalla Chiesa, que era o chefe dos “carabinieri” que combatiam o terrorismo, disse o seguinte: “A Itália pode permitir-se a perder Aldo Moro. Mas não, em troca, implantar a tortura”. Dalla Chiesa comandou a derrota do terrorismo na Itália, porém depois foi morto pela máfia.

O terrorista Cesare Battisti participou deste triste período na Itália, quando praticou vários crimes, inclusive assassinatos, sendo por isso condenado à prisão. Pois ele fugiu para o Brasil e aqui foi acolhido como herói pelo governo do PT e muitos dos que hoje aplaudem a instalação da Comissão da Verdade. Bem, o que se espera é que esta comissão também não aponte para heróis errados.
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POR José Pires


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Imagem: O escritor Ernesto Sábato entre o Relatório Nunca Mais para o então presidente argentino Raul Alfonsín.


terça-feira, 15 de maio de 2012

No coração das trevas mexicanas

Mesmo o enlouquecido Kurtz, de “No coração das trevas”, acharia demais o que está acontecendo atualmente no México. Kurtz é o personagem criado por Joseph Conrad (1857-1924) neste que é um dos mais conhecidos romances da literatura mundial. O livro também virou o filme de sucesso dirigido por Francis Ford Coppola. No livro, Kurtz é um comerciante de marfim que pratica atrocidades no antigo Congo Belga, na África. No filme de Coppola o personagem é um coronel do exército americano que domina pelo terror um território perdido no meio nas selvas do Vietnã. No livro e no filme é bem marcante a fala final de Kurtz — “O horror! O horror!” — expressando a desgraça que pode nascer das mãos dos homens.

A situação vivida hoje no México é de arrepiar até um Kurtz. Os narcotraficantes e as milícias espalham o terror numa vasta região próxima da fronteira com os Estados Unidos. Neste domingo foram encontrados 48 corpos mutilados. Antes disso, no início deste mês foram 23 os mortos, 9 deles pendurados em um viaduto na cidade de Nuevo Laredo, no nordeste do país.

A mortandade do domingo é tida como resultado de acerto de gangues do tráfico. A extrema violência funciona como avisos atemorizadores entre eles, mas as atrocidades são de tal nível que nada mais deve espantar ninguém. Já estive pesquisando este assunto na internet e vi cenas horrorosas. Os bandidos filmam em vídeo as atrocidades, que são disponibilizadas na rede, sempre como um meio de botar medo nos inimigos. Pode-se ver cenas de espancamentos, tortura e até degolamento. Um dos vídeos mais absurdos mostra duas pessoas sendo interrogadas e dando um depoimento com um aviso a seu bando, para depois serem mortas, uma delas assassinada com uma motosserra.

É o horror, o horror, como já disse Kurtz. Uma grande porção do México virou um território desumanizado. O site do jornal O Globo traz hoje a informação da organização Ação Cidadã do México de que ao menos 71% dos municípios do país, principalmente no Norte, estão sob o controle dos cartéis de drogas.

A matéria conta também que a violência tem atingido jornalistas e isso vem sendo feito de forma deliberada para calar a imprensa. Os jornalistas são encontrados mortos com marcas de torturas, feitas evidentemente como forma de amedrontar todos os profissionais. E é claro que os bandidos estão conseguindo com isso calar a imprensa.

Um jornal de Nuevo Laredo, o “El Mañana”, publicou um editorial no domingo anunciando que deixará de publicar qualquer notícia sobre a violência na cidade e em qualquer outro lugar do país. E Nuevo Laredo não é uma cidadezinha qualquer. Sua zona metropolitana tem cerca de 600 mil habitantes e ela fica grudada na fronteira do Texas. O jornal sofreu na semana passada um atentado com tiros e explosivos. Embora sem vítimas neste atentado, os bandidos conseguiram acabar com a liberdade de imprensa.
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POR José Pires


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Imagem: A cidade mexicana de Nuevo Laredo, grudada na fronteira dos Estados Unidos


terça-feira, 8 de maio de 2012

Mão pesada

Deixa eu ver se entendi. Primeiro o país debate o Código Florestal durante meses, com a participação de todas as instituições interessadas e a intensa cobertura da imprensa, que produz entrevistas, debates, reportagens, dando espaço às mais variadas opiniões. Este assunto também vai para a internet e nas redes sociais é discutido com rigor. E no Congresso Nacional, que manteve também a discussão aberta a todos os cidadãos, é finalmente votada a lei.

