sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Exumações eleitoreiras

Como no Brasil não se respeita em situação alguma o sinal amarelo, acaba-se não tendo tempo algum para uma reflexão que evite a trombada no sinal vermelho. Mas eles estão todos por aí num piscar desesperado. Li agora há pouco num desses sites pró-governo e bancados por dinheiro público um artigo em torno deste esquisito revival janguista, que aparece inclusive numa hora imprópria para homenagens. João Goulart sendo reverenciado por autoridades de um governo imerso na lama da corrupção acaba dando um tom até cômico às suas exéquias.

Mas o artigo a que me refiro revela de forma mais clara o que está por detrás desta surpreendente redescoberta do presidente derrubado pelos militares em 1964. O título do artigo já diz tudo: "Depois de Jango, falta exumar as reformas de base". É isso mesmo, além da esquerda ter criado um monte de fantasmas próprios agora estão pensando na exumação de fantasmas do passado. E claro que não estou falando sobre a compreensão sempre necessário sobre o que vivemos no período pré-64. Não é este o interesse desta esquerda que está no poder.

Os dramas que o país viveu naquela época têm tudo a ver com o que interessa na construção de temas favoráveis à reeleição de Dilma Rousseff e a continuidade do projeto de poder do PT. O que estamos vendo é um janguismo marqueteiro. Interessa a eles trazer de volta ao debate a confusão conceitual e ideológica daqueles tempos. Se for bem manipulada, esta balbúrdia pode criar a ilusão no eleitorado de um sentido novo para um governo que falhou em tudo, inclusive nos temas das famosas "reformas de base" propostas por Goulart. Até pela incapacidade técnica do governo do PT ainda estão aí todos todos os problemas relacionados àqueles tempos. Tem até mais que isso. Naquela época não havia o assustador índice de violência e o país precisava dar um impulso às suas indústrias e não salvá-las do sucateamento, como ocorre agora.

Sistema financeiro, distribuição de renda, habitação, reforma urbana, relação do governo com os bancos, estrutura fundiária e a relação com o setor rural, todas as demandas daquela época servem de forma apropriada para um governo como este, que precisa desviar os olhos da opinião pública de sua incompetência administrativa e da índole dos larápios travestidos de líderes políticos e autoridades oficiais.

No meio disso tudo podemos ter também a extrema esquerda se colocando com sinceridade na luta pela volta inclusive daquele clima político conflituoso. Ah, teremos também com certeza na luta o sindicalismo atrelado ao governo, desta vez todos muito bem fixados em gordas verbas estatais ou tiradas do bolso dos trabalhadores, cargos nomeados e privilégios pessoais. Não falta também o uso demagógico da Petrobrás e o engodo do petróleo como combustível mágico para o desenvolvimento. Ainda bem que para a nossa sorte não temos sargentos nesta história e também nenhum cabo da marinha.

No Brasil sempre é difícil atinar para os nossos reais problemas, por causa da falta de atenção ao tempo de meditação e debate que pode proporcionar um sinal amarelo. Como este sinal nunca é respeitado, geralmente só percebemos o drama quando o amarelo virou vermelho e bem lá atrás. Apurem os ouvidos, estão ouvindo as correntes? Estão exumando até sinais vermelhos do passado.
.....................
Por José Pires


quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Resistência tardia

O grande cronista de humor Stanislaw Ponte Preta fazia nas décadas de 60 e 70 uma seção chamada Febeapá, sigla de Festival de Besteira que Assola o País. Nela, Stanislaw compilava o besteirol que rolava por aqui. Ele pegou uma época que teve asneiras multiplicadas pelo poder que a Ditadura Militar foi concedendo à mediocridade pelo país afora. O negócio era sério. Só entravam notícias verdadeiras. Com o tempo os leitores foram colaborando com o tema, enviando de suas cidades as besteiras locais. Stanislaw fez até uma carteirinha para credenciar os colhedores de material. O documento era distribuído dentro de seus livros, que tinham tiragem bem alta na época.

