quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Manifesto do PT usou o nome de Ruth Rocha contra a vontade da escritora

Documento petista algum resiste a uma análise aprofundada. Como se viu logo no ínicio desta eleição, não dava pra confiar nem mesmo no programa de governo da Dilma Roussef. A própria candidata havia rubricado página por página do documento, mas depois voltou atrás. E seu programa de governo foi pro lixo com rubrica e tudo

Nessa Lula ficou calado, mas bem que poderia ter dito que nunca na história deste país um programa de governo durou tão pouco. Pode ser até outro recorde mundial de seu governo.

Pois agora o PT está com problemas em mais um documento importante da campanha. É no manifesto dos artistas e intelectuais em apoio a Dilma, lançado com grande alarde no Rio de Janeiro há menos de duas semanas. O problema é de assinatura falsa, o mesmo que já havia sido denunciado no dia seguinte ao lançamento pelo cineasta José Padilha, diretor do filme "Tropa de elite 2". Hoje quem veio a público anunciar que usaram também seu nome no manifesto sem que ela consentisse foi a escritora Ruth Rocha.

Padilha chegou a divulgar uma nota oficial, publicada também no site do filme "Tropa de elite2", negando que tivesse assinado qualquer apoio à Dilma, ao contrário do que foi anunciado em evento com a candidata acompanhada de artistas e intelectuais, quando seu nome foi lido em público como se ele estivesse apoiando a petista. Na ocasião foi lido também o nome de Ruth Rocha.

O cineasta não assinou e teve peito para reclamar. Sabemos como isso funciona. Com Padilha a treta não funcionou. Como adquiriu prestígio com dois filmes de muito sucesso, o que deve ter dado a ele uma relativa independência financeira, o cineasta pode denunciar o uso indevido de de seu nome num manifesto eleitoral. É claro que nisso influiu também sua dignidade pessoal, comprovada pelo seu gesto, mas quantos outros podem fazer o mesmo, com a maioria dos mecanismos de financiamento na área cultural ligados direta ou idiretamente ao governo?

Deve ser difícil para um artista ou intelectual comprar uma briga dessas, tendo depois de apelar para uma Petrobrás da vida ou até de passar o chapéu em busca de financiamento em empresas privadas, tantas delas sujeitas á pressões políticas.

É simples desse jeito. Está cada vez mais difícil viver e trabalhar com independência hoje em dia na área cultural, de tal forma que até para se encaixar em prêmios internacionais tem pesado mais o dedaço governista que o mérito artístico. A indicação do filme "Lula, o filho do Brasil" para competir pelo "Oscar" prova isso.

Nós sabemos muito bem disso e os petistas ainda mais, pois foi de forma deliberada, até com alto planejamento, que teceram as redes que hoje aprisionam pelo bolso (ou estômago) intelectuais e artistas. Isso tem acontecido também em outras áreas vitais para a democracia, como no jornalismo e até na publicidade.

É preciso coragem para romper esta teia. Por isso sempre é bom quando a gente pode falar de atos como o da escritora Ruth Rocha, que hoje denunciou o uso de seu nome. Ela também não assinou o manifesto. Seu nome foi colocado no alto do manifesto sem que ela soubesse de nada.

Ruth Rocha divulgou uma carta aberta afirmando que não apóia Dilma e que mesmo que apoiasse não foi consultada para o uso de seu nome. O texto é endereçado á própria candidata do PT, como o título de "Carta á candidata Dilma".

Mais esta denúncia de apropriação indébita de uma assinatura famosa coloca agora em dúvida todas as demais assinaturas do apoio a Dilma. Quando é que vai sair um documento sobressalente autenticando cada nome em cartório? Coisa do PT só dá para acreditar se for assim. E dependendo também qual é o cartório que autentica, pois um poder cartorial como o do PT saberia ajeitar muito bem uma legitimação.

