quinta-feira, 29 de julho de 2010

Lei Ficha Limpa: nem todo político que passou por ela é "ficha limpa"

É preciso um pouco mais de cuidado com o uso do conceito "ficha limpa". O fato de um político não estar enquadrado nos impeditivos criados pela Lei Ficha Limpa não faz dele necessariamente um bom candidato. A Lei Ficha Limpa não é um aval que garante o apego à ética e muito menos a capacidade técnica de quem não teve a candidatura impedida.

Além disso, apesar da honestidade ser algo indispensável, outras condições também são necessárias para verificar a qualidade de um político. Para uma boa atuação no Legislativo ou no Executivo, além de ser honesto, o candidato tem que ter capacidade técnica e habilidade em gestão pública.

Mesmo com a Lei Ficha Limpa, o eleitor tem que ter o mesmo cuidado de antes e analisar muito bem a história pessoal de cada político. Sem esquecer nunca que vivemos em um país em que até criminosos notórios passam anos enrolando a Justiça por meio de advogados muito bem pagos e jamais recebem alguma condenação.

Ter a "ficha limpa", como está se dizendo muito nesta eleição, não pode ser visto como uma garantia de integridade política, pois a dificuldade da aplicação das leis, principalmente em relação aos políticos, permanece a mesma. E a Lei Ficha Limpa depende sempre da execução de outras leis, o que no Brasil infelizmente tem uma história com muitas falhas e bastante parcialidade.

E foi esse histórico de impunidade uma das razões da criação da Lei Ficha Limpa. Ocorre que, se o político desonesto não foi pego por outras leis referentes à gestão pública ou mesmo ao crime comum, a Lei Ficha Limpa não terá efeito algum sobre sua candidatura.

Dessa forma, a lista dos candidatos nesta eleição não pode ser vista em sentido algum como a de candidatos de "ficha limpa". E basta dar uma olhada no nome de muitos candidatos para ver que muitos espertalhões conhecidos por burlar outras leis naturalmente também se safaram dessa.

O eleitor não pode usar o termo "ficha limpa" como se isso assegurasse a priori a qualidade política de qualquer candidato. É preciso considerar com profundidade os fatos da vida de cada um, verificando com rigor questões profissionais e políticas. Até porque, mesmo sendo um "ficha limpa", se for incompetente o político pode arruinar uma cidade, um estado e até um país ou fazer um péssimo mandato no Legislativo.

Não podemos permitir que seja criado um falso conceito que faça do político não foi enquadrado na Lei Ficha Limpa, por extensão, um "ficha limpa".

Muitos políticos certamente vão usar esse argumento para passar como "fichas limpas" nesta eleição. Alguns vão até tentar limpar sua fichas sujas usando este falso raciocínio.

Não estou evidentemente colocando em dúvida a Lei Ficha Limpa, que é boa e muito oportuna. Com sua vigência, certamente o eleitor se viu livre de muitos patifes que, de outra forma, estariam aí disputando cargos eletivos, já que os partidos nunca usaram rigor ético na seleção de suas chapas eleitorais.

A bem da verdade, se os nossos partidos cumprissem de fato com o seu papel, nem seria necessário a existência da nova lei. Mas é preciso deixar claro que ela não é uma peneira com eficiência para garantir qualidade eleitoral. Suas malhas não têm o poder de reter sujeiras que não foram detectadas e punidas pela Justiça.

Então, é preciso ter cuidado para que não se crie um conceito imediato de qualidade para o político que não foi barrado pela Lei Ficha Limpa. É preciso bem mais que isso para considerar que um político é, de fato, um "ficha limpa".
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POR José Pires

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