sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Filosofia lulo-petista

Aloizio Mercadante não é um filósofo. É economista, ainda que não com a completude de que gostaria — o almejado título de doutor que portou em eleições passadas sem ter o direito de fato. Mas é um economista e não filósofo.

No entanto, para a filosofia não tem peso algum o título que os petistas valorizam de tal modo que até usam sem tê-lo conquistado. Para filsofar, basta uma toga e a verve, que pode inclusive ser apenas falada. E se o sujeito quiser ir além do estilo socrático de fazer filosofia no gogó, não precisa mais que lápis e papel. Mas aí já é o Platão. Mas seria absurdo alguém pensar que, enquanto o filósofo soltava pérolas pela boca, algum grego se preocupasse se ele tinha ou não o título de doutor. No Brasil, país bacharelesco, até tivemos um doutor Sócrates, mas este era outro. E além de jogar bola era médico. Temos também o Tostão, que filosofa melhor que o Sócrates, mas aí já é outro jogo. 

Mas vamos à frase do Mercadante: “Mais uma vez na minha vida, o presidente Lula me deixa numa situação que não tenho como dizer não”. Foi o que ele disse a propósito da sua renúncia da renúncia. Ele colocou o cargo de líder da bancada à disposição, ameaçou renunciar, mas agora está tudo bem. Vai ficar. E com a frase emblemática pretende explicar sua posição.

E ela explica bem mais que a sua falta de palavra. Como é o sempre suspeito presidente do Senado, José Sarney, o objeto da discórdia que deu origem à ameaça que não se consumou, não há como não desconfiar de que Lula pode ter feito ou suborno ou chantagem para convencer o seu líder renunciante a desistir de pedir o boné.

E como sua atitude pressupõe uma prática político-administrativa e até um modelo de governo, fica claro que temos a frente uma filosofia política que rege a vida partidária e o governo. E é filosofia bem antiga. A frase define isso com perfeição já de início, quando afirma “Mais uma vez na minha vida”.

O primeiro argumento pode ter sido o oferecimento de um cargo em um suposto governo de Dilma Rousseff. Como é ele, Lula, que deve mandar num governo deste, se houver, ele pode prometer o que quiser para Mercadante ou para qualquer outro. Mas é Mercadante quem precisa muito de algo para depois de 2010. Seu mandato de senador termina agora, numa situação que dá pouquíssimas esperanças de ele renová-lo junto ao eleitorado paulista.

Isso até ajuda a entender o carinho que sua ex-correligionária, Marina Silva, diz sentir por ele. A senadora, como todo ambientalista, não poderia deixar de se comover com um senador cujo mandato se extingue no ano que vem e, pelo jeito, para nunca mais.

Mas prossigamos o raciocínio filosófico. A outra questão, a hipótese da chantagem, trata da possibilidade de Lula saber algo de Mercadante que está bem longe do nosso conhecimento. Doutorado falso não é, porque isso já corre na internet.

Mas e o emblema que envolve de forma perfeita o lulo-petismo? É esta prática de resolver questões da política e da vida com conversinhas ao pé do ouvido, sem encarar de frente as responsabilidades, longe de delimitar limites e alheias, bem alheias a qualquer princípio ético. Se o lulo-petismo tiver uma cartilha secreta determinando o que nós vemos hoje na prática do partido e do governo, com certeza esta é uma cláusula pétrea.

E foi muito bem definida pelo senador em extinção Aloizio Mercadante. Ah, a frase, que frase, vou escrevê-la novamente: “Mais uma vez na minha vida, o presidente Lula me deixa numa situação que não tenho como dizer não”.

E depois ainda dizem que só dá para filosofar em alemão.
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POR José Pires

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