segunda-feira, 8 de abril de 2013

Alegria fúnebre

Duas mortes de personalidades de destaque na política mundial servem como referência para uma questão importante no debate público: qual é o tom aceitável de crítica diante da morte? Na morte do venezuelano Hugo Chávez aconteceram alguns excessos, na confusão que alguns fazem entre a análise da ação política do dirigente político e o ódio pessoal que pode ser gerado pelo que ele fez. Agora, na morte da ex-primeira-ministra britânica Margareth Thatcher, o clima ficou bem mais pesado. A esquerda parece ter menos capacidade de conter os mais abusados ou talvez não queira que haja moderação nem nas ocasiões fúnebres.

Nas redes sociais a militância azucrinadora vibra com a morte como se fosse uma queda política de Tatcher e não sua ida pelo caminho que todos deveremos seguir um dia. Da Inglaterra vieram fotos de ingleses comemorando com champanhe. Repete-se uma grotesca euforia que vimos também na morte de Chávez. Foi em dose muito menor, como eu já disse. Não teve nem champanhe.

Mas seja da direita ou da esquerda, são equivocos com o mesmo teor espantoso de desumanidade e também do mesmo peso em ignorância política. Mira-se na pessoa e não no que ela fez ou nos conceitos políticos e morais que deixou como legado.

Comemorar a morte de Chávez, de Thatcher ou de qualquer outro político não faz sentido algum, antes de tudo pela desumanidade do gesto. E quanto aos dois citados, suas obras estão completadas e isso é o que interessa. Sobre a morte de Chávez é preciso até lamentar que ele tenha ido embora sem arcar com as conseqüências do desastroso regime imposto na Venezuela. E quanto à Margareth Thatcher, só alguém muito tolo pode comemorar sua morte. Esta completou de fato sua obra, que acredito que até o esquerdista mais ferrenho terá a obrigação de concordar que é imensamente maior que a do venezuelano.

Concordando ou não com o que Tatcher fez, seu legado transformou o mundo de uma forma que nenhum outro governante realizou no final do século passado. Comparável com as mudanças promovidas por ela só tem o que foi feito na década de 80 por Mikhail Gorbachev, que resultou no desmantelamento do comunismo na União Soviética. Não só por coincidência, foi em período semelhante ao de Tatcher como primeira-ministra britânica. A derrocada do comunismo deve-se também ao papel dela no mundo e essa é uma das coisas que a esquerda não perdoará jamais. Outro que deu uma mãozona para a direitização do mundo neste período foi o americano Ronald Reagan, mas a marca liberal na economia mundial ficou mesmo por conta de Thatcher.

Ela viveu bastante para ver sua obra em andamento e influenciando a economia do mundo. Foi tão sortuda que ainda teve a satisfação de ver interpretando seu papel num filme de Holywood a grande atriz Meryl Streep, que até ganhou um Oscar por isso. Quem abre champanhe para celebrar a morte de Thatcher, na verdade está comemorando a própria derrota.
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POR José Pires

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Imagem: Margareth Thatcher em caricatura das mais ácidas feitas pelo grande desenhista inglês Gerald Scarfe. Ela devora um adversário político, o que foi usual durante seus anos de poder. Nem é preciso dizer o que desenhista achava dela, não é mesmo? Scarfe é também autor dos admiráveis desenhos que marcam o filme "The Wall", que Alan Parker fez em 1982 com a banda inglesa Pink Floyd.

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