Infelizmente, Stanislaw Ponte Preta (conhecido também como Sérgio Porto) morreu bem novo, aos 45 anos, em 1968, deixando assim de ver as besteiras se acumulando neste país. Hoje em dia a coisa piorou bastante. Como diz o Lula, nunca houve tanta besteira na história deste país. Inclusive com uma contribuição imensa do ex-presidente, como todos sabem. O Febeapá desses anos recentes daria muitos volumes, inclusive com seções em lulês e dilmês, novilínguas trazidas pela cultura petista.

E foi nesta quinta-feira que o Congresso Nacional produziu uma peça histórica para o Febeabá. Foi anulada a sessão do Senado da madrugada de 2 de abril de 1964, que declarou vago o cargo de presidente da República. Fizeram tudo nos conformes: a justificativa técnica da anulação é de que João Goulart ainda estava no Rio Grande do Sul. Bem, no dia anterior, como todas sabem, João Goulart havia sido derrubado por um golpe militar e passamos a viver numa ditadura que foi até 1985.

A anulação não tem valor prático algum. A não ser de entrar para o Febeapá, que merece ser reaberto para o acolhimento de tão soberba asnice. E se alguém vier falar em valor simbólico do ato do Senado, digo que simbolicamente parece mesmo é gozação. O Congresso Nacional peitou o golpe militar 49 anos depois dos militares derrubarem Goulart. A medida é tão idiota que a única sessão que ficará de fato na História é a que foi anulada na sessão de ontem.
.....................
Por José Pires

___________________

Imagem - A carteirinha para os colaboradores do Febeapá, com a foto do cronista no lugar onde o leitor devia colar sua fotografia. Note que a credencial é para colher material para o Febeapá Nº 3. Normalmente os livros de crônicas de Stanislaw Ponte Preta vendiam bastante no Brasil, sucesso que também acontecia com as edições que juntavam as besteiras de todo o país, mas principalmente de Brasília, publicadas por ele na sua coluna no diário Última Hora, de 1955-1968. Outro detalhe interessante desta carteira é a editora que publicava os livros, a Sabiá, de propriedade dos escritores Fernando Sabino e Rubem Braga, este último um dos maiores textos que nossa terra já teve.

Esquerda racialista

Existe um erro da imprensa em identificar essa militância racialista como "movimento negro". Primeiro não é um movimento unitário e de amplidão nacional. São vários movimentos e na minha visão nem são representativos da (eles que classificam assim) raça negra. Então não existe propriamente um "movimento negro". Essa unidade não foi possível nem nos Estados Unidos, onde existiu discriminação de fato e apoiada em lei. Negros não podiam frequentar determinados locais e tinham que sentar em um lugar obrigatório nos ônibus. Até bebedouros de água eram separados. Estas regras racistas absurdas existiram até a segunda metade dos anos 50. Além disso, negros eram espancados e mortos por racistas. A Klu Klux Klan tinha um poder político imenso em estados do Sul e era determinante na vida da população negra.

Porém, mesmo nesta situação de terrível opressão racial, nos Estados Unidos não havia um movimento negro unitário. A reação ao racismo vinha de diferentes linhas políticas, com o pragmatismo de um Martin Luther King (que felizmente prevaleceu) ou com o radicalismo de um Malcom X, que liderava um grupo político violento e que era também fascista. Os grupos dos movimentos negros de esquerda no Brasil agem como se preferissem Malcom X.

Após a Abolição não ocorreram coisas assim no Brasil, onde leis de segregação racial nunca existiram. Mas os movimentos negros de esquerda agem em nosso país como se as relações raciais por aqui fossem até hoje muito violentas. É um problema inclusive de bravata, já que é muito fácil ser radical numa situação em que o risco de revide é praticamente zero. E esses militantes são grosseiros exatamente com brancos que aceitam debater com franqueza. Estão sempre agredindo quem não é racista, já que não teriam de forma alguma a oportunidade de uma conversa em pé de igualdade com um branco racista.

