quinta-feira, 30 de junho de 2011

A filha do Che Guevara e suas conversas à sombra do muro de Berlim

A imprensa brasileira publica umas coisas que não tem cabimento. A Folha de S. Paulo publica hoje uma entrevista com Aleida Guevara, uma matéria longa que o jornal disponibiliza na internet. Aleida Guevara é um daqueles fenômenos estranhos da mídia. Se formos matutar quem é essa senhora, não dá para sair do fato dela ser filha de Ernesto Che Guevara, mas lá vai a Folha publicar uma entrevista imensa com alguém que não tem absolutamente nada a dizer sobre Cuba, a não ser chavões que estão ultrapassados até na retórica de Fidel Castro.

A entrevista é um amontoado de lugares-comuns sobre o falido comunismo da ilha cubana, com bobagens que eu não lia há algum tempo, um discurso que está ultrapassado até em Cuba. Artistas de lá que sempre defenderam a revolução cubana, hoje já fazem críticas ao modelo e até se queixam da morosidade da abertura política prometida pelos dirigentes. O cantor Pablo Milanés é um desses cubanos que percebem que o modelo pifou.

Já Aleida Guevara ainda traz a velha fachada stalinista que, pelo jeito, ainda se mantém de pé em Cuba. Nisso puxou ao pai. Pessoas que se encantam com o mito do guerrilheiro romântico e até doce que muitos vêem no Che se horrorizariam se soubessem como ele era na verdade. Guevara sempre foi mais duro que Castro. No plano internacional, Fidel Castro teve maleabilidade para perceber o ponto em que findava o papel de Cuba como exportadora de revolução pelo mundo. Guevara não tinha esse discernimento e provavelmente este foi um elemento forte na sua saída de Cuba para a Bolívia, o que na prática acabou sendo um afastamento político dos novos rumos que tomava a revolução cubana.

Che Guevara é um dos mitos mais equivocados do século 20. Nada do que ele fez deu certo. Até seu papel na revolução cubana é superestimado, mas, de qualquer forma, o que ele fez depois como dirigente foi um desastre. Em 1967, quando soube onde Guevara estava, o escritor Mario Vargas Llosa, que vivera muitos anos na Bolívia, comentou sobre os problemas que o guerrilheiro encontrara no espaço geográfico que escolhera para lutar: "Não há alternativa, ou ele se deixa capturar ou morre. Está sem saída. O que ele fez é suicídio". E era um amigo que dava essa opinião. Vargas Llosa só iria romper com Cuba em 1971.

Mas falávamos da entrevista da filha do guerrilheiro. Bem, numa conversa com Aleida Guevara não dá para extrair nem o testemunho familiar sobre o pai. Ela não conviveu com ele. Fala do pai como qualquer outra pessoa encantada pelo mito estampado em camisetas.

No meio da entrevista a jornalista tentou desencavar alguma novidade sobre a estada do venezuelano Hugo Chávez em Cuba para o já se previa ser um sério tratamento de saúde, talvez de um câncer, mas nem aí foi possível dar uma levantada na conversa com Aleida Guevara. O que saiu sobre Chávez foi uma das mentiradas, entre o que ela contou sobre o processo político em Cuba — que é claro que na sua opinião é o mais democrático do mundo.

O presidente venezuelano foi para Cuba fazer uma operação de joelho, ela garantiu. E ainda aproveitou para comentar a necessidade de tempo para a recuperação de uma operação como esta. "Necessita de tempo para recuperar-se. Tem o peso do corpo...", ela disse. E a filha de Guevara ainda se apresenta como médica. Mas faltou combinar o logro com o doente.

Nem deu tempo da entrevista virar jornal de ontem. Hoje mesmo Hugo Chávez foi para a TV cubana e assumiu que está com câncer. Mais um pouco e é capaz da filha de Guevara ficar sabendo que o muro de Berlim já caiu.

Mas uma informação interessante é a razão da estada de Aleida Guevara no Brasil. Ela veio para um evento ecológico em Londrina, no Paraná. Isso eu já sabia e já andava bem temeroso que a notícia se espalhasse. Foi um evento do MST e da Via Campesina, abrigado numa universidade pública estadual.

Só faltava essa. A esquerda brasileira tem desmoralizado tantas causas importantes para a humanidade, mas até agora andava distante da ecologia, até porque o governo petista não tem nenhum compromisso real com a defesa do meio ambiente. Muito ao contrário, é um governo que se arroga um desenvolvimentismo dos mais tolos, tão indecente que acabamos não tendo de fato nem o desenvolvimento. Mas a lorota tem servido como justificativa para a destruição do meio ambiente brasileiro.

Mas como essa esquerda é uma praga, não duvido que desmoralizem também a luta ecológica. Já estão trazendo companheiros de Cuba para ajudar.
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POR José Pires

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