segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Bala perdida e sistema de saúde idem

No início deste mês escrevi sobre a descambada que a política tem dado no Brasil em direção ao clientelismo eleitoral, de tal forma que certas ações políticas que antes causariam escândalo hoje em dia são feitas inclusive com propaganda. Falei então sobre a anúncio de que no Rio de Janeiro os imóveis do "Minha Casa, Minha Vida" serão entregues mobiliados e com eletrodomésticos da linha branca. Como todo mundo sabe, o estado é governado por Sérgio Cabral (PMDB) e a cidade tem como prefeito Eduardo Paes (PMDB), ambos aliados do governo federal e muito ligados ao ex-presidente Lula. O Rio é também o estado onde secretários de governo fazem festas em lugares caros de Paris acompanhados por empreiteiros. E com o governador Cabral junto.

Foi Eduardo Paes quem anunciou a novidade do "Minha Casa, Minha Vida" com tudo dentro das casas. Não é de hoje que o prefeito vem sendo o símbolo perfeito desta era clientelista que aí está instalada. Ele foi deputado do PSDB e no início do governo Lula era um dos críticos mais firmes do PT, o que fazia como líder da bancada tucana. Atacou Lula até quando parecia que isso resultaria em poder para seu partido. Mas logo que percebeu que a batalha era mais dura do que parecia abandonou os colegas tucanos e aliou-se a Lula na maior cara de pau. Dos dois, é claro.

Para ressaltar o que vejo como falta de atenção ao prioritário , lembrei que enquanto fazem propaganda de entrega de casas com móveis e eletrodomésticos, no Rio não se tem acesso aos direitos básicos da população que paga direitinho seus impostos. Como exemplo, falei que a cidade é uma das mais caras para se viver no mundo e lá se paga o salário de R$ 1.874 para médico com 20 anos de trabalho no estado.

Pois ontem saiu a notícia do recorte abaixo, publicada no jornal O Globo. Uma criança de dez anos atingida na cabeça por uma bala perdida morreu depois de esperar mais de oito horas por cirurgia. No hospital não havia neurocirurgião, que faltou ao trabalho. Há um mês o médico já não vinha fazendo os plantões, com a alegação de que não concordava com a escala feita pelo hospital. A informação foi dada pelo médico em depoimento à polícia depois da morte da criança. Ele era o único escalado naquele período quando, segundo o que disse, é uma determinação do Conselho Regional de Medicina que haja dois neurocirurgiões por plantão.

A menina foi vítima de dois grandes problemas brasileiros, ainda mais graves no Rio: segurança e a saúde. No primeiro caso, além do tiroteio cotidiano o Rio sofre hoje com o domínio de milícias paramilitares sobre grande parcela da população. Mas em parceria com o governo federal o governador Cabral vem ocultando o drama com uma política em que o efeito propagandístico da ocupação de favela desvia a atenção dos reais efeitos da violência. Não cabe especular sobre as chances cirúrgicas num caso deste, mas é um fato que atendimento de saúde desse jeito não permite uma boa recuperação de ninguém em situação alguma. A criança foi vítima da bala perdida e do sistema de saúde.
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POR José Pires

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