É preciso ter coragem para trabalhar no Charlie Hebdo. O jornal francês teve parte de sua redação assassinada por terroristas islâmicos, em janeiro de 2015, quando 12 pessoas foram mortas a tiros, entre elas os cartunistas Wolinski e Cabu, duas figuras históricas do moderno humorismo internacional. Por causa de cartuns satirizando Maomé os fanáticos criminosos entraram na sede do jornal atirando e gritando exaltações religiosas a Alá.
Pois o Charlie Hebdo volta a ser ameaçado, desta vez por causa de uma capa com Tariq Ramadan, o teórico islâmico e professor que está sendo acusado de estupro. As denúncias foram formalizadas por duas mulheres. Ramadan teve divulgado nesta terça-feira seu afastamento da Universidade de Oxford, onde leciona. A direção da instituição informou em nota que a licença foi “por mútuo acordo” para permitir ao professor “responder às acusações extremamente graves contra ele”.
A capa do Charlie Hebdo explora as acusações de estupro com uma caricatura de Ramadan com uma enorme ereção, fazendo sua defesa. “Sou o sexto pilar do Islã”, ele diz. O desenho foi alvo de muitos xingamentos nas redes sociais e áreas de comentários de sites, como costuma ocorrer com temas polêmicos. Só que no caso de uma publicação como o Charlie Hebdo já está demonstrado que o ódio de extremistas islâmicos e seus simpatizantes não fica só no bate- boca, como é usual internet. Os editores do jornal já formalizaram denúncia em relação às ameaças de violência.
Além do mais, pelo tema em que é especialista e por sua posição política, Ramadan tem a simpatia dos setores mais violentos dos muçulmanos. Ele teria também ligação com grupos extremistas perigosos, como a Irmandade Muçulmana, do Egito, fundado em 1928 por seu avô materno, Hasan al-Banna. Em artigo recente, mas anterior às ameaças ao Charlie Hebdo, a jornalista francesa Caroline Fourest falava dos riscos que corre quem critica o professor muçulmano. Ela é professora no Instituto de Estudos Políticos de Paris e também colaboradora do Charlie Hebdo.
“Estou bem situada para saber da violência que são capazes as redes da Irmandade Muçulmana quando alguém enfrenta o ‘irmão Tariq’”, ela escreveu. A jornalista é severa crítica na França das posições de Ramadan frente ao extremismo islâmico. Os dois já se enfrentaram em um debate que ficou famoso. Neste artigo sobre as acusações contra o professor agora afastado da Universidade de Oxford ela falava da coragem de Henda Ayari, uma das mulheres que denunciou Ramadan. Neste mesmo texto, Fourest aponta a hipocrisia do professor, segundo ela de comportamento parecido com o do produtor americano tarado Harvey Weinstein, só que mais violento.
Ramadan, que agora responde a dois processos formalizados por agressão sexual, costuma atuar muitas vezes de uma forma que nas redes sociais costuma ser chamada de “isentão”. Fazendo de conta que é imparcial, ele bate forte em quem aponta os riscos da religião islâmica para as liberdades individuais. Logo depois do atentado ao Charlie Hebdo ele insinuou que pela forma do humor do semanário, os jornalistas assassinados brutalmente teriam uma parcela de culpa no episódio. Ou seja, as vítimas da violência seriam culpadas por exercer a liberdade de expressão, um direito que tem o máximo respeito na França. Conforme o próprio Ramadan já foi obrigado a concordar, um lugar aberto a debates que são impossíveis de serem feitos em qualquer país muçulmano.
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POR José Pires
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