Todos os movimentos que vi até agora na mídia são na verdade "movimentos negros de esquerda". Alguns militantes são de extrema esquerda, como é o caso do líder da Educafro, Frei David. Neste até o espírito é autoritário. Ele não admite de jeito nenhum que alguém pense diferente e vê racismo deliberado até na Igreja Católica, onde, segundo ele, "quase todas as paróquias têm cozinheiras negras, mas as freiras, que são superioras, dificilmente são negras". Haja paciência para ouvir essas coisas, não é mesmo?

Mas o besteirol dos racialistas se acumula. O senador petista Paulo Paim é um político que fez carreira acenando para os trabalhadores com ganhos econômicos impossíveis de serem cumpridas pelo simples fato de não ter dinheiro no orçamento. Mas ele fazia mesmo assim suas leis. Como eram perdulárias e impossíveis de executar, não passavam no Congresso. Então ele punha a culpa no governo e veio se reelegendo dessa forma desonesta. Ele também descobriu na questão racial uma boa fonte de votos. É um dos político mais animados com as cotas raciais, que ele vê dessa forma: “É uma reparação de anos e anos de exclusão racial e social. Não é justo que o preto e pobre trabalhe de dia para pagar a universidade e estudar à noite enquanto o branco descansa o dia todo”.

São argumentos que podem até provocar o riso, mas nenhum desses extremistas têm graça nenhuma. Existe o risco desse tipo de argumentação absurda e criadora de conflitos ir se estabelecendo como conceito, criando entre a juventude uma forma de relação que dessa forma inevitavelmente levará o Brasil a viver conflitos raciais que podem ser muito sérios. A nós cabe evitar esta condição de violência que certos militantes racialistas vêm estimulando de forma irresponsável.
.....................
Por José Pires


___________________

Imagem - Joaquim Nabuco (1849-1910) era branco e fazendeiro muito rico, porém foi muito mais importante para a luta contra a escravidão do que Zumbi, personagem que é apenas um mito adotado pela militância. A vida de Nabuco é uma comprovação histórica de que a consciência humana da igualdade independe da cor da pele e da classe social.

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Futuro assegurado

Pronto, ninguém precisa mais ter dó do José Genoino. Ele já está em regime semiaberto. Sua ceia de Natal também está assegurada e até as festas de Ano Novo. O ex-presidente do PT continua recebendo o salário integral de R$ 26,7 mil até janeiro, mesmo não sendo o titular do cargo de deputado. Ele está em licença de quatro meses e com isso mantém o cargo, mesmo já tendo um suplente em seu lugar. Genoino sabe fazer muito bem esses arranjos dentro da lei. Dizem que ele conhece tudo do regimento da Câmara, então é provável que saiba também de qualquer outro regulamento. Ele só é descuidado na hora de colocar sua assinatura junto às assinaturas de Marcos Valério e Delúbio Soares em documentos de seu partido, mesmo sendo um empréstimo de milhões de reais. Mas aí está: hoje o contribuinte paga o seu salário e também o do suplente.

Ninguém precisa também ficar sem dormir de preocupação temendo pela subsistência dele. O presidente do PT na época em que rolava o mensalão já é aposentado como deputado e recebe um salário mensal de R$ 20 mil brutos. Genoino pediu aposentadoria por tempo de contribuição na Câmara depois que teve má votacão em 2010. Ele não foi eleito, assumindo o mandato a partir de um arranjo político que deu um cargo a outro deputado, abrindo espaço na Câmara.

Genoino já ganha como aposentado e está pleiteando outra aposentadoria, agora por invalidez. Aí ele terá salário integral, que irá para R$ 26 mil brutos. A licença médica é parte dos trâmites para a aceitação da invalidez, que no caso só pode ser uma invalidez profissional para ser deputado, não é mesmo? Ele já passou por avaliação feita por uma junta médica da Câmara. A resposta está para sair e acho difícil que não seja favorável, afinal, repito, ele sabe tudo dos meandros daquele prédio das duas cuias em Brasília.