E aí, depois de tudo isso, fazem uma campanha nacional pedindo um ato de força da presidente da República.

Se é para resolver dessa forma, não seria mais prático colocar um ditador lá em cima?
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POR José Pires

Ampliando os negócios

Para que serve um partido político? Para a direção nacional do PHS pode muito bem servir para ser usado como uma dessas escolas picaretas de formação profissional que tem tanto no país. Os dirigentes nacionais do partido estão forçando os diretórios municipais a adquirir um curso de formação política. Uma resolução interna do partido obriga a compra sob pena de intervenção no diretório. O preço de um único DVD do curso varia de R$ 3 mil a R$ 25 mil, dependendo do tamanho do município.

A resolução que força a compra do material é um documento histórico do estado a que chegaram os partidos políticos no Brasil. Na última frase a direção dá o aviso em tom de ameaça de que a resolução "será devidamente encaminhada para registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE)”.

Faz sentido. Como partido de aluguel que sempre foi, o PHS está apenas diversificando seus serviços.
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POR José Pires

sábado, 5 de maio de 2012

Espanha por baixo

No lloren por España. A crise por lá é braba. De passagem pela Argentina acompanhado do colega Joan Manuel Serrat, o cantor Joaquin Sabina definiu bem do seu jeito a situação em seu país: “España está como el culo”. Acho que não precisa traduzir, não é?

A situação está mesmo feia na Espanha mas ninguém precisa chorar por eles porque o espanhol vem encarando sem subterfúgios a crise, com a sinceridade que dá pra notar na fala de Sabina. Isso é importante para atacar qualquer problema e indispensável quando é uma questão coletiva.

O El País publicou a fala de Sabina do jeito que está aqui. Não atenuou sua definição dura com eufemismos, como se faz num país que vocês devem conhecer bem, onde quando se fala em crise é só para dizer que nós somos melhores que o resto do mundo.

Não chorem também pela Espanha porque eles mantêm uma cultura forte, vibrante, da qual Serrat e Sabina (vou falar deles acima) são dois bons exemplos na área da música. A Espanha é um país de valores culturais fortes. E um país assim não tem crise que passe por cima.
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POR José Pires


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Imagem: O cantor espanhol Joaquin Sabina fala claro sobre a situação de seu país.


sexta-feira, 4 de maio de 2012

Sem mudanças de código algum

É patético o apelo que corre pela internet para que a presidente Dilma Roussef vete o Código Florestal. Além da ingenuidade da falta de percepção de que haverá de fato alguns vetos que já fazem parte de um jogo político premeditado, acho também muito triste este apelo a gestos de força do Executivo que aparece toda vez que o Legislativo não atende a interesses deste ou daquele setor.

Vejo o Código Florestal também sendo superestimado no debate ecológico no Brasil. O problema do país é a falta de atitudes práticas na área, inclusive no planejamento e na criação de estruturas de qualidade para a exploração dos nossos recursos naturais. E para a defesa da nossa natureza e o melhor uso dos nossos recursos existem leis às pencas, sobre as quais não existe fiscalização e muito menos a ação da Justiça.

