sábado, 7 de novembro de 2009

Uma voz dos tenebrosos tempos colloridos

Eu nem sabia que o ex-deputado Cleto Falcão estava vivo. Falcão não foi repórter Esso, mas acabou sendo testemunha ocular de histórias muito interessantes, algumas até horripilantes. Hoje ele é assessor parlamentar na Assembléia Legislativa de Alagoas, há duas décadas foi articulador importante da candidatura de Fernando Collor à presidência da República. Com Collor já presidente, ele ocupou na Câmara dos Deputados o posto de líder do PRN, o notório partido usado por Collor para ser presidente.

Quem descobriu Cleto Falcão em Alagoas foi o jornalista Geneton Moraes Neto, um bom caçador de notícias exclusivas e até de furos jornalísticos. Neste sábado, às sete e meia da noite, ele apresenta uma entrevista com o ex-deputado na Globonews. Tem reprise no domingo ao meio-dia e meia e na segunda, às três e meia da tarde.

É até uma surpresa receber uma notícia de alguém daquele grupo sem que seja de sua morte. Como morre aquele pessoal. O mais importante deles, o tesoureiro PC Farias, foi um dos primeiros a morrer. Falcão acha que acreditar que, conforme a versão oficial, sua amante Suzana Marcolino pegou um revólver e o matou é como acreditar em Papai Noel. Bem, também a torcida do Corinthians não acredita em Papai Noel.

Recentemente morreu outro da turma, o advogado José Guilherme Villela. Foi um crime de livro de Georges Simenon. Mataram Villela, sua mulher e a empregada. Ninguém viu nada. O advogado atuou na defesa de Fernando Collor e na década de 80 foi ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Não só levou muita coisa para o túmulo como é possível que por isso mesmo é que tenha ido mais cedo para lá.

Foi um crime de Simenon, mas por aqui não temos nenhum inspetor Maigret. Então deve ficar por isso mesmo. Mas se algum meganha brasileiro ligasse para Maigret certamente ele diria que a empregada provavelmente conhecia o assassino, senão poderia ter sido poupada.

Mas vamos ver o que Cleto Falcão tem a dizer sobre aqueles tempos. O que o Brasil tem de absurdo é em boa parte fruto dessa época. O período ajudou inclusive a reforçar o mito do homem que perdeu para Collor e depois que se elegeu presidente da República fundou o lulo-petismo e fez até pior do que condenava então.

Teremos com certeza uma entrevista histórica. A parte mais difícil para mim, então, é que talvez tenha que ver televisão. Como perder um negócios desses? Mas pelo menos com o Geneton é garantido que não vai ser chato. Leio os textos e livros dele há bastante tempo, são sempre bons. Sempre gostei bastante de seu trabalho e me aproximei ainda mais do que ele faz depois que soube da sua amizade com Joel Silveira, o grande Joel Silveira, imenso de talento, de alma — uma das mais especiais personalidades brasileiras e, além de tudo, um humorista de primeira no texto e na fala.

Geneton tem uma habilidade rara hoje no jornalismo. Descobre coisas incomuns entremeadas nas banalidades do cotidiano. Sei que é um paradoxo hoje existir no jornalismo poucos com algo tecnicamente tão básico, mas são coisas de uma profissão em crise.

Muita gente sabia que Cleto Falcão estava por aí. Ir atrás dele e convencê-lo a falar é que faz a diferença que qualifica o bom repórter. Como eu já disse, Geneton é um dos bons.

A conversa com Cleto Falcão está muito boa. Garanto isso não só pelo histórico do jornalista, mas porque ele já antecipou uns bons trechos em seu blog.

As histórias daqueles tempos tenebrosos são muitas, mas numa delas Geneton conseguiu extrair do ex-deputado a frase definidora do período Collor. Foi na tomada de decisão de levar ao ar o depoimento em que a ex-namorada de Lula, que se candidatava pela primeira vez à presidência da República, o acusava de esconder a existência da filha que tivera com ela e também de ter pedido que ela abortasse a criança.

Falcão estava na reunião para avaliar se a fita seria usada no programa eleitoral. Ele conta na entrevista que Collor decidiu exibir o depoimento com a seguinte frase: “A fita vai ao ar. Quem quiser ficar comigo fique. Quem não quiser f……-se !”.

É a frase definitiva de seu período. F……-ram-se todos. Inclusive o Brasil.
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POR José Pires

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