terça-feira, 21 de junho de 2011

Progressistas do bem-bom

Eu sou de uma época em que ser progressista exigia mais esforço do que acontece hoje em dia. Fazer imprensa alternativa na época da ditadura militar, por exemplo, dava um trabalhão danado, além naturalmente dos riscos inerentes ao ofício de combater o governo. Esses jornais eram chamados também de imprensa progressista ou imprensa nanica, mas tanto faz o rótulo. O produto dava sempre muito trabalho.

No geral ganhava-se pouco e em algumas publicações era preciso até botar dinheiro do bolso. Hoje em dia podem até dar boas histórias aquelas madrugadas passadas em redação de jornal alternativo, mas não era nada divertido. É o caso do semanário Movimento, cuja censura-prévia exigia a feitura de duas ou três edições inteiras por semana para que fosse possível escapar uma das mãos dos censores. Daí então havia todo o trabalho da edição, até o jornal seguir para a impressão e daí para os leitores.

É bom lembrar a rapaziada progressista que nesta época os jornais eram produzidos com máquina de escrever e os desenhos, apesar da ditadura, eram feitos à mão livre. A diagramação e arte final dos jornais também só eram possíveis de se fazer do mesmo jeito. E o único modo de alguma coisa chegar a Brasília, onde era feita a censura, era dentro de um pacote enviado por avião.

Tinha também os riscos para a integridade física. Hoje dá para ver como era a coisa. Até bem próximo do final do regime, eles ainda estavam matando. As mortes de Vladimir Herzog e Manoel Fiel Filho mostram com exatidão o risco de lutar pela liberdade de expressão naqueles tempos.

Hoje, ser progressista está bem mais fácil. Nesta semana fizeram em Brasília 2º Encontro Nacional dos Blogueiros Progressistas. Para ser mais exato, auto-denominados blogueiros progressistas. Também são chamados de blogueiros sujos, o que ficou bem marcado principalmente na última eleição, mas desse nome eles não gostam. Por isso usam aquela velha tática de assumir o apelido para amenizar o estrago, mas não parece estar dando certo.

A bem da verdade, o encontro foi feito com dinheiro público, o que não combina com o adjetivo "progressista". Aliás, se o sujeito for mesmo progressista até vai concordar que o blogueiro que faz algo assim é mesmo um blogueiro sujo.

O ex-presidente Lula esteve lá, dando seu plá aos "brogueiros", como ele chama esta nova categoria de companheiros. O deputado cassado José Dirceu também compareceu. Ambos desceram a lenha na imprensa, é claro, que mais poderiam fazer num encontro de "brogueiros" progressistas?

Dirceu estava impossível. Lembrava seus tempos de dirigente estudantil, mas só no discurso, evidentemente. E, felizmente para todos, vivemos numa época em que, como já disse, está uma baba ser progressista. Fosse noutros tempos e sob uma ditadura, o companheiro Dirceu já se deslocaria até a padaria da esquina para encomendar 1800 pães, 7 quilos de queijo fatiado (fatias finas, por favor, ô português!) e 9 quilos de mortadela também fatiada, para alimentar os participantes do encontro clandestino. E aí o comandante Dirceu melava o encontro dos blogueiros progressistas, como ele fez em Ibiúna na década de 60.

Mas hoje, felizmente, existe liberdade até para criar fantasmas para dar um clima combativo num encontro de blogueiros governistas muito bem apoiados em verbas do Estado. Dirceu aventou a hipótese de um combate violento pela liberdade de expressão. A fala do ex-capitão do Lula que praticamente saiu chutado do governo sob o escândalo de corrupção do mensalão: "Se não travarmos essa batalha, ela não será travada. É hora de dar um grande salto, partir pra mobilização. Estou disposto a travar essa luta junto com vocês”.

É tudo conversa. Os blogueiros governistas são, em sua maioria, ligados de uma forma ou outra aos benefícios de governos petistas variados, inclusive o federal, e de sindicatos. Muitos recebem em seus blogs anúncios pagos de estatais. Outras facilidades financeiras também acontecem, até mesmo empréstimos tão facilitados quanto dinheiro do Banco do Brasil na mão de fazendeiro com boas relações com a bancada ruralista.

E todos agem como peixes-pilotos seguindo tubarões como Dirceu, que indicam pautas e apontam o conteúdo que cada um deve publicar. É um esquema muito bem controlado e que segue o tom que os chefões ordenam. Dá até para visualizar o organograma do esquema quando surge um assunto do interesse dos que mandam hoje no PT e no governo.

A mamata, porém, precisa ter ares de grande batalha progressista para que a tigrada se anime e também não perca a auto-estima, afinal não é nada meritório ser capacho de governo algum.
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POR José Pires

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