Mesmo se fizessem um novo Código Florestal com defesas perfeitas do meio ambiente brasileiro, o efeito seria o mesmo do Código anterior, que aliás tem boas regras: nenhum. Não adianta criar leis no Brasil se não houver uma mudança do hábito de não aplicá-la de fato.
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POR José Pires

Zero à esquerda em história

Está rodando pela internet esta propaganda política da presidente Dilma Rousseff. Como sou vidrado em debater conceitos de linguagem, tenho que alertar para a grande mentira que é esta propaganda. E sendo a peça de um reducionismo tolo, vai ser em dois toques:

1 - Dilma não plantou liberdade e nem pretendia isso. O que ela pretendia plantar quando fez a luta armada era uma ditadura de esquerda, cuja ideologia variou, conforme os rachas que os grupos foram tendo. Ora eram castristas, ora maoístas, mas sempre com o objetivo de implantar no Brasil uma ditadura comunista.

2 - Se estamos colhendo a democracia é em razão dos brasileiros que faziam a oposição democrática ao regime militar e não aos que estavam com armas na mão e idéias totalitárias na cabeça, que é o caso de Dilma naquela época.
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POR José Pires

quinta-feira, 3 de maio de 2012

A farra de Paris em números

Diz a filosofia que a felicidade pode vir de várias fontes. Mas o caminho para compreender a satisfação de um político é muito simples e nada tem de metafísico. Siga o dinheiro.

Uma olhada nas obras públicas tocadas pela Delta pode ajudar bastante a entender a eufórica festa em Paris, a famosa farra que juntou o governador Sérgio Cabral e seus secretários, acompanhados por Fernando Cavendish, dono da empreiteira Delta. E os negócios com o governo federal podem também ser úteis para entender até os que curtem com mais discrição sua felicidade.

Só no ano passado, a Delta recebeu do governo Dilma Rousseff R$ 884,4 milhões. Mas o crescimento dá altos saltos desde a posse de Lula no primeiro mandato, até atingir uma dinheirama no período próximo à eleição de Dilma. O jornal O Globo fez uma boa tabela, que publico mais abaixo.

A empreiteira de Fernando Cavendish — que o PT quer ver longe da CPI do Cachoeira — é a maior tocadora de obas do PAC. Só neste ano a Delta já recebeu R$ 156 milhões deste programa de obras referencial do governo de Lula e de Dilma.

O Globo conta que de 2007 a 2010 a Delta teve um crescimento de 533% no governo Cabral. Foi de R$ 67,2 milhões, em 2007, para R$ 554,8 milhões, sendo R$ 127,3 milhões sem licitação. Isso mesmo: sem licitação. E este foi o ano em que Cabral foi reeleito.

Não é difícil entender a extrema alegria dos convivas cariocas de Fernando Cavendish. Mas o numerário altíssimo da Delta também com o governo do PT revela que não seria estranho se Lula também tivesse comparecido à farra de Paris. Mas deixa pra lá. Ele deve ter feito sua festa em outro lugar.


TOTAL PAGO À DELTA PELO GOVERNO FEDERAL
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2001 - 41.417.900,03
2002 - 50.466.834,10
2003 - 38.686.405,79
2004 - 104.889.814,48
2005 - 156.442,946.21
2006 - 255.644.101,21
2007 - 401.225.812,02
2008 - 393.729.451,38
2009 - 788.880.632,68
2010 - 769.117.786,91
2011 - 884.497.209,00
2012 - 156.894.898,90*
* Valor pago até o dia 11/04

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CONTRATOS DA DELTA COM O GOVERNO DO RIO 
___________________
2001 - R$ 47 milhões
2002 - R$ 61,8 milhões
2003 - R$ 15,1 milhões
2004 - R$ 76,1 milhões
2005 - R$ 142,8 milhões
2006 - R$ 163,9 milhões
2007 - R$ 67,2 milhões
2008 - R$ 126,8 milhões
2009 - R$ 243,4 milhões
2010 - R$ 554,8 milhões
2011 - R$ 358,5 milhões
2012 - 138,4 milhões*
* Valor empenhado até 11 de abril
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POR José Pires

A proliferação do mensalão

O mensalão organizado no centro do governo Lula e de seu partido foi esquematizado para que o governo tivesse o domínio total sobre as votações no Congresso Nacional. Mais que corrupção, o sucesso do mensalão seria a ruína da democracia, um sistema que no Brasil nunca foi dos mais sólidos.

