sexta-feira, 11 de novembro de 2022

O futuro com Lula já mete medo ao Brasil

Dá vergonha alheia assistir ao espanto provocado pela fala desta quinta-feira de Lula, quando o presidente eleito deu a impressão de estar entrando em um terceiro turno. O discurso foi de palanque, com a velha retórica de dividir o mundo em classes, raças ou qualquer possibilidade de se aproveitar de algum desentendimento. A vergonha que sinto é que este é o Lula de sempre. Portanto, se há espanto com o que ele diz é por incompetência ou hipocrisia.


Já eleito, Lula não tem mais a necessidade de eliminar a lembrança do mandato e meio de Dilma Rousseff, como fez durante a campanha. Foi há pouco, lembram? Os governos do PT só iam até janeiro de 2011. Agora o período petista se alargou. Andam dizendo até que Lula "dilmou", o que é bobagem, afinal ele sempre mandou nos quatro governos.


Foi explosiva a fala de Lula, além de longa e muito chata, exagerando como sempre nos elogios que adora fazer a si próprio. Ele estourou a banca. Mais forte que a "mão invisível" do mercado é o gogó destrutivo de um presidente eleito, no que Lula acabou superando até Jair Bolsonaro. Os juros futuros foram para o alto, marcando o pior dia desde abril de 2020. No final do dia, no Ibovespa foram perdidos R$ 100 bilhões. O dólar arrasou com o real no exterior.


Vem até a vontade de cobiçar uma informação preciosa dessas. Quanto não seria possível lucrar se o chefão petista nos desse um aviso discreto que iria chutar o pau da barraca, não é mesmo? Até nisso Lula é igual a Bolsonaro: nenhum dos dois avisa quando vai dar uma agitada no mercado financeiro. Não para nós, é claro. Um amigo como o Lula é mesmo para se guardar do lado esquerdo do peito.


Mas é claro que a fala aponta para uma forma de governo que só por ingenuidade alguém acreditaria que o PT não vai implantar. Servem apenas para rir as entrevistas de economistas e figurantes de governos passados, fazendo pedidos de moderação ao petista. Ou será que tem alguém acha mesmo que Dilma governou daquele jeito desastroso sem o conhecimento de Lula? Mas vamos falar do futuro.


Prestem atenção. Um dia depois da eleição, a primeira visita de um governante estrangeiro a Lula foi do presidente argentino Alberto Fernández, que tem como obra de destaque na economia ter lotado as ruas de seu país com famílias inteiras ao desalento, sem emprego, sem lugar para morar e sem ter o que comer. A inflação na Argentina está em mais de 80% em 12 meses. Fernández evidentemente não veio obter de Lula lições de equilíbrio fiscal. Ambos não acreditam nessas coisas.


A própria visita do presidente argentino, diga-se, foi um despropósito, afinal até janeiro o Brasil tem um presidente que não é o Lula. Não me lembro de ter visto algo igual, embora nas relações da esquerda latino americana ainda se mantenha muito forte um estreitamento de apoios políticos e ajudas mútuas — inclusive financeira — que lembra bastante os tempos das internacionais comunistas, quando grupos e partidos se ajudavam nos planos para chegar ao poder. Havia até situações em que apelava-se ao treinamento militar e a intromissão de agentes estrangeiros.


Fernández e Lula almoçaram em São Paulo. Pode-se ver no vídeo do encontro entre os dois que a alegria do argentino era tão esfuziante quanto a do Lula. Fernández estava como se tivesse ganhado a eleição no Brasil. Ele já havia comemorado antes, pelo Twitter, a volta ao pder do companheiro brasileiro.


"Todo meu amor, minha admiração e meu respeito, querido companheiro. Temos um futuro que nos abraça e nos convoca", escreveu Fernández. A declaração de amor fica mais “caliente” em espanhol. Veja na imagem. Dá a impressão de que é até mais que um “casamento”, conforme a expressão que a esquerda gosta de fazer gozação nas falas de Bolsonaro.


É patética a religiosidade do historicismo, na crença da história evoluindo sempre favoravelmente a eles, com o “futuro que nos abraça e nos convoca", nesta eterna movimentação sobrenatural, que evidentemente tem que ser favorável a quem está do lado do bem. Como é que um adulto escreve um negócio desses? Mas a esquerda da América Latina ainda está neste plano existencial. Só alguém mais pirado que esta velha guarda pode acreditar que eles são capazes de compreender os problemas atuais do mundo.


Lula não telefona para a gente com boas dicas de aplicação no mercado financeiro, mas a linguagem tanto corporal quanto escrita permite prognósticos sobre o que vem por aí, neste futuro que os abraça e convoca. Lembram do “efeito Orloff”, daquela velha frase do “eu sou você amanhã”? Foi repetida entre nós por décadas, às vezes trocando de lado nas comparações entre a condição econômica de Brasil e Argentina. Este amor caliente de agora parece indicar que a ressaca será mútua.

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Por José Pires

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