quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Falando no honorável

O jornalista Palmério Dória lançou “Honoráveis Bandidos”. O tema central é o senador José Sarney e seu clã que dominam o pobre do Maranhão há mais de quatro décadas. O livro vai para a biblioteca da Fundação José Sarney ou qualquer outro memorial em que ele coleciona bagulhos? Duvido.

Em “Honoráveis Bandidos”, Palmério conta a história do poder regional da família Sarney e também lances reveladores sobre os métodos do atual presidente do Senado e ex-presidente da República para empalmar o poder no nível federal, desde sua altamente lucrativa vassalagem com a Ditadura Militar, passando pela tretas no Maranhão e chegando até os arranjos com o lulo-petismo para afastar os riscos de que a cadeia também passasse a fazer parte da história do clã.

É Palmério quem conta no livro: “Em 2008, o senador José Sarney voltou a ser manchete, principalmente das páginas policiais, quando revelada a organização criminosa da qual seu filho fazia parte. Para não deixar o filho ir para a cadeia, ele teve de disputar no ano seguinte a presidência do Senado. Foi preciso colocar a cara para bater. O poderoso coronel voltou para dar forças aos filhos, para salvá-los".

Daí foi o que se viu. Uma vergonhosa associação entre a esquerda estabelecida no poder e o setor mais atrasado da política brasileira para defender Sarney nos escândalos que começaram a surgir depois que ele sentou pela terceira vez na cadeira de presidente do Senado. Até a candidata de Lula à presidência, Dilma Rousseff, se encalacrou na maracutaia, com o pedido para que a Receita Federal aliviasse a situação da família Sarney.

Não deixa de ser triste o que se passou. Em razão do interesse pessoal de Lula, blogs da internet, políticos que até então se mantinham fora da esfera sarneysista, e também diversos jornalistas e acadêmicos saíram na defesa direta de Sarney ou em manobras asquerosas para embaralhar os fatos, com tentativas inclusive de desqualificar os críticos da corrupção sarneysista.

O pessoal é malandro e só vê seus interesses pessoais, eu sei. Mas o que acontece é que isso destrói conceitos sociais de ética muito preciosos e que nesses anos todos exigiram muito esforço para sua construção.

Acho até que o reguardo petista de Sarney foi bem além do que poderia ser aceito como tática política. Até revogou-se o irrevogável. E saiu da boca volúvel de Lula a notória definição de Sarney como alguém acima das “pessoas comuns”. Muita gente vê nos gestos do lulo-petismo de defesa das falcatruas do senador maranhense eleito pelo Amapá apenas como uma tática como parte do plano para criar uma forte base para a estratégia eleitoral de 2010.

Eu não vejo assim. E acho que a análise indo por este lado até qualificaria esta atitude nojenta de Lula e seus companheiros. Isso até valorizaria Lula e o bando de sem-vergonhas à sua volta. O que Lula tem mesmo é muita dívida com Sarney. Costumo dizer que mais que um arquivo vivo, Sarney é do tipo que é um arquivo muito vivo. A impressão que dá é que ele tanto sobre o petista e seus companheiros que basta pegar o telefone e ligar para o presidente da República exigindo solidariedade.

Mas voltemos a “Honoráveis Bandidos”. Palmério Dória conta a história de Sarney, mas não esperem aquela biografia linear, com a ponderação do jornalista vestindo casaca de historiador, algo muito comum em livros sobre a nossa política.

O título do livro já mostra o que tem dentro. “Honoráveis Bandidos” é uma maravilha de nome, que fecha o conceito sobre esta cambada de ladrões de forma admirável. E a foto de capa dá até vontade de perguntar para o Palmério como é que ele conseguiu convencer Sarney a posar em estúdio para colaborar na edição do livro.

Palmério tem estilo destravado. Sabe extrair sabor, expõe com ironia o cotidiano farsesco dessas pessoas que fingem ser altas figuras. Dessa forma, o que ele escreve acaba sendo bom de ler, em um ritmo que envolve o leitor e revela muito, mas muito mais mesmo do que certos livros que observam a História com formalismo.

Tenho uns trechos de “Honoráveis Bandidos” para mostrar pra vocês. Cliquem aqui e folheiem esta ótima obra, antes que o Sarney mande censurar.
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POR José Pires

6 comentários:

Newton Moratto disse...

Li os trechos postados. Que coisa! Estou boquiaberto. Com as histórias da família Sarney? Nem tanto. É com o livro mesmo.

Luciana disse...

O livro é bom mesmo e o post está colocando bem o drama que é ter gente como Sarney no poder. Vou correndo comprar que o bigode é capaz mesmo de censurar.

Carlos Pereira disse...

Sarney já censurou o Estadão. Não duvido que ele também processe os autores para censurar o livro.
É excelente ter um livro desses contando os podres de um político desonesto.

Newton Moratto disse...

