quarta-feira, 3 de julho de 2019

Brasil, um país onde as regras nada valem

A medida provisória que impedia o desconto da contribuição sindical no pagamento dos trabalhadores já perdeu a validade. Foi na última sexta-feira, prazo final que o Congresso Nacional tinha para cumprir os 120 dias para votar o texto. Também pudera, os políticos tiveram muito trabalho nos últimos meses, nos bate-bocas entre Legislativo e Executivo, reuniões de horas para ouvir ministros sobre balbúrdias variadas. Essas coisas tomam um tempo precioso,  que de fato dificultam a concentração naquilo que tem prazos determinados.

Assim, já não temos aquilo que parecia ter sido resolvido, com este imposto compulsório voltando a ser aplicado nos salários. E o sindicalismo volta ao que era. Ou melhor, deixa de ser corrigido naquilo que não estava dando certo. Como acontece com tanta coisa neste país, no popular, era mais uma decisão só da boca pra fora.

E isto não é uma exceção na forma da classe dirigente brasileira administrar os rumos do país. Não é funcional em termos de qualidade, mas trata-se de um método. E que se situe nessa indeterminação também o setor privado, pois é de responsabilidade geral esta dificuldade na definição de regras, junto com vacilação no seu cumprimento quando já existe uma decisão em conjunto.

Claro que isso deixa o país em um eterno estado de anomia, a condição em que não se reconhecem valores ou regras de conduta. Por lei, a faixa é do pedestre, mas depende do motorista ter boa vontade.

Somos um lugar onde é difícil saber como se comportar até em questões essenciais do dia a dia, mesmo quando já muito bem regidas em lei. Por isso, o que se aprende desde cedo é que agir com honestidade pode ser um desfavorecimento em relação aos que passam a vida agindo como espertalhões.

O imposto sindical tinha caído, mas o Congresso não fez seu trabalho no prazo, do mesmo modo que o juiz não aplica com rigor a lei e a polícia deixa de multar ouir com honestidade não prende. Evidentemente as justificativas sempre aparecem. Tem quem diga que a reforma da Previdência seria a prioridade, ainda que a necessidade da regularização da anulação do desconto obrigatório tenha vindo antes.

Esta é mais uma discussão, no entanto, não interfere na qualidade do resultado disso tudo, que é péssimo: ninguém acredita em resolução alguma já definida, assim como fica muito difícil adquirir a consciência de que deve-se ter respeito a regras contra a norma estabelecida de que é mais vantajoso passar sobre os outros.

O Brasil vive atordoado por este círculo vicioso, eternamente movimentado pela incompetência e a má-fé, nesta antiga covardia coletiva de encarar com determinação os problemas nacionais. Daí que, enquanto os salários voltam a ter o desconto do imposto sindical, que o brasileiro se prepare para outros recuos.

No girar desta roda, que ninguém duvide que também o STF daqui a alguns dias revogue a prisão em segunda instância, tornada jurisprudência por este mesmo tribunal e que vem funcionando bem, com muito maioral salafrário comendo de marmita no sistema presidiário. Serviu inclusive para tirar o Brasil da incrível posição de ser um dos poucos países do mundo com uma vagarosa fila de instâncias, que percorrem décadas até a sentença final. Isso quando ela acontece.

Por aqui, como nunca se dá cumprimento ao que se resolve, jamais se sabe quais regras valem. O país vive em uma condição de idas e vindas e por isso mesmo nunca chega a lugar nenhum.
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POR José Pires

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