quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

A falência do PT e a esquerda refém da rejeição a Lula

A mídia resolveu dar uma esquentada na pauta da tal da aliança de partidos de esquerda, mas depois de várias notícias explorando este velho assunto o entrave permanece na velha teimosia de Lula e na insistência do PT em ser o protagonista e mandar nos outros, sem dispor mais de poder político nem sequer quadros políticos para tanto. Esta teimosia e também uma incompetência que não faz sentido em um partido com tanta experiência em campanhas, fez o PT quebrar a cara nas eleições municipais, terminando como um grande derrotado.

Já faz tempo que o partido do Lula tinha que ter revisto suas posições e feito uma rigorosa discussão de seus erros, mas como encarar esta tarefa com Lula mandando no partido? Os petistas não estão conseguindo nem debater de forma efetiva a péssima imagem atual da sigla, que virou espantalho eleitoral. Ora, o dilema resume-se à sábia afirmação de que para consertar qualquer coisa é preciso antes reconhecer que existe um erro.

É óbvio que um agrupamento político que não aceita reconhecer nem uma derrota muito clara não poderá encontrar instrumentos para se reposicionar, procurando reencontrar sua ligação com os eleitores. Eu até duvido que o PT vá querer buscar esta reforma, pelo menos não com a atual direção nacional do partido, que tem à frente a deputada Gleisi Hoffmann, figura autoritária, tremendamente determinada em seus próprios equívocos e que além disso nada mais é que outro poste instalado por Lula para que ele próprio dê as ordens.

O ex-presidente e ex-presidiário é quem manda no PT e seu comando partidário com mão de ferro foi aceito até agora na esperança de que sua imagem rendesse prestígio político, com lucros eleitorais que já ficou evidente que ele não traz mais.

Com a derrota do poste Fernando Haddad na última eleição para presidente, entre algumas figuras do partido já aparecia esta visão, digamos, mais pragmática sobre o esgotamento da lenda que a esquerda tentou criar e que terminou enlameada na roubalheira instalada nos quatro governos petistas, de Lula e Dilma Rousseff, primeiro no mensalão e depois no petrolão.

Já se acendem sinais vermelhos quanto a esta tendência da derrota, ainda que pelo que se nota nos recados passados por meio da imprensa, até agora a verificação dessa realidade parece fora dos planos do partido. Reações parecidas com um racha político, no entanto, podem ser vistas em declarações como as do senador Jaques Wagner, que afirmou em entrevista que não pretende permanecer como “refém de Lula”.

O grupo de Wagner perdeu feio a eleição no primeiro turno em Salvador para o DEM, do atual prefeito ACM Neto. O senador, que foi também governador da Bahia,  deve ter elementos de sobra para saber que nesta toada podem ser obrigados a sair do governo do estado daqui a dois anos. A presidência da República, nem é preciso falar: até Guilherme Boulos — este portento que ficou 20% atrás de um político chocho como Bruno Covas — já aparece como salvador da pátria da esquerda.

Nesta quarta-feira, o senador petista disse em uma entrevista à rádio Metrópole que Lula “não é tão grande eleitor como já foi”. Na verdade, Wagner está sendo delicado com seu correligionário e amigo. Uma razão do antipetismo muito forte está em Lula, que carrega uma rejeição de dar alegria nos inimigos. O “Lula livre!” deu nisso. A ligação com Lula teve um peso fatal em cidades em que foi percebida pelo eleitor sua presença, mesmo que apenas por detrás.

Em certos lugares, como na disputa que dividiu a esquerda em Recife, o próprio adversário fez questão de apontar ao eleitor o passado sujo do PT, como fez o prefeito eleito João Campos, do PSB, contra sua prima petista Marília Arraes. A candidata também foi tola o suficiente para colocar Lula em destaque na sua propaganda eleitoral.

É fácil observar qual é o problema, mas conforme se diz naquela antiga fábula, como se faz para colocar o guizo no gato? Lula mantém a direção nacional sob seu controle. E ao menos internamente a lenda tem peso suficiente de convencimento para que pelo menos por enquanto sua figura não seja mandada para um cantinho debaixo da escada do almoxarifado. Sua laranja Gleisi Hoffmann mantém-se firme na crença da força do PT e claro que não aceita que o poder de Lula virar uma eleição é no sentido contrário, a favor do adversário.

Mesmo o PT não elegendo nenhum prefeito nas capitais brasileiras, Gleisi ainda acha que “o PT segue junto ao povo”. Ela também fala com orgulho no apoio petista a Guilherme Boulos e Manuela D’Ávila, sem reconhecer que na verdade isso foi um peso, que inclusive levou Boulos a esconder durante toda a eleição sua ligação com Lula. No caso da deslumbrada Manuela, seus adversários fizeram questão de fazer os gaúchos lembrarem que a candidata comunista sempre foi do palanque do PT de Lula.

Mesmo com tantos avisos pelo país afora nessas eleições municipais, os petistas seguem grudados a uma imagem pesada demais para carregar até em campanha eleitoral de cidade pequena. E isso não é só um desastre interno, que prejudica apenas o PT, pois sem a necessária discussão crítica entre os petistas este peso negativo vai travar qualquer aliança das esquerdas.

O problema alcança tamanha dimensão que não se foge dele nem com os petistas ficando de fora da aliança. Com o PT como definidor do que é esquerda neste país nas últimas décadas, vai parecer que é apenas uma manobra política para todos fugirem da autocrítica.

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POR‌ ‌José‌ ‌Pires‌

 

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Imagem- Jaques Wagner e o atual governador suam as camisas na Bahia para carregar o poste de Lula; até hoje o PT não aceita que virou um espantalho eleitoral


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