segunda-feira, 17 de agosto de 2020

A exploração da desgraça alheia: esquerda e direita na conturbação política e cultural do país

A bolsolavista Sara Winter divulgou neste domingo em suas redes sociais o nome de uma menina de 10 anos grávida após estupro e o endereço do hospital em que foi internada para fazer um aborto autorizado pela Justiça. O procedimento foi negado por um hospital do Espírito Santo, onde ela mora, o que obrigou sua viagem para outro estado.

 

O local era mantido em sigilo até que a discípula de Olavo de Carvalho e apoiadora de Jair Bolsonaro publicou uma postagem e pediu que seus seguidores fossem ao hospital e “colocassem os joelhos no chão”. Bem, isso serve como prova de que o país precisa encarar com seriedade a necessidade de impor a lei sobre o que é postado nas redes sociais, inclusive com a criação de normas rígidas de responsabilização, que podem muito bem existir sem que seja afetado o direito à livre expressão.

 

Depois da bolsolavista expor publicamente a paciente, um grupo de manifestantes foi para a frente do hospital onde será feito o aborto legal e absolutamente necessário, afinal trata-se de uma criança engravidada depois de um estupro. Lá fizeram sua encenação rezadeira e também xingaram os médicos de assassinos.

 

Qualquer pessoa sensata sabe que o que uma mulher mais necessita nesta situação, ainda mais sendo uma criança de 10 anos, é de tranqüilidade, apoio psicológico e de afeto, mas para esse pessoal que usa religião para os piores objetivos, amai-vos uns aos outros nem pensar — o que eu até acho bom como prevenção, porque confesso que tenho dificuldade em amar quem procura manipular a religiosidade dessa forma, tipos como Silas Malafaia, aquele deputado de trejeitos estranhos, o Marco Feliciano, a ministra Damares Alves, figuras assim, que se eu souber que vão para o céu não terei dúvida em me encaminhar de imediato para o inferno.

 

Com o furdunço criado na frente do hospital pelos manifestantes que se dizem cristãos, logo apareceram por lá as feministas e claro que a confusão aumentou. Penso que criou-se exatamente o clima desejado por esta direita oportunista e bem ruim da cabeça.

 

Mas que não se diga isso a uma combativa feminista, pois certamente ela dirá que é coisa de machista, do mesmo modo que pode ser tachado de racista quem disser para um militante racialista que não tem a expectativa de um bom resultado para os direitos individuais com multidões quebrando e tocando fogo nas cidades em protesto contra policiais despreparados e violentos.

 

A cena em frente ao hospital no Recife é didática quanto ao modo de proceder para melhorar o nosso país, com o debate público devendo ocupar um espaço importante no, digamos, aprimoramento democrático. Manifestantes postos de joelho e xingando profissionais da medicina a pedido de uma mulher obviamente desestabilizada psicologicamente são, em grande parte, a consequência do que a esquerda criou em um passado recente.

 

Cabe recordar, entre outros atropelos da razão, que não faltaram agressões morais a médicos em episódios protagonizados pela esquerda, em governo do PT, quando médicos cubanos explorados indignamente pelo regime castrista e pelo petismo eram aureolados como santos e a classe médica brasileira foi tratada como bandida.

 

Invertam-se os tempos e se entenderá melhor o que estou dizendo. Faz pouco tempo que esta doida da Sara Winter estava do outro lado, como manifestante, em situações muito parecidas com esta da criança estuprada, quando a atual militante bolsolavista atuava a favor do aborto no grupo feminista Femen, cujas ações são tão lamentáveis e partilham da mesma irresponsabilidade e falta de respeito desse grupo que se diz cristão. Naquele seu papel como esquerdista, a atual militante de direita participava de manifestações agressivas na Avenida Paulista, certamente sob aplausos de feministas.

 

Pode ter gente que vai logo dizer que estou propondo que não se faça nada contra fanáticos que atentam contra um direito fundamental da mulher — mesmo em um caso tão extraordinário —, apesar de ser óbvio que não é disso que estou falando.

 

Na minha visão, neste fervor destrutivo e insensato que coloca em risco até a sanidade mental dos brasileiros, é preciso equilibradamente ponderar sobre fatos que não podem ser vistos apenas como planos malignos de uma direita que só deseja o mal do nosso país, quando o que ocorre pode ser nada mais que a consequencia de formas equivocadas de promover o debate público e a atuação política.

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POR‌ ‌José‌ ‌Pires‌

 

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Imagem- Puxando pela memória, para entender o atual descalabro, um post da bolsolavista Sara Winter sobre uma foto dela em outros tempos, com a companheira Carla Zambelli, quando faziam furdunço no outro lado


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