terça-feira, 5 de março de 2019

Governo Bolsonaro: demissão por pensamento próprio no Ministério das Relações Exteriores

Um governo de encrenqueiros não perde a chance de arrumar confusão nem em uma segundona de Carnaval. E o furdunço veio de um lugar já manjado em confusões, o Ministério das Relações Exteriores, regaço olavista que não dá descanso ao governo Bolsonaro. O ministro Ernesto Araújo demitiu o embaixador Paulo Roberto de Almeida do cargo de diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, órgão vinculado ao Itamaraty.

O diplomata Almeida estava no cargo desde agosto de 2016, nomeado no governo Temer, depois de ter passado “os treze anos e meio do regime lulopetista, do início de 2003 até o impeachment de meados de 2016” totalmente fora de qualquer cargo no Itamaraty, como ele próprio explica nesta segunda-feira em seu blog.

Ora, um ministro demite quem ele quiser. Tem a prerrogativa para isso. A questão é que o diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais foi demitido por uma diferença de pensamento, fora de suas atribuições profissionais. A demissão aconteceu depois de Almeida republicar textos em seu blog, um deles assinado pelo chanceler Ernesto Araújo e os outros dois pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e Rubens Ricupero. Que se chame isso do que quiser, mas o espírito é de censura.

No texto linkado no blog do diplomata demitido, o ministro Araújo afirma que FHC e Ricupero não têm conhecimento para opinar sobre os problemas recentes na Venezuela e o papel do governo na crise que chegou à fronteira do nosso país. Vale lembrar que Ricupero tem uma longa experiência como especialista no tema. E calma, pois tem mais. O ministro afirma que o desenrolar do processo político que resultou no descrédito internacional do governo Maduro se deve a ele, Araújo, e ao presidente Bolsonaro.

“A esperança de uma nova Venezuela não existiria sem o novo Brasil”, ele decreta. E ainda nos informa que foram as iniciativas do governo Bolsonaro que levaram os Estados Unidos a acordarem para o problema venezuelano e se colocarem politicamente. “Não foi o Brasil que seguiu os EUA, mas antes o contrário”, afirma sem nenhuma vergonha do absurdo de sua pretensão.

Ele disse ainda que foram venezuelanos que apontaram o papel decisivo do Brasil, levando o governo Trump a tomar vergonha e meter as caras na região. Vejam o trecho: “Segundo me confidenciou pessoalmente uma grande liderança democrática venezuelana, foram as iniciativas do Brasil que mudaram o jogo e mobilizaram os próprios Estados Unidos a romperem a inércia em que se encontravam até o início de janeiro e a virem colocar seu peso político em favor da transição democrática”.

O texto todo vai nessa batida de ativista de DCE. É o estilo intelectual do chanceler do governo Bolsonaro. O ministro escreve panfletos em vez de debater com a serenidade e inteligência que se espera de alguém no cargo que ocupa. Talvez esteja nisso a base de seu problema com o diplomata demitido. Paulo Roberto de Almeida publica seu blog há bastante tempo, onde promove um interessante debate de ideias. Publica bons textos de sua autoria, além da republicação de materiais sobre política internacional e problemas brasileiros. Sigo seu trabalho há muitos anos.

E ninguém pense que o diplomata demitido é um esquerdista. Esta mais para liberal, o que não deixa de ser um problema em um governo cada vez mais fechado em uma bolha de direita, que não aceita nada que seja diferente do que quer ouvir.
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POR José Pires

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Imagem- O ministro Araújo e dois colegas intelectuais do governo Bolsonaro

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