Creio que essas aposentadorias dizem bastante sobre o político Genoino. É claro que ele pode estar doente de fato e acho isso lamentável. Tenho um coração bem maior do que qualquer mensaleiro. Me comovo até com a situação mental e física de Hitler nos dias finais em seu bunker, isso na sua condição humana. Mas sempre lamento mais a falta que ele fez no banco dos réus em Nuremberg. Acredito que é desonesto misturar política com o sentimento nobre da compaixão, ainda mais quando isso é feito para mascarar responsabilidades.

Esta aposentadoria de um alto dirigente petista diz bastante também sobre o PT. Sou contra aposentadoria de deputado ou em qualquer outro cargo eletivo. Política não é profissão. E essa era também a posição do PT antes de alcançar o poder, quando os mandatos de sua cúpula ainda não haviam se enfileirado para muitos numa imensa quantidade de anos sem largar a cadeira. O decente para este partido (e também todos os outros partidos, isso é óbvio) seria que cada um tivesse responsabilidade pessoal por seu futuro, optando por um plano privado de previdência ou até trabalhando numa profissão de fato, que é o que faz a maioria dos brasileiros.
.....................
Por José Pires

__________________
 


IMAGEM - Genoino com um colega mensaleiro condenado, que ainda está no cargo de deputado. João Paulo Cunha mandou a mulher sacar R$ 50 mil na agência do Banco Rural, cuja dona, Kátia Rabello, está condenada a 16 anos e 8 meses de prisão. Já condenado por corrupção e peculato, Cunha será preso se o seu embargo não for aceito pelo STF. Reparou como ele está quietinho no cargo de deputado? Pois é, eles são assim.

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

O passado também condena

A partir da condenação pelo STF do deputado José Genoíno, seus partidários vêm tentando criar para ele uma imagem que nada tem a ver com sua real trajetória na política brasileira. A bem da verdade, a imagem de vítima e a humildade com que ele vem sendo apresentado não tem a ver nem com a sua personalidade. Até ser pego nas ilegalidades tramadas enquanto ocupava a presidência do PT, Genoíno vinha sendo implacável nas suas atitudes políticas, a começar da primeira vez em que se teve notícia dele no Brasil. Foi na sua prisão pela participação na guerrilha organizada pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB) numa das margens do Rio Araguaia, no sul do Pará. A guerrilha começou em 1967, se fortaleceu em 1970 e afinal foi derrotada pelo Exército Brasileiro em 1974. Esta primeira prisão de Genoíno ocorreu dois anos antes do final da campanha do exército.

E ninguém deve cair nas versões que dão aquele conflito como um violento ataque dos militares a idealistas que só visavam o bem. Os combatentes do PCdoB estavam armados e bem treinados e tinham o propósito claro de estabelecer um governo nacional a partir daquele foco guerrilheiro. Os comunistas levaram vantagem na fase inicial, fazendo emboscadas, ferindo e causando baixas às tropas do exército.

O propósito do PCdoB era o de uma guerra popular prolongada dentro do modelo do líder comunista Mao Tsé-Tung. O partido tinha fortes laços ideológicos com a China comunista, mas já pendia para o lado da Albânia, que é até hoje um país miserável e na época era comandada por um ditador doido chamado Enver Hodxa. Mas os comunistas do PCdoB achavam que a Albânia era o único socialismo respeitável no mundo.

É evidente que em caso de vitória de sua guerrilha o PCdoB não iria convocar eleições democráticas. Haveria a instalação no Brasil do que eles chamam de "governo popular", eufemismo usado para qualquer ditadura que lhes agrade. O PCdoB sempre foi ensandecido politicamente. O partido jamais aceitou sequer as denúncias dos crimes de Stálin, feitas pelo próprio governo comunista soviético, no final da década de 50. Certamente iriam impor ao Brasil um modelo híbrido que juntasse o maoismo e o desastre que era a ditadura de Hodxa na Albânia, país comunista que chamavam de "Farol do socialismo".