Por sorte ocorreu o desacordo interno na quadrilha, com as variadas denúncias que resultaram na intervenção da Procuradoria-Geral da República e o inquérito que será julgado no Supremo Tribunal Federal (STF).

Porém, enquanto não vem punição, o mau exemplo de altas autoridades do governo do PT se espalhou por prefeituras de todo o país, onde vigora um domínio do Executivo sobre o Legislativo com a compra de votos de vereadores por meio de privilégios bancados com dinheiro público ou até mesmo o pagamento em espécie.

Em Londrina, no Paraná, o Ministério Público denunciou um esquema de suborno de vereadores para impedir que a Câmara Municipal investigue atividades do prefeito Barbosa Neto (PDT) suspeitas de ilegalidade. É o MENSALON, como já escrevi aqui.

Em Londrina, serão indiciados pelo MP por corrupção ativa cinco pessoas, que já estão presas, entre elas um vereador, um amigo de Barbosa Neto e um ex-secretário municipal, que havia se desincompatibilizado do cargo recentemente para cuidar da campanha de releeição do prefeito. Na cidade, o Ministério Público flagrou a tentativa de suborno de um vereador para que ele votasse contra a instalação de uma Comissão Processante que pode levar à cassação do prefeito.

A pronta ação do Ministério Público Paranaense pode desmontar a planejada construção do mensalão de Londrina, o MENSALON. Mas um perigo maior ameaça os nossos municípios se os mensaleiros federais forem inocentados pelo STF: essa impunidade pode acenar aos prefeitos brasileiros que está liberada a compra de votos em todo o território nacional.
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POR José Pires


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Imagem: O logotipo do MENSALON, o esquema de subornos de Londrina, numa versão vermelha para simbolizar o exemplo que veio de cima


quarta-feira, 2 de maio de 2012


Festa em Paris

O jornal Extra, do Rio de Janeiro, é conhecido por fazer capas muito boas usando humor. A de ontem, Dia do trabalho, acertou em cheio na relação da situação lamentável dos trabalhadores no país com a farra dos políticos brasileiros. A foto da farra do secretário de Saúde em Paris é uma das imagens de vídeos que vêm sendo publicadas, de festas de autoridades do governo Rio de Janeiro, em 2009 em Paris, com a presença do empresário empreiteiro Fernando Cavendish, dono da Delta, empresa envolvida com o bicheiro Carlinhos Cachoeira.

A farra teve a presença de secretários estaduais e também do governador Sérgio Cabral (PMDB). O grupo esteve em restaurantes caríssimos de Paris, como o Le Louis XV-Alain Ducasse e o L’Espadon, do Hotel Ritz, um dos mais caros da Europa. Uma frase dita num dos vídeos dá a entender que eles estiveram também jogando em cassinos. E adivinhe quem pagou a conta? Na eufórica festa o governador fazia piadas em meio às encenações filmadas pelo celular de um misterioso conviva.

Numa das cenas, enquanto dois dos colegas faziam micagens para a câmara, Sérgio Cabral diz: "Então, dá um beijo na boca, vocês dois". Noutra cena, o governador diz para a mulher de Cavendish, que está sendo filmada: "Abre essa boca aí".

É impressionante a intimidade entre o governador e o dono da Delta, empreiteira que investigações da Polícia Federal mostram como financiadora de empresas fantasmas criadas pelo bicheiro Carlinhos Cachoeira.

As imagens explicam bem as desesperadas tentativas da base aliada do governo do PT para tirar a empreiteira Delta da mira da CPI do Cachoeira. Cavendish transita entre vários poderosos políticos brasileiros com a mesma intimidade que mostra na festa com o governador do Rio.

