sábado, 4 de fevereiro de 2023

Alexandre de Moraes, senador Marcos do Val, Jair Bolsonaro: quem é quem no plano golpista de estilo "tabajara"?

O ministro do STF, Alexandre de Moraes, confirmou as informações reveladas pela revista Veja sobre o encontro com o senador Marcos do Val, no Supremo Tribunal Federal. Durante a reunião, o senador bolsonarista levou informações sobre a existência de um plano de gravar conversas com Moraes, procurando comprometê-lo negativamente. A ação ilegal estaria sendo arquitetada pelo então presidente Jair Bolsonaro com a ajuda do então deputado Daniel Silveira. A ideia seria com isso retirar o ministro da relatoria de inquéritos do STF, como os que apuram as “fake news” e os “atos antidemocráticos”. Segundo a revista, os conspiradores iriam “usar o material num golpe de Estado”.


Moraes falou sobre o assunto nesta sexta-feira durante palestra na Brazil Conference, do Lide, em Lisboa. Outros ministros do STF participaram do evento. Há cerca de dois meses, os juízes estavam também em Nova York, com tudo pago pela mesma empresa de lobby. Em um país com um sistema judiciário sério, não creio que seria aceitável esta presença de magistrados da mais alta corte fazendo discursos com teor político, em certos casos até fora dos seus deveres de cargo, mas, enfim, isto é Brasil.


Na palestra do Lide, Moraes chamou o plano golpista de “tentativa de operação tabajara”, a partir da extrema dificuldade de execução, que torna mesmo a ideia meio cômica. O ministro explicou o plano dessa forma: “A ideia genial que tiveram foi colocar escuta no senador, para que ele, que não tem nenhuma intimidade comigo, eu conversei exatamente três vezes com esse senador, pudesse me gravar”.


Tudo bem, até pode ser um método “tabajara”. No entanto, a reação de Moraes ao teor da conversa do senador, que trazia uma informação com o objetivo de golpe de Estado, não faz dele um observador de fora da cena, totalmente desobrigado de qualquer responsabilidade. Foi surpreendentemente singela a explicação do severo ministro relator de importantes inquéritos, além de presidente do TSE altamente rigoroso na última eleição, até agora tratada por ele com mão pesada.


Segundo suas palavras, a conversa terminou quando o senador se negou a passar o relato para um depoimento no papel, alegando que era “uma questão de inteligência” para ficar em segredo. “Eu me levantei, me despedi do senador, agradeci a presença, até porque até porque o que não é oficial, para mim não existe”, afirma o ministro.


Claro, muito normal. Uma alta autoridade brasileira fica sabendo de uma conspiração de golpe de Estado para anular uma decisão eleitoral na eleição de um presidente da República, com o uso de gravação ilegal de um alto magistrado, mas como o denunciante não quer “oficializar” a informação, então Moraes deixa o assunto pra lá.


Essas histórias de Marcos do Val trazem várias contradições. Ele próprio já tentou desfazer algumas das coisas que disse, porém manteve a afirmação de que Alexandre de Moraes o orientou para a conversa com Bolsonaro. Isso faz da sua versão muito mais que uma rápida conversa num salão do STF. É uma denúncia grave, implicando um ministro do STF na orientação para a espionagem — ou "ação de inteligência”, como diz o senador — de uma conversa reservada com um presidente da República — Bolsonaro era presidente na ocasião e não “ex-presidente”, como tem saído erradamente nas reportagens. Na reunião que segundo do Val foi estimulada por Moraes, é preciso dizer que estava embutida uma provocação, não no sentido jurídico, mas na pior acepção da palavra: de incentivar um plano político fora da legalidade.


Ora, qualquer autoridade que obtivesse informação sobre algo parecido teria a obrigação de rapidamente agir para sustar o plano e não de orientar para que prosseguisse, na tentativa de ver no que daria. No que foi contado por do Val, ele afirma categoricamente que relatou ao ministro Alexandre de Moraes que detinha a informação sobre a tentativa de golpe contra a democracia, com a possibilidade da participação de um presidente da República. Pode ser aceitável a classificação desse plano como “tabajara”, mas do modo que tudo aconteceu, teria que haver a inclusão do ministro do STF e não só no sentido de piada.

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Por José Pires

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