Esta queda no abismo do ex-ministro Guido Mantega é um fecho histórico na eliminação gradativa que o PT vem fazendo dos quadros partidários mais qualificados, desde a criação do partido. O esmigalhamento de reputações começou num processo de humilhações internas, no domínio dentro do partido, que no final acabou com Lula e José Dirceu como chefes, junto a uma minoria partidária que explorou esse poder até a eleição de Lula como presidente da República. Daí por diante foi um estrago mais acelerado desses quadros partidários qualificados, sem os quais o PT nem existiria. O desmonte intelectual e moral do PT tem até um documento histórico, a famosa Carta aos Brasileiros divulgada logo que Lula foi eleito, que teve como um autor de peso Antonio Palocci, hoje condenado e preso por corrupção.
Foram muitos os intelectuais, profissionais da área técnica e também artistas que tiveram suas vidas sugadas no ralo imoral desse partido, sendo um exemplo notório o de Chico Buarque. Excelente compositor, acabará marcado historicamente pela ligação extrema com um esquema de poder de uma imoralidade sem precedentes na história recente do país. Outras figuras essenciais da nossa cultura ficaram também marcadas, mesmo intelectuais que morreram antes desse estrago, como ocorre com a memória de Florestan Fernandes. O sociólogo levou uma vida dedicada ao trabalho de forma absolutamente honesta até sua morte, mas teve sua imagem usada pelo partido. Hoje em dia até tem seu nome numa fundação que serve como instrumento do PT e cujo nível de qualidade intelectual e moral pode ser conferido pela presença de Dilma Rousseff na direção.
Por ser um dos últimos que tem a reputação definitivamente destruída pelo partido, Mantega serve como exemplo para as novas gerações, mesmo de quem possa pretender no futuro manter uma atividade partidária em paralelo à vida profissional ou acadêmica. O melhor é ficar num lado ou noutro, mas essa é a opinião pessoal de quem, como eu, livrou-se de grandes complicações morais e psicológicas na vida tomando o cuidado de nunca entrar em um partido e também jamais militar politicamente de forma partidária. A razão é muito simples: estando lá dentro é muito difícil não se deixar levar por um ritmo coletivo que impede qualquer ponderação sensata fora do interesse de grupos e do partido. Mas é claro muitos não pensam desse jeito e é bom que seja assim. A vida política precisa de gente decente e de boa formação profissional. Bons partidos só existirão com uma boa reforma que terá de vir de gente mais nova. Mas exemplos como o de Mantega devem ser analisados com seriedade, porque na condução política de tipos como ele dá para aprender muita coisa. No sentido negativo, é claro.
Como esses já se estreparam, que sirvam então como lição negativa para evitar repetições. Mas é claro que não tem só a experiência lamentável deles para servir como guia para se movimentar na política. A História também dá bons puxões de orelha. O engraçado é que esse é o pessoal da ala intelectual do partido, o que ao menos teoricamente permitiria seu acesso a um vasto material histórico sobre acontecimentos em que outros quebraram a cara em situações muito parecidas. São inúmeras as teorias sobre esses assuntos, na sociologia e na filosofia, onde é possível aprender muito, além de se deliciar na leitura. Mas fiquemos em comparações práticas.
Numa reavaliação com atenção da Revolução Francesa, por exemplo, já seria possível ao petista incauto rever um monte de situações perigosas. Mas tem também o lado “religioso” de todo esquerdista, que dificulta tomar lições nessas leituras históricas, por mais simples que sejam. Estão sempre torcendo por este ou aquele lado e por isso deixam de prestar atenção quando a informação ou o conhecimento vai contra o que domina suas cabeças. Nisso que eu falei, só para citar um exemplo, se o sórdido Jean-Paul Marat for visto como um oportuno herói, então aí fica difícil ter o passado como fonte de conhecimento. Esse é o velho problema da esquerda. Até agora eles acham que alguma força, que só pode ser metafísica, garante que eles podem fazer o que quiserem que o sucesso será garantido por um ordenamento posterior. Ainda no tema que peguei como exemplo, eles pensam numa guilhotina só para a cabeça dos outros. Não tem sido assim e isso já vai para séculos. Mas eles não aprendem.
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POR José Pires