segunda-feira, 24 de maio de 2010

Sem ingresso não entra

Em relação à internet os donos da Folha de S. Paulo têm uma obsessão econômica: de cobrar pelo acesso. Isso faz com que eles privilegiem matérias que endossam esta visão e até forcem à barra, como no jornal desse domingo, quando publicaram na capa a notícia sobre um jornal dos Estados Unidos que elevou suas vendas depois de começar a cobrar pelo acesso na internet.

O jornal de que falam é da capital do Arkansas, Little Rock, cidade que só é conhecida porque os Clinton são de lá. O jornal é o Arkansas Democrat-Gazette. Isso, eu também pensei a mesma coisa: qual é mesmo o nome? Sua venda é de exatos 169.458 em dias da semana e 258.160 aos domingos.

São números que fazem a gente se perguntar porque a Folha não colocou a matéria no caderno de humor. Ou um novo caderno, para trazer ao mercado, aí sim, uma revolução de conteúdo: o Caderno de Manipulação.

E não estou exagerando, pelo menos neste assunto de cobrar pelo conteúdo, que parece ser regra básica do manual de redação da Folha. Tratam como gênio um editor caipira do interior dos Estados Unidos que resolveu cobrar pelo acesso ao site do jornal. O título da matéria: "Arkansas mostra alternativas para a indústria dos jornais".

E o que o gênio fez além de cobrar entrada? Investiu na equipe. Uau, se os velhinhos da academia sueca conseguirem localizar Little Rock no mapa é bem capaz do editor do Arkansas levar um prêmio Nobel. Qualquer um serve para um gênio desses.

Na matéria que traz a sacada do conceituado órgão de Little-Rock, a jornalista coloca no final do texto a opinião de um consultor norte-americano sobre a cobrança de conteúdo: “Acho que [Hussman, o editor] tem uma visão míope do futuro da indústria. Está sacrificando o sucesso futuro em favor de lucros rápidos baseados em um produto que está morrendo”.

A jornalista poderia até escrever que o Arkansas Democrat-Gazette (Como?) comete o mesmo erro da Folha, que também impede o acesso para seu conteúdo na internet. Yes, nós temos catraca.

Ainda vai levar um tempo para sabermos quem está certo, mas o resultado para a Folha neste processo da internet é que eles devem manter os leitores já habituados com o jornal impresso e dificilmente conquistarão a geração que raramente pega um jornal nas mãos.

Como vários jornais não restringem o acesso e a internet tem uma profusão de conteúdos variados, quando o internauta bate com a cara na porta fechada da Folha, segue no mesmo instante para outro jornal ou site.

Ah, e não adianta vir com números que refutam meus argumentos — os do Arkansas Democrat- Gazette (Como?), nem pensar. Pelo seu já manjado caráter tecnicista, é provável que seja desse modo que a direção da esteja Folha se guiando. Mas é bem o que disse o consultor que teve a opinião escondida na matéria. Isso pode ser um lucro imediato e sem futuro.

Trabalhar o comportamento da rede exige bem mais que este raciocínio de contabilidade. Se essa experiência está sendo feita à portas fechadas fica difícil dos internautas saberem se vale a pena acompanhar.

Então eu acho que não se deve cobrar pelo conteúdo? Não acho nada. Como disse, é um processo em andamento. Mesmo se for para cobrar entrada, este é um método a ser criado e ninguém sabe ainda tem uma proposta viável. Tem que ser criada uma cultura na internet para que se aplique esta cobrança.

É uma besteira apenas instalar a catraca, como a Folha vem fazendo e também propagandeado em matérias fajutas com a deste domingo. Eles acreditam piamente que é esta a verdade absoluta para se dar bem na rede. Bem, é tanta coisa para ler hoje na internet que acho difícil alguém pagar ingresso só para ver se o espetáculo é bom.

Bem, eu sou dos que pensam que o hábito de ler jornal já vinha em decadência antes da internet. E não só por uma questão de número. Quem já deu fim a uma pilha de jornais guardados no quartinho dos fundos já sabe bem a perda de tempo que é a leitura de jornais. Mas o fato é que ainda existe uma caminhada para sabermos no que isso vai dar.

Com a catraca da Folha fechada o que eu sei é que muitos leitores não voltam ao site. E é claro que esta pessoa nunca vai pensar em comprar a Folha na banca ou um ingresso para saber das novidades.
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POR José Pires

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