O manifesto de artistas e intelectuais teve a liderança do sociólogo Emir Sader, que posa (o próprio Sader escreveria "pousa", não é Reinaldo Azevedo?) de intelectual militante, mas que já teve vantajosas sinecuras do governo petista.

Na ocasião do desmentido do cineasta José Padilha, Sader desconversou com uma conversa songamonga, dizendo o seguinte: " Eu recebi a informação com a confirmação de Padilha. Mas se ele diz que não, então tudo bem". Agora vamos ver como ele justifica a colocação da assinatura de Ruth Rocha no documento, sem que ela nem ter sido consultada.

Até agora já são dois nomes importantes da nossa cultura que nem sabiam do manifesto. Isso tem cheiro de estelionato político, não é? E nem vem com a conversa de que dois nomes é bem pouco entre centenas de signatários, pois a denúncia de Ruth Rocha vem aumentar a desconfiança de que muitos com o nome colocado sem consentimento no manifesto podem ter se calado por temor em confrontar a máquina petista.

Porém, desta vez Sader não pode vir com lorota, pois muito precavida, Ruth Rocha já antecipa em sua carta aberta que este tipo de coisa é imperdoável. "Os mais distraídos dirão que, na correria de uma campanha... “acontece“. Acontece mas não pode acontecer", ela escreve acertadamente.

Apesar da modéstia de quem afirma que não lhe cabe "considerações próprias a estudiosos em geral, jornalistas, economistas ou cientistas políticos", a escritora produziu um texto claro em que situa de forma concisa o papel de cada governante nas transformações ocorridas no país desde o final da ditadura militar em 1985. Ela inclui até o desacreditado ex-presidente Sarney e não deixa de fora nem o mais contestado dos nossos presidentes, Fernando Collor, ambos, conforme o texto, tendo trazido "contribuições para a reconstrução nacional após o desastre da ditadura".

Pena que Dilma não tem o perfil de quem dá atenção ao que o outro tem a dizer e nem poderia ser diferente, pois de outro modo ela não teria chegado onde chegou dentro do esquema petista. É difícil também que qualquer petista faça outro esforço que não o de buscar amenizar a repercussão desta "Carta à candidata Dilma Rousseff". O texto de Ruth Rocha poderia ter um bom efeito sobre a soberba que cerca este governo e sua candidata e que envolve seus apoiadores.

A escritora repõe os méritos políticos do que temos hoje de bom no país, tirando as transformações feitas no Brasil daquela esfera do "nós fizemos tudo", que o gogó petista quer fazer da nossa história recente e até do período que vai até Cabral. Para ela, o que temos aí vem de um conjunto de esforços, com os variados governos eleitos pelo voto desde a abertura política, cada um fazendo sua parte.

Resumindo, ela diz o seguinte: "O PT tem a ver com isso. O PSDB também tem assim como todos os cidadãos brasileiros. Mas não foi o PT quem fez, nem Lula, muito menos a Dilma. Foi a democracia. Foram os presidentes desta fase da vida brasileira. Cada um com seus méritos e deméritos".

Ruth Rocha é mais conhecida como autora de livros infantis. Pois no final ela dá um merecido puxão de orelha nos que usaram de forma abusada seu nome. Como se estivesse falando para a própria candidata, ela finaliza o texto da seguinte forma:

"Hoje eu penso como deva ser tratada a nossa democracia. Pensei em três pontos principais.

1) desprezo ao culto à personalidade;

2) promoção da rotação do poder; nossos partidos tendem ao fisiologismo. O PT então...

3) escolher quem entenda ser a educação a maior prioridade nacional.

Por falar em educação. Por favor, risque meu nome de seu caderno. Meu voto não vai para Dilma."

Bem, como estamos num segundo turno evidentemente além da Dilma só tem outro candidato. E é improvável que alguém que se expressa como Ruth Rocha vote nulo ou se abstenha em um momento tão importante da nossa democracia. Temos aí mais um voto importante que não aceita o controle que querem impor ao Brasil.
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POR José Pires

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