segunda-feira, 25 de maio de 2009

Banco Mundial não crê em marolinha

Já devem ter passado ao presidente Lula um resumo da entrevista do presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick, ao jornal El País. Acredito que pelo menos um resumo o presidente ágrafo e inzoneiro deve ler — ou alguém lê para ele. É o mínimo exigido para ficar inteirado sobre a opinião de gente do ramo sobre o que ele chamou de “marolinha”. E os jornalistas até podem perguntar sobre o assunto.

Zoellick desmancha a tese de Lula de que o perigo já passou. Sei que a tese é advinda do estilo de governo, sempre em campanha eleitoral e que, por isso mesmo, se ocupa sempre mais da forma do discurso que da substância. Mas um pouco mais de responsabilidade seria possível? Faria bem.

Zoellick começa repisando um alerta sobre o risco de uma grave crise social mundial. É o óbvio, mas os jornais e a internet brasileira se fixaram nisso. Não vi em nenhum site da internet a informação mais quente vinda do presidente do Banco Mundial. O banco que ele preside é que tem a responsabilidade mundial de se ocupar de programas sanitários, segurança alimentar, produção agrícola e investimento em infraestruturas. Pois Zolelick é franco em dizer que “não há suficiente dinheiro público para enfrentar todos os problemas”.

Bem, antes da crise o mundo já vinha mal em todos os pontos de responsabilidade do Banco Mundial. Com este novo problema, aumenta a penúria em que já vivia a África e países pobres em outros continentes. Junte a isso as graves consequências do impacto ambiental global criado exatamente por este modelo econômico quebrado e teremos uma conta sem fechar.

Os economistas lembram bastante da depressão de 30 quando falam desta crise atual, mas sempre é deixado de lado um fator diferencial danado de importante entre o que se ocorre hoje e o que foi o passado. Ao contrário de antes, agora não se pode contar com os recursos naturais do planeta como um reforço substancial para fazer capital. Ao contrário, o meio ambiente é que exige dinheiro para seu conserto.

Em relação a duas perguntas muito claras do El País, se há dinheiro suficiente e de quanto o Banco necessita, é que Zoellick toca na falta de dinheiro público. Quanto à segunda questão, ele diz que “depende de quanto dure a crise”, outra obviedade, mas que traz embutida o fato de que o presidente do grande banco de fomento não saber onde isso vai dar.

Esta questão da finitude dos fundos públicos, aliás, é uma discussão que a imprensa brasileira tem evitado. Mas é bem quente na Europa e nos Estados Unidos. Não são poucos os especialistas que temem um colapso nos cofres públicos europeus. Claro, não há um saco sem fundo de onde tirar dinheiro para salvar empresas e bancos e resgatar investimentos que foram corroídos na crise. A iniciativa privada quebra, mas países também. E se isso ocorrer em bloco?

Outra informação que pode ser extraída da entrevista é que esta crise tem um viés que podemos definir como “sartreano”. A exemplo do que diz o filósofo existencialista Jean-Paul Sarte, também na crise econômica o inferno são os outros. Não adianta ficar por aqui com bravata eleitoral, como faz Lula, falando da suposta vitalidade da economia brasileira. Se os outros vão mal, com Europa e EUA mal das pernas economicamente, de onde vira á dinheiro?

Bem, do Marcos Valério é que não é. A FIESP já prevê queda de 35% nas exportações para este ano. Até ministros de seu governo são obrigados a comentar sobre problemas que parecem antecipar uma avalanche séria na economia brasileira. Será que Lula ouvirá os avisos ou vai deixar o problema para depois do ano eleitoral? Quem cravar a segunda resposta tem a maior chance de acertar.

Zoellick está em Madri para falar com o presidente José Luis Rodriguez Zapatero e parece que os fundos do Banco Mundial são um ponto da discussão com o espanhol. Conforme ele diz, no momento está trabalhando para assegurar que os países mais ricos não recuem em suas políticas de ajuda ao desenvolvimento dos mais pobres. A Espanha sofre “uma forte desaceleração econômica”, ele diz, mas o país ainda tenta manter sua ajuda. Banqueiro precisando de dinheiro é algo preocupante, mas o Banco Mundial nessa situação, aí já é de arrepiar os cabelos. E a barba, para que tem.

É na penúria global de capital para investimentos que entra o Brasil. E o nosso país surgiu na conversa com Zoellick sem que o entrevistador tenha nos citado. Foi o presidente do Banco Mundial que falou do Brasil como um país ameaçado de não ter acesso a investimentos externos. Foi o que ele disse, sem que o jornalista tenha antes dele tocado no nome do Brasil.

Esse é um tipo de assunto em que seria um alívio estar de fora. Mas se o Brasil é citado assim, de forma espontânea, aí o aviso é bem significativo. Mas fariam bem os assessores de Lula se fizessem chegar a ele (junto a um sal de frutas) outro aviso de Zoellick. O de que com este panorama ninguém, e esse “ninguém” é palavra dele, pois “ninguém” sabe com certeza o que acontecerá. “O melhor é estar preparado para qualquer imprevisto”, ele diz.
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POR José Pires

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