Esta é a origem política de Genoíno, que foi preso durante as ações do exército enquanto dezenas de companheiros seus foram mortos. Existem denúncias de atrocidades naquela ação dos militares brasileiros, atitudes que seriam condenáveis em qualquer guerra, porém é falsear a História tentar fazer crer que em qualquer lado daquele conflito havia alguma vítima inocente movida por ideais simplesmente libertários. Por isso, não é justo e tampouco é verdadeiro historicamente ficar tratando este mensaleiro condenado como se ele tivesse lutado pela liberdade e a democracia. Nenhum movimento comunista instalou democracia em país algum depois de vitorioso. É vergonhoso que não seja assumido hoje em dia o propósito real daquela guerrilha. Na minha visão, esta conversa dissimulada é até um desrespeito à memória de quem morreu combatendo por suas ideias comunistas.

Genoíno foi solto em 1977 e anistiado em 1979. Elegeu-se deputado federal pelo PT em 1982. É uma trajetória que seria impossível no Brasil para alguém na sua condição se a guerrilha do PCdoB tivesse alcançado a vitória. O que ele deveria fazer é parar com esta lorota de que "lutou pela democracia", assumir os erros de seu passado e além disso agradecer por estar sendo preso num país que não vive sob uma ditadura totalitária, como eles pretendiam. Aproveitando a ocasião, também seria mais honesto ele assumir que errou ao participar do atentado à democracia que foi o mensalão.
.....................
Por José Pires

sábado, 16 de novembro de 2013

Fuga fora do plano

É evidente que o plano do PT em relação aos condenados do mensalão é que cada um respeitasse a decretação da prisão pelo STF e fosse pra cadeia na esperança do assunto sair do noticiário para não ser lembrado durante a campanha eleitoral. Nem é um plano de grande elaboração. Não existia nenhuma outra possibilidade para enfrentar o problema, a não ser a opção desastrosa de uma fuga. E foi exatamente isso que fez o mensaleiro Henrique Pizzolato, ex-diretor de marketing do Banco do Brasil, condenado a 12 anos e sete meses de prisão

Pizzolato fugiu para a Itália, fazendo uso de sua dupla cidadania. A fuga de um mensaleiro condenado para um país estrangeiro é uma atrapalhação e tanto para o plano petista de varrer o mensalão pra debaixo do tapete. A relação do partido com a corrupção passa a ter repercussão internacional. E não poderia ser pior o país escolhido por Pizzolato. A Itália traz de volta o assunto da guarida que o governo do PT deu ao terrorista Cesare Battisti, condenado por assassinato pela justiça italiana e protegido pelo governo Lula.

Temos então uma piada pronta, que é a troca de um Battisti por um Pizzolato. E o mensaleiro fujão faz lembrar aos petistas aquele velho ensinamento que aparece em tantas histórias de detetive: não existe plano infalível. A fuga já é notícia na imprensa italiana. Aqui, pode ser lida uma matéria do Corriere Della Sera, um dos mais importantes diários da Itália. A reportagem já tem vários comentários de leitores indignados, com ataques ao nosso país e fazendo referência ao caso Battisti. Esta é a imagem que o PT dá ao Brasil no exterior.
.....................
Por José Pires

O poder em cana

Ué, não entendi a tristeza dos amigos do Delúbio Soares. Não era para eles estarem rindo da "piada do salão"? Pois é, a situação não é nem um pouco engraçada para o esquema político que hoje domina o governo brasileiro. Os mensaleiros poderiam até ir para casa já nesta segunda-feira, algo que não acontecerá de forma alguma, mas mesmo se fosse assim já estaria criada uma situação que é uma linha de fronteira entre duas épocas distintas da nossa política, de antes e depois do mensalão. A prisão dos mensaleiros define este marco.

A preocupação de quem ficou de fora das grades não é com a situação do Delúbio, do Genoíno ou mesmo do poderoso José Dirceu. Isso se arranja, além do que a desgraça de cada um desses mensaleiros abre espaços no poder e no partido que já devem estar sendo objeto de muita disputa nos bastidores Tudo estaria bem, se não fosse o padrão determinado na política pela prisão dos mensaleiros. O pessoal gosta mais da palavra "paradigma" para definir este modelo que fica estabelecido a partir desse 15 de novembro, que foi um dos aniversários mais importantes da história recente da República.

