domingo, 20 de maio de 2018

Papa Francisco, demissão de bispos no Chile e Meghan Markle: questão de pauta

Ao contrário do que parece, a notícia internacional de importância da semana não é o casamento na família real britânica. A rigor, o jovem casal nem é de tanta relevância assim, mesmo na esdrúxula cultura monárquica inglesa. Pode-se dizer que o príncipe Harry e sua mulher, a americana Meghan Markle, são do baixo clero da realeza. Não é de destaque o lugar ocupado pelo príncipe na linha de sucessão. A cada filho novo de seu irmão, William, ele desce um ponto. Já está em quinto lugar. Só se houver uma hecatombe na família real para Harry sentar-se no trono. Portanto, talvez um escândalo matrimonial possa destacar o casal aos olhos da mídia. E mesmo assim, a inexpressiva colocação de Harry reduziria o valor da notícia, bem menos chamativa do que as encrencas do príncipe Charles com a falecida mãe dos dois príncipes.

De fato, a notícia importante da semana é a demissão de todos os bispos do Chile. Nesta sexta-feira, os 34 bispos do país ofereceram a renúncia aos seus cargos ao papa Francisco, por causa do escândalo de abusos sexuais e o encobrimento por parte de autoridades da Igreja chilena. Pode-se dizer até que este é um fato de extrema significação na história recente da Igreja Católica, que dependendo de seus desdobramentos pode crescer muito de importância. É a primeira vez que uma comissão nomeada por um papa para tratar desse problema chega a uma conclusão objetiva, que pelo jeito terá também consequências práticas sobre a séria questão dos abusos sexuais dentro da Igreja, praticados por criminosos que podem ser chamados de predadores internos. Uma demissão em massa como esta evidentemente tem que ser avaliada do ponto de vista político mais pela posição de quem tem o poder de mandar embora do que daqueles que colocam o cargo à disposição.

E não só pela mudança de comportamento das autoridades do Vaticano em face de um problema que vinha há tempos sendo tolerado e até mesmo acobertado em todo o mundo, uma notícia como esta tinha que ter destaque na mídia brasileira e ter sido eleita como objeto de debates importantes por aqui, afinal fala-se o tempo todo da predominância do catolicismo em nosso país, tido inclusive como o país de maior população católica mundial. Merecia todo o destaque a nova atitude da Igreja, tomada pelo papa Francisco, mas evidentemente não é isso que ocorre. E não é por culpa do casamento do príncipe inglês. Qualquer outro assunto mundano tomaria o lugar desse fato de extrema gravidade, porque temos implantado na cultura brasileira, principalmente por meio da imprensa, esta predileção pelo pitoresco, das banalidades sustentadas apenas pelo clima de fofoca e da curiosidade, em detrimento de assuntos que realmente importam em nossas vidas.

O hábito da nossa mídia da preferência pelo que é irrelevante é cada vez mais firme como política editorial dos veículos mais populares, sendo uma das questões mais graves da atualidade. Isso faz a atenção das pessoas ser tomada por um noticiário que nada acrescenta ao conhecimento humano e não serve sequer como informação. Está aí uma das razões, em grande parte, do país vir se afundando cada vez mais na má qualidade das escolhas políticas, na precariedade das relações produtivas e na dificuldade de se encontrar uma unidade de propósito com qualidade para dar um rumo decente às nossas vidas e ao país. Com leitura e informação de baixa qualidade vai ser difícil o Brasil encontrar sustentação para se levantar desse tombo que demoliu a economia, a moralidade política e a cultura nacional.
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POR José Pires

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