O presidente Lula gosta de reclamar da imprensa. Pois ele devia saber o que seu colega de negócios com aviões, o presidente Nicolas Sarkozy, tem que aguentar na França.
A história francesa não tem sido escrita com meias palavras. Os papéis são muito bem definidos e isso vem de longe. Não esqueçamos que na Revolução Francesa por pouca coisa as cabeças rolavam de ambos os lados.
Neste rigor a imprensa tem um papel destacado, com os humoristas, seja no texto ou no desenho, pegando pesado com o poder dominante, seja de que partido for. Da década de 60 para cá a França teve publicações humorísticas tão agressivas que, na comparação, tornam quase infantil uma publicação como o nosso O Pasquim, publicado na década de 70.
Naqueles anos, desenhistas franceses como Reiser, Wolinski, Siné ou Cabu faziam o diabo com autoridades francesas, enquanto nós, aqui no Brasil, tínhamos que ficar apenas na inveja, pois além da censura sempre havia o risco de ir para a cadeia. Mas a triste verdade é que havia muito mais combatividade em nossos humoristas durante a Ditadura Militar, quando satirizar era um perigo, do que hoje, quando o risco é praticamente nulo.
Comparar o que os franceses fazem na atualidade até piora a situação dos nossos humoristas. A maioria dos brasileiros faz um humor bem comportado. Nos chargistas até o traço parece infantil. E muitos temas de corrupção, miséria e até de violência física são objeto de piadinhas tolas, sem nenhum sentido crítico. A maioria das piadas deve estimular um riso satisfeito até nos próprios políticos retratados.
Nem criaturas absurdamente grotescas como José Sarney, Renan Calheiros, Fernando Collor, José Dirceu e tantos outros, como o próprio Lula, recebem o que merecem em nossas charges. Aqui temos até uma situação impensável para um francês, que são os cartunistas agregados em sindicatos e ONGs que fazem um humorismo chapa-branca, a condição mais vergonhosa em que um humorista pode estar.
Os gaúchos são pródigos nisso. Lá, se formou uma sincronizada infantaria do traço para o ataque à governadora tucana Yeda Crusius. Ela bem merece ser atacada, é claro, mas o problema é que, abrigados em sindicatos cutistas e organizações grudadas no poder federal ou em políticos do estado, estes cartunistas calam quando um petista alcança o poder local. No governo do petista Olívio Dutra e enquanto o PT manteve o poder na prefeitura da capital a maioria deles fazia humor à favor.
O humor que fazem é também evidentemente instrumentalizado, um trabalho de ataque baseado em interesses partidários ou de grupos. Em humor, isso sempre é difícil de esconder, dificuldade que se torna ainda maior quando o chargista precisa deixar claro para os idiotas que o mantém de que está fazendo direito o serviço.
É claro que este humor chapa-branca também existe em outros estados brasileiros, afinal o PT, a CUT e ONGs governistas estão em todo o canto. Basta ter uma estrutura sindical ou de ONGs que amaciem jornalistas e chargistas quanto às trapaças e trapalhadas lulo-petistas e direcionem apenas contra a oposição seu furor. Vocês verão o que esta gente irá fazer caso a oposição conquiste a presidência da República. Então haverá um renascimento do humor "combativo" no país. Bem, eu já vi chargista em salão de humor desfilar com broche do Lula.
Qual é a graça de fazer humor à favor? Tirando a melhoria do humor financeiro do humorista, graça nenhuma. Para mim é mais uma questão moral, de ética profissional. Assim como é inaceitável que um motorista profissional beba antes de pegar a direção também não dá para aceitar um humorista governista.
Mas voltemos à França, onde essa sem-vergonhice não prospera. Eu dizia que Lula deveria buscar conhecer o que seu parceiro de negócios, Sarkozy, suporta de seus patrícios.
Aqui temos uma mostra. Nesta imagem o chargista Cabu ensina a fazer a caricatura do presidente francês Nicolas Sarkozy. Cabu é um dos mestres do vigoroso humor francês. Foi um dos fundadores da revista Hara-Kiri e de Charlie Hebdo, duas publicações históricas da imprensa francesa, ambas de humor. Charlie Hebdo existe até hoje.
O desenho de Sarkozy é da série “La méthode à Cabu pour apprendre à dessiner”, de Cabu, que nem precisa traduzir. Ele ensina a desenhar coisas como esta aqui. Será que o lulo-petismo teria capacidade democrática para aguentar algo assim?
Duvido. Ainda mais que este método para caricaturar Sarkozy funciona muito bem, como dá para ver. E com Lula funcionaria até melhor. Afinal, não esqueçamos que o nosso presidente usa barba.
POR José Pires