quarta-feira, 19 de setembro de 2018

Jair Bolsonaro de olho no PT como alavanca eleitoral

O candidato Jair Bolsonaro é um tipo de político que construiu toda sua carreira usando de contrapé alguma situação ou opinião contrária. Em casos mais recentes, os brasileiros puderam acompanhar quiproquós entre ele e políticos de esquerda, com destaque aos bate-bocas com o deputado Jean Wyllys, do Psol, e a petista Maria do Rosário, dois oportunistas que fizeram carreira do mesmo modo, com diferença apenas de lados, servindo-se de jogadas de apelo sensacionalista. Bolsonaro acabou sendo favorecido bastante por idiotas desse tipo, ainda tendo lucrado muito com o vazio político e intelectual que acomete nossas redações, com jornalistas envolvidos na busca de assuntos quentes, além dos enfrentamentos e a audiência a qualquer custo que quase todo mundo procura nas redes sociais.

Pode-se notar no material de imprensa mais antigo sobre as peripécias de Bolsonaro que antes da popularização da internet ele era um político relegado aos programas de televisão de qualidade mais baixa, em cujas pautas cabia muito bem um deputado do baixo clero de ar amalucado, com o discurso de que problemas podem ser resolvidos na porrada. Bolsonaro só aparece em veículos de melhor qualidade quando está envolvido em encrencas mais sérias, como aconteceu com o plano de explosão de bombas nos quartéis, em um irresponsável movimento para demonstrar a insatisfação com salários dos militares encabeçado por ele e revelado em matéria da revista Veja, no final de 1987.

Essa história das bombas (que seriam de pequena potência, apenas para chamar a atenção) mostra que mesmo na carreira militar abandonada prematuramente para ser vereador no Rio, ele procurava ter destaque na caserna usando assuntos que na contraposição lhe dessem méritos. Isso foi detectado logo cedo. O deputado sofreu um processo disciplinar interno e quase foi expulso do Exército. Tudo indica que seus superiores resolveram abafar o caso, porém os indicativos mostram que a partir dali ele não iria além da patente de capitão. Pode ser, inclusive, que Bolsonaro tenha recebido sugestões informais para que pedisse baixa.

Bolsonaro é um homem com pouca capacidade de compreensão mesmo em assuntos mais corriqueiros e já aprofundados pela própria imprensa. Isso pode ser constatado pelo nervosismo que apresenta nas entrevistas mais rigorosas. Tem também uma grave dificuldade de expressão, o que complica em temas que mais complexos que obrigatoriamente aparecem em uma eleição para presidente da República.

Com a retirada forçada pelo atentado, ele ficou de fora dessas severas interpelações, reservando-se ao papel de “mito”, totalmente falso na minha opinião, mas que persiste. Até porque depois de ferido não teve que explicar sequer os embates ideológicos e culturais em que se meteu com muita fúria e que lhe deram uma fama muito fácil. Não vou dar colher de chá a este clima idiota estabelecido no país, no qual as pessoas se obrigam até a declarar que não são favoráveis a uma facada no estômago de um adversário. A verdade é que com o atentado, Bolsonaro ficou livre da tremenda e muito bem-vinda pressão feita pela imprensa em todos seus adversários, com exceção de Fernando Haddad, favorecido até agora por não ter que enfrentar questionamentos cara a cara, até Lula mandar que ele fosse candidato.

A retirada forçada de Bolsonaro teve até o efeito de amenizar sua imagem política, um equilíbrio exigido pelo andamento da campanha e que ele e sua equipe não estavam conseguindo resolver. Em qualquer situação, numa cama de hospital o indivíduo acaba sendo humanizado, o que é ainda mais forte para efeitos políticos. A situação de isolamento do candidato serviu também para que ficasse no ar, sem a necessidade de comprovação real, sua capacidade de conferir sucesso popular de fato a um mito ainda em desenvolvimento. Parafraseando Maquiavel, mas sem nenhum paralelo literal — que Bolsonaro não merece tanto — o candidato ficou numa situação muito bem apontada há mais de quinhentos anos por esse grande filósofo, que é a impressão de força sem que ela tenha que ser demonstrada.

É claro que Bolsonaro nem seus fanáticos seguidores podem compreender isso de forma objetiva, já que ao contrário do que muita gente pensa não há doutrina alguma, nem mesmo militar, no que embalou a subida do candidato. Se Bolsonaro ganhar esta eleição, do ponto de vista conceitual e histórico a direita vai entrar numa fria, com um desgaste pior do que a esquerda sofreu com o PT no poder. Bolsonaro foi inclusive um mau militar. E não sou eu que digo isso. São palavras do general Ernesto Geisel, que entendia disso, sem dúvida nenhuma.

Mas voltando ao candidato e sua campanha, eles vão tateando e se aproveitando do que aparece, com a sorte inclusive da entrada do PT quando a eleição já se encaminha para o final. Este movimento “#EleNão”, por exemplo, é uma alavanca perfeita, que se não tivesse aparecido deixaria o marketing bolsonarista em dificuldade para criar coisa igual. Eis aí a velha esquerda brasileira, com seus equívocos históricos, que nos últimos tempos se juntaram a uma batelada de propostas e ações com um largo rastro de rejeição entre os brasileiros. Entra em cena a candidatura de Haddad, que já serviu para um impulso que nem o atentado havia dado politicamente a Bolsonaro. É o efeito mágico do espantalho que até agora turbinava a carreira de Bolsonaro. Enfrentar o PT em um segundo turno, aí já seria a disputa dos sonhos mais felizes, no qual Bolsonaro entraria sem nenhum medo de ser feliz.
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POR José Pires

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