Prefeitos e governadores que se empenham no combate ao coronavírus estão numa situação difícil, no desamparo provocado pelas atitudes de Jair Bolsonaro, um presidente negacionista isolado no mundo, que nos últimos dias vem levando pitos até de Donald Trump, ironicamente o grande inspirador que o levou a tomar o caminho equivocado da negação da gravidade do coronavírus, até agora a única medida encontrada para o controle da contaminação, com a comprovação científica na prática: a consequência foi grave onde essa medida deixou de ser tomada, com melhores resultados em lugares qwue adotaram o isolamento.
Bolsonaro insiste no erro, mesmo com a mudança de atitude do presidente dos Estados Unidos, que não avaliou acertadamente o enorme risco para o seu país do vírus que assolava a Europa, depois de ter surgido na China e matado muita gente por lá. A experiência direta com a mortandade em território americano, atualmente na casa das 60 mil vítimas fatais, obrigou Trump a uma revisão de sua visão, digamos, científica.
O governo de Trump mudou completamente de rumo, acionando mecanismos econômicos contrários a tudo o que ele pensa sobre a ação do Estado. Provavelmente sem saber quem foi John Maynard Keynes, o presidente americano deu uma guinada keynesiana espetacular.
Trump não é besta de manter-se ajoelhado à chamada mão invisível do mercado, quando uma força invisível e destruidora acaba com a vida de milhares de seus concidadãos. Só no Brasil economistas conservadores fazem de conta que não sabem que os mercados não se corrigem sozinhos diante de crises severas e para o azar de Bolsonaro ele tem ao seu lado o pior tipo de mente ortodoxa, a do ministro Paulo Guedes, que nunca teve capacidade de formulação de qualidade na sua área. Não é desse ramo.
Guedes fez carreira na especulação do mercado financeiro, ficando apenas nisso. Não escreveu livros, não tem um artigo sequer de importância sobre o tema. Em matéria de economia, seu status de qualidade como um “Posto Ipiranga” só existe na cabeça de um ignorante como Bolsonaro.
Guedes não conhece o país nem a economia brasileira, tanto é assim que teve que tomar conhecimento na marra que seu plano de acabar com certos direitos que assistem aos mais pobres iria demolir de imediato a economia de uma porção de municípios brasileiros, arrasando regiões inteiras que vivem do dinheirinho pingado na mão de cada cidadão.
No plano desse gênio econômico comparado por Bolsonaro a uma propaganda de posto de gasolina passava-se a tesoura, por exemplo, no Benefício de Prestação Continuada, o BPC, de amparo aos mais velhos. Por ele, acabava-se também com a aposentadoria rural.
O ministro foi avisado que medidas como essa acarretariam a falência de muitos municípios e deve ter ficado bastante surpreso com esta informação econômica que escapou à sua genialidade. Mas entende-se. Como é que um liberal de mercado que vive com a cabeça fora da realidade brasileira iria saber de uma conseqüência que até um vereador de cidade pequena do nordeste conhece desde pequeno?
Nunca se deve esquecer que o Guedes é um liberal econômico que não vê problema algum em liberar as forças do mercado enquanto um ditador mantém um país submetido à força bruta. Seu modelo de liberdade econômica convive muito bem com o terror de um Augusto Pinochet.
Claro que uma visão estreita dessas atrapalharia o combate ao coronavírus. Para um achatamento mais eficiente da curva de contaminação governadores e prefeitos necessitavam do apoio econômico que não tiveram desde o início da crise, inclusive com um planejamento nacional sobre organização para enfrentar o que virá depois, na desestruturação causada pelo vírus.
O ministro não só deixou de ajudar como trabalhou contra. Manteve uma atitude de desestímulo, que pretende ampliar, ajudando Bolsonaro a enfraquecer adversários políticos. Não quer repor de jeito nenhum a receita dos estados, algo que na prática serve para penalizar exatamente os governadores mais atuantes contra o coronavírus.
É um inferno atravessar uma pandemia com um presidente lançando perdigotos com sua retórica manipuladora de quinta-coluna, atrapalhando o esforço dos brasileiros para evitar o espalhamento de um vírus mortal e desestabilizador socialmente. Mas a hesitação de Guedes (se é que foi apenas hesitação) também prejudicou bastante e foi providencial para os planos de Bolsonaro de estigmatizar dirigentes públicos que não aceitam sua visão de que é preciso simplesmente aceitar a matança produzida pela pandemia.
No início de março, Guedes ainda negava os efeitos econômicos do coronavírus, fechando os olhos para a quebradeira que assolava a Europa e já havia abalado a economia chinesa. Sabe-se que ele teve que ser convencido por pessoas mais próximas de que sua visão de austeridade não se encaixava numa crise inédita criada globalmente pela pandemia. Ele demorou quase duas semanas para entender a dimensão do problema, desde o primeiro grande impacto na economia mundial, na primeira semana de março.
Em março, espantosamente o ministro ainda falava em corte de despesas e a aprovação das reformas de ajuste fiscal, procurando convencer que esta seria a melhor resposta aos problemas econômicos provocados pelo vírus. Ele foi o um dos últimos dirigentes da área econômica no mundo a começar a se mexer para atuar contra os efeitos da pandemia, sem ter tido a capacidade de compreender a necessidade do apoio efetivo do ponto de vista econômico nas ações de controle da doença, essencial para lidar com as conseqüências na economia.
Não se sabe ainda se o descuido de Guedes com o coronavírus foi pela dificuldade em compreender a questão, causada pela sua formação pessoal, ou foi mesmo de má-fé, em um boicote parecido ao que seu chefe vem fazendo.
Qualquer opção é muito desabonadora, ambas o desqualificam para um cargo público de destaque em um país sofrendo pesadamente os efeitos de uma pandemia de efeito trágico, como se viu poucas vezes desde os grandes sofrimentos em massa provocados pelas duas guerras mundiais do século passado. Claro que um sujeito desses não tem condição de comandar a economia brasileira em meio à desestruturação mundial que virá depois do controle dessa doença.
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POR José Pires
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