terça-feira, 24 de janeiro de 2023

As encrencas e trapaças do futebol brasileiro

Houve um tempo em que o futebol foi motivo de orgulho para os brasileiros, tornando-se uma referência internacional de qualidade para o país. Porém, este sentimento se inverteu bastante, não só na habilidade com a bola, que não é a mesma de antes, como também pela impressionante falta de maturidade pessoal e profissional dos atletas, além da lamentável cafajestice de figuras marcantes desse esporte, que vão aniquilando a respeitabilidade conquistada por gerações anteriores.


Agora temos este escândalo com o jogador Daniel Alves, na denúncia de agressão sexual que levou à sua prisão na Espanha. O caso prejudica bastante a imagem do Brasil não só pelo alegado crime cometido pelo jogador, mas também pela fama internacional do nosso sistema jurídico, com a impunidade garantida para quem tem dinheiro, já conhecida por todos. Pesa também contra a reputação brasileira a facilidade conferida a acusados de crimes graves, com a recusa de extraditar brasileiro que comete crime no exterior.


Existe um caso muito parecido com o de Daniel Alves, na condenação na Itália do jogador Robinho por estupro. Apesar da decisão definitiva, em terceira instância, Robinho está livre por força de um dispositivo constitucional, que do mesmo modo protegeria Daniel Alves de uma condenação na justiça espanhola. neste caso, a imediata prisão preventiva do jogador teve como motivo não só as suas graves contradições, em contraponto à firmeza da versão da vítima, mas também o risco de fuga. Como é que poderia ser liberado, com o histórico do nosso país em impunidade? Que juiz teria confiança de esperar sua volta para ser julgado?


Daniel Silva está em uma complicação com alto risco de resultar em condenação, mas independente do resultado nos tribunais, moralmente ele já está por baixo. O jogador se contradisse de maneira grave sobre a acusação de estupro. De início disse que nem conhecia a mulher, depois alegou que houve relação sexual, mas de forma consensual. O que ele diz inclusive do modo como se deu esse ato “consensual” não se sustenta com o que foi descoberto até agora.

 

É o contrário do que afirma a mulher que o acusa, que desde o ocorrido sustenta sua versão com muita coerência. A imprensa espanhola classifica seu depoimento como “contundente”. Nesta segunda-feira foi revelado até um detalhe sobre a descrição da vítima de uma tatuagem que o jogador tem no abdômen, até a região genital. A vítima não poderia ver essa tatuagem se a relação ocorresse como Daniel Alves contou. A polícia também já recolheu diversos indícios incriminatórios, entre eles, restos biológicos e marcas digitais do jogador. Exames comprovam lesões na vítima. Existem ainda imagens de segurança que mostram o estado emocional da mulher antes e depois do ocorrido. 


Com apenas 45 minutos de inquirição, ele saiu do depoimento para a cadeia. A pena para o crime do qual o jogador é acusado é entre 4 e 12 anos. Segundo o jornal "La Vanguardia", o caso pode demorar até um ano e meio até chegar a juízo. Prisão preventiva na Espanha é de até dois anos. É provável que mesmo que não seja mantido preso até a decisão final, Daniel Alves será obrigado a ficar em prisão domiciliar até que tudo seja concluído, afinal existe o risco da fuga para um lugar onde a lei espanhola não alcança. 


E não é só quanto a crimes sexuais que esta nossa terra vira uma guarida para infratores. Tivemos no Brasil até mesmo o acolhimento do terrorista italiano Cesare Battisti pelo governo do PT. Lula garantiu a liberdade de Battisti, negando a extradição para que o terrorista cumprisse pena em seu país. Ele fez isso no último dia do seu governo, em 2010. O terrorista italiano já tinha o status de refugiado político, concedido pelo governo petista mesmo com sua condenação à prisão perpétua pela participação em quatro assassinatos cruéis e premeditados. Duas dessas pessoas foram mortas porque reagiram a um assalto e o filho de uma vítima foi ferido e ficou paraplégico. Battisti só foi  extraditado para a Itália depois do impeachment de Dilma Rousseff. Ele fugiu do país e foi preso na Bolívia, de onde foi levado pelo governo italiano para cumprir a pena.


Não é só clichê de filme classe B a história de que criminoso procurado foge para o Brasil. Outro exemplo de impunidade que ocorreu no futebol, mas fora de questões sexuais, foi no famoso caso Fifagate. Em 2018, o ex-presidente da CBF José Maria Marin, 86 anos, foi condenado em Nova York a quatro anos de prisão, pagamento de multa de 1,2 milhão de dólares e confisco de 3,3 milhões de dólares em bens. Creio que não é preciso dizer o que aconteceria com Marin no Brasil. E ele só cumpriu a pena porque a Justiça dos Estados Unidos o pegou antes mesmo do julgamento. 


Mesmo com a condenação, se fugisse para o Brasil, o cartola da CBF ficaria impune. Marin foi preso em maio de 2015, em um hotel em Zurique, na Suíça, sob ordem da justiça americana. Ele ficou cinco meses em uma prisão suíça, até ser extraditado aos Estados Unidos onde passou dois anos em prisão domiciliar em Nova York, para então ser condenado e imediatamente preso. 


Na época, outros dirigentes do futebol brasileiro também foram acusados formalmente pelo Departamento de Justiça nos Estados Unidos. Marco Polo Del Nero e Ricardo Teixeira foram dois maiorais brasileiros que escaparam de julgamento porque o Brasil, por lei, não extradita seus cidadãos. Desde então, não tiraram mais os pés de casa, porque poderiam ser pegos em qualquer país estrangeiro. Preferiram ficar no Brasil, onde confiam nas leis. E do ponto de vista deles, até que esta confiança faz sentido.

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Por José Pires

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