A lei de abuso de autoridade, aprovada há poucos dias pelo Congresso Nacional, já vem sendo cumprida, com juízes dando liberdade a suspeitos de crimes como homicídio qualificado, tráfico de droga, roubo, desobediência, ameaça e resistência. A notícia é da Folha de S. Paulo. Isso vem acontecendo em vários estados. O jornal conta que em Garanhuns uma juíza mandou soltar 12 suspeitos de tráfico de drogas.
O detalhe, se é que isso pode ser definido desse jeito, é que a legislação ainda não entrou em vigor. Isso mesmo. Antes mesmo de sua oficialização, já está em prática o projeto da mais ampla impunidade, tocado por figurões do Judiciário como o ministro Gilmar Mendes, do STF, trabalho que juntou a esquerda brasileira (incluindo bravos puxadinhos do PT, como o Psol) ao interesse de corruptos tradicionais e gatunos ainda em início de carreira, procurando amaciar também os rigores da lei para traficantes e criminosos de variadas atividades, incluindo evidentemente milicianos que dominam grandes porções de territórios em cidades brasileiras. Ah, sim: para a efetividade desta incessante atividade pelo crime não se pode esquecer da atuação expressiva de milionárias bancas de advogados.
Com a lei do abuso de autoridade já sendo aplicada mesmo antes de sua oficialização, cumpre-se o que brasileiros sensatos vinham alertando sobre o clima que acabaria sendo criado pelo endurecimento de punições a agentes públicos. A lei abrange juízes, promotores e policiais, o que obviamente vai fazer com que policiais nas ruas deixem de cumprir a lei em várias situações que podem criar complicação posterior para o agente. Claro que o policial que atira em inocente pelas costas, o juiz que exige propina, o promotor que por desleixo ou caráter corrupto não se empenha pelo cumprimento da lei, estes sem dúvida não serão afetados em seus maus costumes.
O efeito da lei do abuso de autoridade é o de inibir juízes e promotores não no abuso, mas no cumprimento de suas obrigações. A pressão também se dará contra o policial mais decidido na obrigação de encarar com firmeza o crime. Por outro lado, facilitará muito a vida de juízes e promotores que não têm o interesse de se empenhar para que haja justiça no país. E repito: pouco importa se o agente público deixará de agir por desleixo ou para ganhar dinheiro por fora. A lei facilita do mesmo modo para a vagabundagem e a canalhice, dando ampla razão jurídica para quem não quer fazer nada.
Sobre a eficiência deste ambiente favorável à impunidade e ameaçador para quem acredita no rigor no cumprimento da lei, achei altamente esclarecedora uma declaração de Gilmar Mendes dada à Folha, em comentário sobre juízes mandando soltar presos baseados em uma lei que ainda não vigora. “É uma premissa errada [dos juízes]. Se não está nem em vigor, que ameaça há?”, ele disse. Este ministro do STF é notório pelo alto grau de cinismo, mas se superou com esta fala, embora tenha se entregado um pouco ao usar a palavra “ameaça”, definindo, talvez de modo involuntário o objetivo dessa lei, que teve dele sempre o maior entusiasmo. Notem que ele nem toca no ponto assustador, da soltura de figuras perigosas. Só lembrou que a “ameaça” ainda não é oficial.
Gilmar Mendes exemplifica muito bem o papel do legislador e do jurista que trabalha com as leis e regras tendo mais em vista o clima coletivo que advirá de sua aprovação. No caso desta lei, libera-se a impunidade e coloca sobre pressão não só pela via judicial quem acredita no rigor contra criminosos de todos os tipos. Já vai para meses que Gilmar e figuras do seu naipe se articulam para acabar com o maior rigor contra a corrupção, um movimento que adquiriu força nos últimos tempos e envolveu a maioria dos brasileiros, tendo como base simbolicamente e na prática a Operação Lava Jato. Como se vê, o esforço vem mostrando resultado. Nem foi preciso a legislação entrar em vigor para se estabelecer o clima de impunidade.
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POR José Pires
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