Já era esperada a reação. Não deu outra. Está na Folha de São Paulo:
"Acaba em pancadaria lançamento de "Honoráveis Bandidos" em São Luís" "Terminou em tumulto e pancadaria o lançamento do livro "Honoráveis Bandidos - Um retrato do Brasil na era Sarney", na sede do Sindicato dos Bancários, em São Luís (MA), na noite de última quarta-feira. A noite de autógrafos de Dória foi marcada para ocorrer na sede do sindicato, porque as livrarias do Maranhão se recusaram a lançar a obra, como antecipou a Livraria da Folha, no mês passado. Segundo o sindicato, estudantes ligados à família Sarney jogaram ovos e uma torta na direção de Dória, em protesto contra o livro. Houve também uma discussão entre os participantes do evento e os manifestantes."

Newton Moratto disse...

E o Sarney vai processar o autor do livro? Diz ele que não. Segundo ainda a Folha de São Paulo "o presidente do Senado não tem a intenção de processar o autor, pois isso acabaria dando mais publicidade ao livro."
Afirma ainda que Sarney não viu e nem vai ler o livro.
Logo ele que é tão comedido e afeito a conciliações não deveria ser tão radical assim, mesmo porque o livro já é um dos mais vendidos nas livrarias.
Li trechos do livro e já deu para ver a qualidade e o bom estilo da obra. A começar pela capa. Sarney sequer vai poder discordar da minha opinião quanto a este aspecto literário, se persistir em não ler a obra de Dória. Poderia ao menos dar uma espiada na foto da capa. Já estava de bom tamanho.
Esta negação taxativa em sequer olhar para a obra me deixa um pouco aborrecido e frustrado. É sério. Confesso que me causa um brutal prazer saber que o Sarney poderia estar olhando para aquela foto no melhor estilo Dom Corleone e estampada bem ali na capa do livro. Não me conformo dele me privar desta emoção.Sinceramente espero que mude de idéia.
Não seria também interessante um debate do ex-presidente com os "brasileiros e as brasileiras" sobre estilo, texto próprio, e questões afins, sobretudo no tocante ao contido na narrativa? Nem precisava ser pela televisão, poderia ser por outro meio, como por exemplo pela internet.

Newton Moratto disse...

Almejo mais do que ele só olhar para o seu retrato, embora queira muito isto; deveria “honoráveis bandidos” ser seu livro de cabeceira. Talvez esteja mesmo é com uma vontade séria de que ele se convença da valia em conhecer as conseqüências da sua trajetória política e dos demais familiares ao ler o livro.
E se concluir que fez tudo errado? Que de fato o retrato da capa do livro e a obra na sua totalidade retratem com fidedignidade não só o seu próprio perfil de bandido, mas o dos políticos que predominou e predomina na sua era, e para o qual tanto e sempre colaborou.
Se não fizer a culpa inteira ou "mea culpa" – o mais provável - fazer o quê? Paciência. Esta falta de consciência política é só mais um dos malefícios de sua época.
E já que o Sarney não vai mesmo refletir sobre o seu papel negativo e destruidor que exerce sobre as instituições, o Maranhão e o Brasil em geral, espero que os "brasileiros e as brasileiras" (lembram?) vejam e leiam este livro, especialmente ter em mira e não olvidar que a sua era e a do seu clã não acabou; continua em vigor, e com todo o vigor.
E aí está o pior de tudo: seu clã ultrapassou a fronteira dos familiares sanguíneos, como se estes já não fossem o suficiente para degradar umas boas gerações.
Ao longo do caminho o grande patriarca trouxe outros que não seus familiares para perto de si, que, logo, sem grandes delongas, tornaram seus afilhados, dada a percepção comum da grande afinidade reinante.
Antigos clãs inimigos, mesmo os que ambicionavam linhagem própria e autêntica, se ajuntaram aos Sarneys e aumentaram a tribo para melhor exercer o seu poderio sobre o território demarcado, que, diga-se, não é pequeno e é muito produtivo.
Outros clãs, não só familiares, também de origens sindicais, foram se aninhando sob as asas do grande líder e lhe prestaram grande veneração. Uns de menor magnitude, outros ditos ideológicos não resistiram e se achegaram ao respeitável charme sarneyzista. A obediência se tornou patente em vários episódios recentes, para decepção de muitos.
Aos poucos, todos, descobriram a ancestralidade e a origem comum: o doce nectar que propicia a corrupção.
Para não parecer muito metafórico é de bom tom citar nomes. Contra o território e seu povo se ajuntaram, portanto, no mesmo agrupamento familiar o pior que a politicagem pôde produzir em todos os tempos: Lula, José Dirceu (ele continua a fazer parte da grei), Palocci, Dilma Roussef, Fernando Collor de Melo, José Alencar, Michel Temmer, Renan Calheiros, Roberto Jeferson (este não foi expulso como muitos pensam e podia parecer), e legiões assemelhadas, todos bem capitaneados pelo grande caudilho e honorável bandido José Sarney.