Com a cúpula do mensalão em cana mantém-se agora a possibilidade sempre presente da punição até para os mais poderosos integrantes do crime organizado na política. Escaparam do julgamento no STF outros responsáveis pelo esquema, entre eles o ex-presidente Lula, que só não poderia saber de nada se fosse um idiota. Muito ao contrário disso, ele é um dos mais espertos da turma. Mas para o próprio Lula serve também este paradigma.

Foi por um golpe de sorte que o ex-presidente escapou de sentar-se no banco dos réus. Teve também um erro de avaliação da oposição, que acreditou na chantagem política feita pelo PT com a ameaça de criar uma conflagração nas ruas caso Lula fosse acusado oficialmente. Foi bravata pura e não é só agora que digo isso. Escrevi na época. E bastava ver o desespero dele naquela famosa "entrevista" filmada em Paris para perceber o blefe político. O poder de Lula e de seus companheiros é fruto de maquinações com o uso da máquina pública e de muito dinheiro. Estão bem longe de terem capacidade de grandiosas mobilizações populares. Nem se algum deles desse um tiro no peito.

Poderiam até ter criado esta condição política, que seria um inferno para o Brasil, mas estaria pronta para o proveito deles. Mas para isso teriam de ter se dedicado à construção de um projeto político e não caído no insaciável ataque aos cofres públicos. Mas agora também ficou tarde para isso e cada passo daqui por diante torna-se mais arriscado. Foi estabelecido pelo julgamento do mensalão um padrão mais rigoroso. Ou melhor, vamos usar essa palavra que eles falam tanto. Comecei a gostar dela. A punição dos mensaleiros foi um paradigma que não permite fazer da corrupção uma piada de salão.
.....................
Por José Pires

O jeito Lula de ser companheiro

Que lealdade, respeito e solidariedade não são coisas do ex-presidente Lula já se sabe há muito tempo, mas mesmo vindo dele foi constrangedora a descartada que ele deu ontem em José Dirceu. Não era assim quando Dirceu ocupava a Casa Civil de seu governo, na época em que rolava o mensalão. Naquele época, ele era o "capitão" de seu time. E agora com a condenação pelo STF isso virou águas passadas. Mas o cara é assim mesmo. Ele vai largando os companheiros na estrada conforme sua conveniência. E quando a desgraça alheia tem relação com algo que pode também incriminá-lo, aí então é que ele some de perto.

Até companheiros assassinados são abandonados da forma mais injusta. Foi isso que ele fez com Toninho do PT, morto a tiros em 10 de setembro de 2001, quando era prefeito de Campinas. Na campanha presidencial de 2002 Lula prometeu para Roseana Garcia, viúva do prefeito assassinado, que colocaria a Polícia Federal para investigar o crime se fosse eleito. Ele acreditava em crime político, mas logo mudou de opinião. No poder, ele até se recusou a receber a viúva. Agora, no mês de setembro passado, o Ministério da Justiça recusou oficialmente o pedido para que a Polícia Federal entrasse no caso. O governo do PT levou 12 anos para dizer não. A família diz que vai denunciar o Estado por omissão na Organização dos Estados Americanos.

Outro companheiro morto que Lula fez questão de deixar para trás foi Celso Daniel, assassinado também no cargo de prefeito. Daniel era prefeito de Santo André e quando foi morto coordenava a campanha de Lula para presidente da República. Ele morreu com onze tiros depois de ser muito torturado pelos assassinos. O crime aconteceu em data muito próxima ao assassinato de Toninho do PT: 18 de janeiro de 2002. Os casos são parecidos também na teimosia do partido e de Lula de querer mantê-los na esfera do crime comum. A morte de Daniel tem corrupção no meio e o Ministério Público garante que era dinheiro desviado para a campanha do Lula.

