quinta-feira, 25 de abril de 2019

Bolsonaro e Olavo de Carvalho; uma parceria do barulho

O chega-pra-lá dado por Jair Bolsonaro em Olavo de Carvalho não é evidentemente uma atitude pessoal do próprio presidente. A nota oficial é um trabalho de equipe. O conteúdo do texto foi definido por um grupo e claramente imposto a Bolsonaro. Se fosse por ele, tudo se manteria do jeito que vem sendo desde sua posse, com Olavo criando uma impressionante cizânia no governo. O professor de filosofia tem de fato uma grande ascendência sobre Bolsonaro, exercida em grande parte por causa do fascínio que os filhos têm pelo guru. Pela vontade de Bolsonaro não seria alterado o prestígio de Olavo, até porque o clima de agressividade tem um objetivo que deve ter sido assoprado nos ouvidos do presidente.

O efeito do descarte público do guru já pode ser sentido nas redes sociais, que é onde a influência de Olavo pode ser sentida, publicamente por seus posts no Facebook e internamente nas suas aulas do COF, o cursinho de filosofia que ele ministra da sua casa na Virgínia, nos Estados Unidos. O contato com o professor no curso à distância é que dá origem às pautas depois retransmitidas em redes sociais pelos discípulos e que também seguem na rede subterrânea do bolsonarismo.

É desse esquema de comunicação que até deputados da base do governo Bolsonaro se queixam. Também vem daí o desconforto dos militares. De forma brusca, mais para panfleto que para filosofia, Olavo vem teorizando sobre a atuação dos militares na política. Ele tenta reescrever de modo peculiar a história do período da ditadura militar. Esta narrativa tem aspectos risíveis, que colocam até o penúltimo presidente do ciclo ditatorial e organizador da saída dos militares do poder, general Ernesto Geisel, como um facilitador da atuação da esquerda. Como costuma ocorrer em decorrência do estilo do velho professor da Virgínia, o assunto pode tomar ares de delírio. Já vi olavetes em vários lugares tachando Geisel como “esquerdista”.

Que ninguém espere que venha de Olavo de Carvalho um estímulo à governabilidade de um país, com a criação de um clima de “bom temperamento e a moderação das facções contrárias”, para citar um renomado filósofo, este sim um liberal. Foi Adam Smith que afirmou tal coisa, ele que na sua teoria da educação universitária, tem a visão de que é preciso “aprimorar o entendimento ou para consertar o coração”. No entanto, a filosofia do guru da família Bolsonaro não tem como base a criação de uma razoável harmonia que permita estabelecer um produto prático de uma doutrina. Ele próprio se gaba de não ter nenhuma doutrina prática. E basta assistir a uma aula sua, onde de filosofia mesmo pouca coisa tem, para ver que isso também se aplica à sua didática.

Para mim, Olavo de Carvalho é um sujeito que passou parte da vida em busca de um guru — por isso foi até do Partido Comunista Brasileiro, o antigo Partidão de Luis Carlos Prestes, que sempre atraiu muita gente que precisava de um consolo dogmático para a existência. Entre outras coisas, Olavo foi também muçulmano, tendo sido membro de uma seita menor em São Paulo, onde se praticava até a poligamia. E esteve também atrás de outros gurus, conforme ele mesmo conta em vídeos na internet.

Ocorre que os mestres não confirmaram suas expectativas e com o tempo ele julgou ser muito fácil ser ele próprio o guru. E aqui temos o típico caso do aprendiz de feiticeiro com dificuldade de perceber que a aparente facilidade de tornar-se um mestre era uma ilusão criada pela precariedade da formação dada pelos gurus que teve na vida. Claro que uma coisa levou à outra. Quem é seu seguidor fiel, enquadrando-se nas suas teorias amalucadas — com a exigência até mesmo da adoção absoluta do ódio aos inimigos do mestre —, pode ter benefícios, como a incorporação em um grupo social, cercando-se de proteção e elogios (além dos likes no Facebook), como o próprio mestre buscava no passado, antes dele próprio resolver virar guru.

É uma condição de aparente comodidade, que dispensa inclusive de encarar dúvidas e o mergulho na eterna avaliação das contradições. Essa é a tarefa de todo verdadeiro estudioso até o fim da vida, esforço dispensado pelos dogmas de uma seita. Porém, como já foi observado nesses meses iniciais do governo, esta filosofia da conturbação não tem serventia na hora da aplicação ao trabalho prático. Foi o que se viu no Ministério da Educação, entre outras atrapalhações criadas no governo Bolsonaro pelo chamado olavismo. É provável que até mesmo Bolsonaro venha a sentir como funciona essa filosofia de moer o próximo, que por ora ataca com unhas e dentes o tal do núcleo militar de seu governo. Tais engrenagens de destruição de reputações forçosamente devem chegar ao próprio presidente. Será interessante ver o que o Carluxo escreverá no Twitter quando começar esse fogo amigo sobre seu pai.
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POR José Pires

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