Sua empreiteira, a Delta, tem negócios com outros governos e muitas obras também com o governo de Dilma Rousseff, assim como teve com Lula. A festa é geral. E não podemos esquecer também que Cabral é aliado de primeira hora do PT, sempre trocando abraços em festas públicas com Lula e com a presidente Dilma Rousseff.
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POR José Pires

O jogo dos juros

A queda de juros é o bode na sala do governo do PT. Estão lucrando políticamente com a baixíssima queda nos juros e olha que nem foi preciso tirar o bode da sala. Como propaganda política foi possível até encenar a baixa que os banqueiros deram por conta própria. É óbvio que isso é efeito de um acordo político com o governo, mas parece que a presidente Dilma Rousseff está conseguindo passar a imagem de que foi resultado da força de seu governo.

O Brasil ainda está com os juros lá em cima. Está em segundo lugar no mundo, perdendo só para Rússia. E os bancos estão muito felizes em solo brasileiro, até porque banqueiro não lucra só com os juros. O Brasil tem taxas de serviços de banco que em países decentes seria um escândalo se fossem cobradas, ainda mais nos altos níveis daqui.

O ranking em que o Brasil é vice-campeão de juros tem apenas 40 países. Na campeã Rússia o juro real é de 4,2% e no vice Brasil o índice é 3,,4%. Para se ter uma idéia de como os juros são altos por aqui, no Chile é de 1,2%. Na Colômbia é 1,8%. E no México é de 0,7%.
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POR José Pires


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Imagem: Nossa equipe de arte de um só mostra no gráfico que o bode dos juros altos continua na sala.


Sinais vermelhos na natureza

Acho que todos conhecem o lambari. É um peixe pequeno, muito simples, que fez parte da infância de muita gente do interior que hoje tem mais de quarenta anos. Na minha infância nadávamos entre eles em rios do entorno de Londrina, a cidade paranaense em que vivi até os 15 anos. Esses peixes podiam ser pegos até com peneira, depois de acuados no canto de um barranco.

O lambari é uma espécie em ameaça de extinção. O coitado está lá embaixo na cadeia alimentar. É comido por peixes maiores, usado como isca por pescadores e ainda fritado aos montes. Mas não é por isso que foi se acabando. Hoje em dia não é possível nadar em rio algum em volta da cidade, tomados que estão por poluição de todo tipo, inclusive a da carga brutal de agrotóxicos lançada sobre as lavouras, que escorre para as águas antes cheias de vida.

Outros peixes e bichos vão se extinguindo ou pelo menos ficando tão difíceis de encontrar que é mesmo como se não mais existissem. E isso vem acontecendo no país todo, uma terra em que até pouco tempo atrás a natureza nos envolvia até nas cidades.

Roberto Muylaert Tinoco tem um livro muito bonito de nome "Os duendes de seis patas e a cidade mutante", uma das obras mais especiais que já li não só pelo que vale para a ecologia, mas também por revelar a felicidade e a magia que a natureza traz para a gente no cotidiano. É um livro sobre sua infância na cidade de São Paulo, onde, na década de 50, colecionava e estudava besouros e borboletas.

Ele conta que em meados da década de 50 capturava no bairro de Pinheiros borboletas hoje raríssimas até nas matas. Ele diz que fazia o mesmo em Santo Amaro, no Brooklin, e em tantos outros bairros da cidade. É claro que essas borboletas e besouros já não estavam mais ali, quando fui morar no final da década de 70 em Pinheiros.

Não estão tão longe assim as recordações paulistanas que Muylaert Tinoco traz nesse livro tão belo e os fatos que eu lembro da minha infância no meio do mato, no norte do Paraná. No meu caso, não é nem a metade da vida de uma pessoa num país decente. E não é nada se este período for encaixado em um ciclo ecológico.

Em menos de quarenta anos perdemos muita vida e muita beleza. Na água que podia ser bebida com as mãos não se pode nem tocar o corpo. Hoje em dia nem é preciso ler os relatórios dos organismos internacionais para saber do tamanho da nossa desgraça. Basta dar um passeio a pé levando na cabeça a memória do que vivemos e observar com os nossos próprios olhos como as coisas estão agora. Os avisos de perigo estão por todo lado.
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POR José Pires