São crimes muito estranhos, com o assassinato de Celso Daniel envolvido num enredo que não daria para aceitar nem em minissérie policial. Além da tortura e da quantidade de tiros, o que nunca acontece em crime comum, sete testemunhas morreram, todas em situações misteriosas. Porém, seja como for, o que causa mais estranhamento é que não tenha havido da parte de Lula nenhum interesse em esclarecer definitivamente os crimes, eliminando todas as dúvidas, afinal tratava-se também da morte violenta de dois amigos muito próximos.

Mas qual nada. Seu caráter é o de quem larga qualquer um para trás, sem lealdade, respeito, solidariedade ou mesmo compaixão. Com ele é companheirismo, companheirismo, negócios à parte.
.....................
Por José Pires

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

E segue o mesmo jogo

É lamentável ver neste escândalo da “Máfia dos fiscais” da prefeitura de São Paulo a movimentação na internet do esquema de sempre para tentar livrar de responsabilidade o prefeito petista Fernando Haddad. A rede criada na defesa dos interesses do PT é forte e azeitada inclusive com dinheiro público, por meio de privilégios e anúncios de estatais ou até diretamente com publicidade oficial.

A tentativa marota de livrar Haddad colocando a culpa no ex-prefeito Gilberto Kassab nada tem a ver com procura de respostas honestas para o grave problema da corrupção que destrói a administração pública em todo o país. Quando desvia o assunto a militância petista evita também o aprofundamento necessário do debate.

As próprias personalidades (Haddad e Kassab) que estão no centro do escândalo de corrupção fazem cair no ridículo quem tenta desviar de alvo. O atual prefeito e o ex tem em comum nas suas carreiras políticas uma figura notória da corrupção no Brasil, o deputado Paulo Maluf, de cujo sobrenome apareceu inclusive o verbo “malufar”, cujo significado todo mundo conhece.

Kassab começou sua carreira como secretário de Maluf e Haddad teve seu batismo político mais importante feito na mansão de Maluf, com a presença da alta cúpula do PT e também do padrinho de sua candidatura a prefeito, o ex-presidente Lula. Ora, essas ligações demonstram que o sistema que domina a máquina pública é composto de forças muito mais determinantes que os partidos. E no caso de Haddad houve até uma declaração pública e de alto teor símbólico sobre a continuidade do sistema. A menos, é claro, que o Maluf do Haddad seja diferente do Maluf do Kassab.
.....................
Por José Pires

___________________

Imagem - Lula e seu pupilo beijam a mão de Paulo Maluf nos jardins de sua mansão: a luta continua, companheiro.

terça-feira, 12 de novembro de 2013

O lixo da história

Na imagem, o estado em que ficou a reitoria da USP depois da ocupação pelos grupelhos de extrema-esquerda. Além da depredação e do lixo espalhado por toda a parte desapareceram diversos equipamentos, inclusive computadores. Não me impressiona ver o estado em que esses militantes deixaram a Reitoria ocupada. Isso é próprio de quem sabe que não haverá consequências. A falta de responsabilização dessa militância vai fazendo com que eles avancem cada vez mais sobre o direito alheio. Como inexiste um cumprimento da lei, com as devidas penalidades, esse pessoal vai abusando cada vez mais. Talvez não tarde o momento de aparecer uma morte nestas confusões.
Por isso, a depredação não é uma surpresa. O que causa espanto mesmo é ver gente já com idade suficiente para ter a mente madura, mas que vem defendendo esse tipo de coisa como se fossem atos de idealistas. Me parece um triste drama psicológico e talvez até uma doença ideológica já diagnosticada lá atrás pelo próprio líder da revolução na Rússia, Vladimir Lenin: ele chamava isso de doença infantil do comunismo. Quase um século depois e já com o comunismo em escombros e ainda tem gente sofrendo dessa doença extremista.
Mas no caso presente pode ser também um drama pessoal de velhos "combatentes" da revolução, na aflição de saber que entre a companheirada a propina e a distribuição de cargos passaram a ter mais valor que as palavras de ordem de outrora. Isso é muito comum nesta nossa época em que a esquerda tem mostrado que o único preparo que teve nesses anos todos foi para a sistematização do roubo aos cofres públicos. Louvar os mesmos erros do passado cometidos agora por gente mais jovem é uma forma de aplacar a angústia pelos próprios desacertos históricos.
.....................
Por José Pires

