O telefonema do senador Flávio Bolsonaro à senadora Selma Arruda, sua colega de partido desde a última eleição, deixou claro na semana passada qual é exatamente o lado do governo de Jair Bolsonaro, além de ter sido uma demonstração também evidente de método e da séria preocupação de Flávio não só com o governo do pai como também com sua própria situação.
Como se sabe, o governo Bolsonaro não quer de jeito nenhum a instalação da CPI da Lava Toga e para isso vem fazendo alianças com o que há de pior no Judiciário e no Legislativo, em contradição com o que levou uma grande parcela de eleitores a depositar seu voto em Bolsonaro. Flavio é um dos agentes dessa maquinação contra a CPI. E tem a mão pesada. Por telefone, ele pressionou a colega senadora aos gritos e falando palavrões. Como se diz, então: tal pai, tal filho.
A senadora Selma — que nesta quarta-feira está de mudança do PSL para o Podemos — contou para a revista Veja sobre a brutalidade do telefone de Flávio. O palavreado chulo do senador foi republicado depois em vários lugares. A senadora é juíza no Mato Grosso, não só por coincidência terra de Gilmar Mendes, onde segundo o sumido Joaquim Barbosa, o ministro do STF tem “seus jagunços”. Ela teve o mandato cassado em primeira instância no estado do ministro Gilmar. Segundo ela, antes já havia sido ameaçada de não receber o apoio do governo nem de seu partido se não retirar sua assinatura no pedido da CPI da Lava toga.
O jogo é pesado e conforme o que ela conta, a grosseria é explícita. O palavreado de Flavio Bolsonaro exige um pedido de compreensão para ser publicado, como costuma acontecer com as coisas da família Bolsonaro. Então relevem. A senadora, que está com 56 anos, ouviu do filho de Bolsonaro o seguinte: “Vocês querem me foder! Vocês querem foder o governo!”. Selma Arruda já confirmou o diálogo outras vezes, uma delas em entrevista a uma emissora de rádio. Ela disse também que Flávio teve o mesmo comportamento com outros políticos do partido de Bolsonaro. “Ele gritou comigo, com a Soraya [Thronicke] e com o Major [Olímpio]", ela disse.
O senador Major Olímpio confirmou o telefonema e os termos. “O tom foi muito ruim. Para mim, o Flávio não existe mais”, ele disse. Nesta segunda-feira, o senador disse ao Estadão que tentou convencer Selma a não sair do partido. Segundo ele, “quem tem que cair fora do PSL é o Flávio, não ela”. Ele afirmou ainda que gostaria que o filho de Bolsonaro “saísse hoje mesmo”. Por sinal, Major Olímpio foi quem até agora definiu melhor os lances desesperados da família Bolsonaro em razão das encrencas do próprio clã, que podem ser até maiores do que até então se suspeitava. Olímpio não aceita o nome de “acordão” para o que os Bolsonaro estão fazendo. “É um quebra-galho-geral”, ele diz.
De fato é muito precária a condução dos acertos políticos. Ficaram visíveis os andaimes da armação, de tal modo que muitos que votaram em Bolsonaro se sentiram trapaceados. Hoje em dia o bolsonarismo vem conseguindo manter apenas a porção radicalizada de seus eleitores, sem ter conseguido se estabelecer como movimento político. O desmonte vai com certeza trazer problemas sérios para Bolsonaro. Nominalmente o governo pode ser dele, mas terá de ceder a maior parcela do poder.
Já está inviabilizado o projeto de governar com a pressão popular, ideia que tem muito a ver com o que pensa Olavo de Carvalho, o guru da família do presidente. Das bandeiras que levaram Bolsonaro ao Palácio do Planalto, os estragos dos últimos gestos políticos do presidente fizeram ate o antipetismo deixar de fazer sentido. E a relação com a Lava Jato agora se dá de forma inversa, com o governo envolvido em parcerias para acabar com o rigor contra a corrupção.
A péssima diplomacia do senador Flavio Bolsonaro não causa surpresa, já que quando foi deputado estadual no Rio de Janeiro chegou a fazer discurso favorável às milícias, inclusive conceituando este esquema paramilitar como importante na segurança pública. O pai também já expressou publicamente esta admiração pelo uso da força sem apoio legal. Bem, é difícil supor um político que defende em público uma atividade repressiva extrajudicial vá se comportar com respeito à legalidade na obscuridade dos bastidores. Pode estar aí uma causa do desespero expressado nos berros do senador.
Acuados pelo passado e temerosos de serem contidos na ambição do que ainda pretendem fazer, o presidente e seus filhos foram criando lances políticos do jeitão deles, de uma forma que foi desmontando a imagem que junto com uma mistura das casualidades políticas deu a vitória a Bolsonaro na eleição passada. O projeto de poder agora não se sustenta mais com o processo natural que levou Bolsonaro ao governo. E nem se pode dizer que o bolsonarismo virou suco. Pelo jeito, está mais para chorume.
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POR José Pires
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