A cana dos mensaleiros em julgamento

O plenário do Supremo Tribunal Federal retoma nesta quarta-feira o julgamento do mensalão e já terá de tomar uma nova decisão além da análise sobre os embargos infringentes. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu a prisão imediata de 23 dos 25 mensaleiros. O chefe da quadrilha, José Dirceu, também pode ir para trás das grades. No entendimento de Janot a prisão não depende do resultado do julgamento dos embargos. Ele cita um dispositivo que diz “em caso de embargos infringentes parciais, é definitiva a parte da decisão embargada em que não houve divergência na votação”. Como os infringentes contestam apenas parte da sentença, as demais partes poderiam ser executadas imediatamente.
O raciocínio é tão lógico que até torna atrasado este pedido de prisão. Mas o problema é que o julgamento do STF fugiu da lógica depois da aceitação dos embargos infringentes, que atrasou ainda mais o julgamento mais importante dos últimos tempos e também um dos mais demorados. Tomara que vejamos amanhã indo pra cadeia os responsáveis por este atentado criminoso contra a democracia. Porém, mesmo que isso aconteça, sempre ficará a impressão de que falta alguém no xilindró, não é mesmo, companheiros? Sim, porque acima dos chefes do esquema havia alguém que mandava muito mais. Pois é, aquele cara que estava no comando da Nação e fez de conta que não viu nada bem que podia estar nessa também.
.....................
Por José Pires

domingo, 10 de novembro de 2013

Em liquidação

Se alguém tinha dúvida do fim da linha para o chavismo na Venezuela, talvez a última notícia que vem daquele país possa dar uma luz sobre os derradeiros passos do obscurantismo populista que encantou até mesmo o governo do PT. O bolivarianismo está agora numa luta ideológica contra batedeiras de bolo, microondas, televisores, liquidificadores e qualquer outro eletrodoméstico de direita. Nicolás Maduro, ordenou uma "ocupação" militar na cadeia de lojas de produtos eletrônicos Daka. É mais ou menos como se no Brasil o governo mandasse o Exército Brasileiro ocupar as Casas Bahia. Centenas de pessoas foram às lojas da rede Daka para aproveitar os preços de até 50% mais baixos decretados pelo governo.

Hugo Chávez governou por 14 anos (sempre se esquece deste longo período de governo quando falam dele) e quando morreu deixou um país falido e sem projeto político algum. O chavismo sofre de um mal comum a qualquer regime caudilhesco, que é o do mandatário supremo se cercar de nulidades para evitar que o povo se encante com outro que não seja o chefão. Existe também o risco contínuo de um golpe, o que obriga o caudilho a evitar na sua equipe a presença de pessoas com personalidade própria. Daí a corte de incompetentes que toma conta de todo governo populista. Como os ditadores também morrem, o resultado sempre é o de uma sucessão acabar nas mãos de algum dos medíocres que rondam o poder, que terá de governar sem os instrumentos políticos do falecido, que incluem como qualidades essenciais o carisma e o poder pessoal sobre a máquina. Mas essas coisas ele leva para o túmulo.

O bolivarismo nasceu com a pretensão de se contrapor aos Estados Unidos ou qualquer outro dos países mais ricos do mundo. A bravata contaminou até o governo de Lula e depois o de Dilma Rousseff. Mas agora a revolução bolivariana foi literalmente pro varejo. A ideologia saiu do ataque ao Grande Satã e foi ocupar lojas comerciais. O bolivarianismo de Hugo Chávez entra finalmente na fase da queima de estoque.
.....................
Por José Pires

quinta-feira, 7 de novembro de 2013